A Polícia Federal tem acumulado indícios de que militares arrecadaram recursos ou buscaram formas de financiar a suposta tentativa de golpe de Estado no final de 2022.
Mais três militares foram incluídos pela corporação no indiciamento contra Bolsonaro e aliados por tentativa de golpe. Um dos novos indiciados na última quarta-feira (11) é Aparecido Andrade Portela, um tenente-coronel da reserva suspeito de levantar recursos com bolsonaristas no Mato Grosso do Sul. Amigo de Jair Bolsonaro (PL) e suplente da senadora Tereza Cristina (PP-MS), Portela falou sobre a arrecadação em mensagens a Mauro Cid, que era ajudante de ordens do ex-presidente.
O General Braga Netto também é suspeito de financiar ações golpistas. Em depoimento à PF na última quinta (5), Cid afirmou que o ex-ministro entregou dinheiro vivo aos chamados “kids pretos”, membros das Forças Especiais do Exército que teriam planejado matar o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o vice Geraldo Alckmin (PSB). Até o momento, não há informação sobre a origem do dinheiro ou quanto teria sido pago.
Mensagens apontam que militares fizeram orçamento de R$ 100 mil. Mauro Cid e o major Rafael de Oliveira, preso em novembro, fizeram uma “estimativa de gastos” para despesas como material, hospedagem e alimentação de militares entre novembro e dezembro de 2022. A PF citou essas tratativas no relatório que indiciou Bolsonaro e os aliados, mas não concluiu se o dinheiro chegou a ser levantado.
Até o momento, nenhum dos militares foi formalmente acusado. A PGR (Procuradoria-Geral da República) já denunciou 63 pessoas ao STF por esse motivo, mas quase todas são acusadas de patrocinar ônibus para os atos de 8 de janeiro de 2023. A PF também investiga empresários que bancaram gastos do acampamento em frente ao Exército em Brasília e fazendeiros que forneceram caminhões para os bloqueios em rodovias após as eleições de 2022, entre outros.
Braga Netto nega ter financiado qualquer ação golpista. Em seu perfil no X, no último sábado (7), o ex-ministro de Bolsonaro publicou uma nota de seus advogados afirmando não ter participado de tratativas de golpe e do plano de matar autoridades. “O devido processo legal vai se sobrepor às narrativas”, escreveu o ex-ministro.
A reportagem não conseguiu contato com a defesa do tenente Portela. No relatório que indiciou o militar, a PF informou que ele ficou em silêncio ao prestar depoimento.
“A defesa técnica do general Walter Souza Braga Netto reitera que o cliente não tomou conhecimento de documento que tratou de suposto golpe e muito menos do planejamento para assassinar alguém. Dessa forma, o general não coordenou e não aprovou plano qualquer e nem forneceu recursos para tal”, disseram os advogados do ex-ministro Braga Netto.
O plano “Copa 2022”
A PF apura se houve apoio financeiro para planos dos “kids pretos”. A investigação revelou, em fevereiro deste ano, que Mauro Cid e o major Rafael de Oliveira estimaram um custo de R$ 100 mil para deslocar militares do Rio de Janeiro para Brasília. “Pelo teor do diálogo, seria uma estimativa de gastos para subsidiar, possivelmente, as ações clandestinas, que seriam executadas durante os meses de novembro e dezembro de 2022”, afirma o relatório da PF que indiciou o grupo por tentativa de golpe.
Cid afirmou que Braga Netto entregou dinheiro vivo em embalagens de vinho. Segundo o delator, os recursos foram repassados aos militares que executavam o plano “Copa 2022”, que incluía o monitoramento de Moraes e o possível assassinato de autoridades.
Se confirmado, pagamento fortalece eventual denúncia contra grupo de Bolsonaro. Segundo apurou a reportagem, Cid citou o repasse de Braga Netto pela primeira vez em 21 de novembro, quando depôs novamente após a prisão dos “kids pretos”. Desde que fechou acordo de delação com a PF, em setembro do ano passado, o ex-auxiliar de Bolsonaro deu vários depoimentos complementares para esclarecer omissões e contradições sobre a trama golpista e outros crimes.
Ponte entre governo Bolsonaro e manifestantes
A investigação apura se manifestantes em Brasília tiveram apoio material do governo Bolsonaro. Na operação que prendeu os “kids pretos”, no último dia 19, a PF revelou que o general da reserva Mario Fernandes, que chegou a ser ministro interino da Secretaria-Geral da Presidência, orientava e resolvia problemas para os bolsonaristas acampados em Brasília.
Fernandes “servia como provedor material, financeiro e orientador dos manifestantes”, segundo a PF. Em áudios enviados a Cid, o general afirmou que vinha “tentando orientar tanto o pessoal do agro como os caminhoneiros que estão lá em frente ao QG”. Ele chegou a pedir a Cid que convencesse Bolsonaro a “segurar a PF” para evitar a prisão dos manifestantes.
General se comunicava com lideranças do acampamento. O relatório da PF mostra que o casal Rodrigo Ikezili e Klio Hirano, que cuidava da logística do acampamento, pediu orientações a Fernandes sobre a entrada de tendas e outras questões. Hirano chegou a ser presa por atuação nos atos de vandalismo em 12 de dezembro de 2022, dia da diplomação de Lula.
Arrecadação no MS
Os militares também teriam arrecadado recursos fora de Brasília. A PF apontou que o militar da reserva Aparecido Portela, conhecido como Tenente Portela, recolheu valores com manifestantes no Mato Grosso do Sul para um “churrasco”. Segundo a PF, trata-se de um código para os planos golpistas.
Portela é amigo de Bolsonaro. Os dois serviram juntos no Exército e, segundo apurou a PF, o militar visitou o então presidente no Palácio da Alvorada 13 vezes só em dezembro de 2022.
Portela disse a Cid que estava sendo cobrado pelos apoiadores de MS sobre andamento dos planos em Brasília. Em mensagem enviada em 26 de dezembro de 2022, afirmou que “o pessoal que colaborou com a carne” queria saber “se vai ser feito mesmo o churrasco”. Cid respondeu que sim e garantiu: “Nada está acabado ainda de nossa parte”.
Com o fim do plano, Portela afirmou que teria que devolver dinheiro. No dia 29 de dezembro, véspera da viagem de Bolsonaro aos Estados Unidos, Portela perguntou a Cid por mensagem se havia “alguma esperança ainda, ou podemos aceitar a derrota”. Cid respondeu: “Zero”. Já em 12 de janeiro, após os atos em Brasília, Portela disse a Cid que o “pessoal está em cima de mim aqui”, e que teria que ressarcir os valores doados.
“Pessoal está em cima de mim aqui, infelizmente vou ter que devolver a parte desse pessoal. Minha vida está um inferno”, disse o Tenente Portela, em mensagem a Mauro Cid, em 12 de janeiro de 2023.
Com informações do UOL.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/pf-acumula-indicios-de-que-militares-arrecadaram-recursos-para-financiar-golpe-de-estado-em-2022/