O Google mudou as regras de anúncios para editores de mídia de maneira que sabia que sites que vendem espaço para publicidade reclamariam para recuperar mais controle do mercado, segundo o Departamento de Justiça (DOJ) dos Estados Unidos.
Por meio do depoimento de ex-executivo da empresa, e-mails internos e uma gravação de uma reunião de 2019 com editores clientes do Google, o DOJ apontou que a companhia ignorou as preferências de seus clientes em prol de fortalecer sua própria posição comercial e sabendo que eles tinham poucas alternativas reais.
Já os advogados do Google argumentaram que os executivos ouviram o feedback dos clientes e fizeram alguns ajustes, mas mantiveram o cerne da mudança em vigor.
Para o DOJ, a gigante da tecnologia enfrentou tão pouca concorrência em certas partes do mercado de tecnologia de publicidade que poderia definir termos unilateralmente.
Fazer mudanças que impactassem negativamente os clientes sem perder negócios poderia indicar poder de monopólio. Dessa forma, o governo alega que, em vez de escolher os produtos do Google por serem bons, eles simplesmente não tinham poder de escolha.
Google “cercou” editores no mercado de publicidade?
- A mudança em questão foi chamada de regras de preços unificadas (UPR, na sigla em inglês);
- Antes dela, quando editores colocavam o inventário de anúncios em seus sites para venda via servidor de anúncios do editor, podiam definir preços mínimos distintos para bolsas de anúncios que dariam lances nesses espaços de anúncios;
- Dessa forma, uma empresa de mídia poderia definir um lance mínimo diferente que aceitaria da bolsa de anúncios AdX do Google do que aceitaria de uma bolsa diferente;
- O Google sabia que os editores definiriam preços mínimos mais altos para o AdX do que para outras bolsas, segundo documentos apresentados no tribunal;
- Segundo e-mails internos do Google, um motivo que fez a big tech entender que esse era o caso foi o fato de editores valorizarem a diversificação das fontes de receita de anúncios para diminuir sua dependência da empresa;
- Em e-mails mostrados no tribunal, os executivos do Google reconheceram que editores definiram piso de preço mais alto para o AdX para “pressionar o Google com mais força”;
- Nos e-mails, eles concordam que era decisão racional. “Os editores estavam dispostos a tolerar alguma perda de receita em troca de uma dependência reduzida do Google como um todo”, apontam.
Mas, com o UPR, o Google eliminou essa escolha. As novas regras fizeram editores definir o mesmo preço mínimo para cada troca.
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Stephanie Layser, que atuava com publicidade programática na News Corp, que controla o The Wall Street Journal, na época em que o Google lançou o UPR, em 2019, testemunhou no início desta semana. Ela disse ao Google que achava que o UPR era “no melhor interesse do Google, e não no melhor interesse de seus clientes”.
Em abril de 2019, em Nova York (EUA), o Google deu a notícia da implantação do UPR para editores que convidou para o anúncio. O DOJ exibiu clipes de gravação daquela reunião, onde vários editores, incluindo Layser, reclamaram sobre o recurso.
Felix Zheng, que liderava a publicidade programática na IBM Watson Advertising na época, disse aos executivos do Google que tirar o “controle” que eles tinham com os preços mínimos era “algo muito difícil de abrir mão”. Jana Meron, que liderava a estratégia programática e de dados na Business Insider na época, disse: “Isso nos deixa presos”.
Segundo Layser, durante a reunião, se os editores optassem por mudar por não gostarem do UPR, não parecia que eles conseguiriam acessar totalmente a rede de anunciantes do Google fora da bolsa do AdX.
Em resposta, Rahul Srinivasan, ex-funcionário do Google que trabalhava em produtos sell-side na época, disse que esse era um ponto justo.
Executivos da big tech reconheceram que a implementação seria desafiadora de ser comunicada. Sam Temes, de produtos e vendas, destacou preocupação de que comunicar “ainda mais mudança de gastos para o AdX será complicado”.
Martin Pál, engenheiro, temia que a UPR “geraria resistência de editores que podem ver a mudança como se estivéssemos tirando uma funcionalidade à qual eles estão bastante apegados e consideram crítica para seus negócios”.
Em declaração ao The Verge, o Google contestou o enquadramento do DOJ. “Introduzimos Regras de Precificação Unificadas e outras atualizações como uma forma de melhorar a transparência e a justiça do leilão e ajudar os editores a atingir seus objetivos”, disse o porta-voz do Google, Peter Schottenfels, na quinta-feira (12).
“Durante o lançamento, fizemos mudanças e introduzimos novos recursos em resposta ao feedback do editor. Como ouvimos no tribunal hoje e do próprio especialista do DOJ ontem, o resultado foi que os editores viram uma receita maior”, prosseguiu.
Durante o interrogatório, o advogado do Google abriu um e-mail de agosto de 2019, que descrevia a percepção de mercado “melhorada” da UPR “devido ao diálogo contínuo com parceiros editores e a imprensa, e à incorporação de alguns comentários dos editores nas mudanças do produto”. Na época, outro documento interno mostrou que o Google disse que os editores viram “impacto neutro a positivo na receita”.
Em 2019, além do UPR, o Google anunciou algumas outras mudanças que disse que as empresas de mídia gostariam, incluindo a mudança de leilão de segundo preço para um de primeiro preço (no qual o vencedor paga seu lance, em vez do preço do segundo colocado, o que geralmente resulta em maior receita de venda de anúncios).
O DOJ tentou caracterizar esse anúncio em conjunto como combinação de boas com más notícias para suavizar o “golpe” para editores. Srinivasan testemunhou na quinta-feira (12) e disse que o entendimento dos executivos de que “alguns editores podem ficar chateados com a UPR” foi apenas “um dos muitos fatores” que os levaram a lançá-lo com o leilão de primeiro preço.
O executivo acrescentou que o Google acreditava que as diferentes regras de preços “eram menos relevantes em um mundo de primeiro preço”.
Em e-mails de maio de 2019, um colega notou algumas “relações públicas difíceis” após o anúncio e perguntou se a empresa poderia mudar para o leilão de primeiro preço sem remover os controles de piso de preço.
Srinivasan respondeu que “o objetivo interno primário” era competir em pé de igualdade entre as bolsas de publicidade. Mudar para o leilão de primeiro preço, escreveu, “nos fornece justificativa adicional para remover alguns [desses] controles”. No final, contudo, pelo menos algumas empresas de mídia se sentiram enganados.
O post Google teria forçado editores a aceitar novas regras; entenda apareceu primeiro em Olhar Digital.
Fonte: https://olhardigital.com.br/2024/09/14/pro/google-teria-forcado-editores-a-aceitar-novas-regras-entenda/