23 de fevereiro de 2025
Gigante de Hong Kong quer comprar a PDG Realty; saiba
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O mercado imobiliário brasileiro foi surpreendido por uma notícia incomum. A incorporadora PDG Realty — que já foi a maior do País e encolheu após atravessar uma recuperação judicial — recebeu uma proposta não solicitada de aquisição.

A oferta, em caráter não vinculante, partiu da Sun Hung Kai Properties (SHPK), uma das maiores incorporadoras da Ásia, com atuação, principalmente, em Hong Kong e na China, onde ergue prédios residenciais para venda, além de possuir dezenas de escritórios, shopping centers e hotéis para obter renda com aluguéis.

Procuradas, nenhuma das duas empresas quis conceder entrevista, mas o fato relevante enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) traz detalhes sobre a proposta.

A oferta, revelada pela PDG Realty na noite de quarta-feira, 19, prevê a aquisição da totalidade das ações de emissão da companhia, com valor máximo de US$ 29,6 milhões, ou US$ 0,017 por ação.

Considerando uma taxa de câmbio de R$ 5,80, o valor máximo do negócio seria de R$ 171,680 milhões, correspondendo a R$ 0,0985 por ação. Os valores poderão ser ajustados após um processo de due diligence (investigação para avaliar os riscos da transação antes de fechar o negócio).

Por sua vez, a PDG tem valor de mercado de apenas R$ 1,5 milhão, com ações cotadas a R$ 0,02 (após oferta, dobraram de valor). Com tantos passivos, seu patrimônio líquido é de R$ 3,3 bilhões negativos.

A empresa brasileira tem oito canteiros paralisados dos tempos da recuperação judicial, encerrada em 2021. De lá para cá, ela luta para retomar lançamentos, o que é difícil pela falta de crédito na praça e pela desconfiança de consumidores com a marca. Nos últimos anos, fez apenas dois lançamentos. Em 2024, apurou vendas líquidas de R$ 116 milhões e um prejuízo de R$ 410 milhões (dados até setembro).

No fato relevante, a PDG destaca que se trata de proposta não solicitada apresentada sem qualquer contato prévio entre a administração da companhia e o remetente da proposta.

“A administração da companhia ressalta que providenciou a imediata publicidade da proposta, haja vista a natureza do assunto, e tentará contato com o remetente para obter detalhes sobre os termos e condições propostos”, diz a PDG.

Qual é o tamanho da interessada na PDG

Para se ter uma ideia de grandeza, as vendas contratadas de imóveis da SHPK foram equivalentes a R$ 27,5 bilhões no ano fiscal de 2023-2024, conforme mostra seu balanço. Isso dá mais que “duas” Cyrelas, maior do ramo no Brasil, cujas vendas totais no último ano foram de R$ 12,6 bilhões.

Se contar os shoppings, por exemplo, é maior que a Allos, grupo brasileiro que nasceu da fusão entre BrMalls e Aliansce. Neste momento, por exemplo, a SHPK está construindo um complexo com torres corporativas e shopping anexo à Estação West Kowloon, que liga Hong Kong à China pelo trem de alta velocidade. A estação é famosa pelas formas curvas do seu teto, onde foram plantadas árvores e com acesso ao público.

O grupo faz também obras de infraestrutura e tem subsidiárias no setor de telecom: uma operadora (SmarTone) e uma empresa de data centers (SUNeVision).

Quais são os motivos apresentados pela SHKP

Já a SHKP destaca, na proposta, que está engajada em uma forte campanha de internacionalização, fundamentada em um histórico de aquisição e reestruturação de empresas em dificuldades.

“Após uma avaliação preliminar dos documentos disponíveis através dos canais oficiais, bem como uma análise detalhada das informações financeiras e do portfólio imobiliário — com especial atenção ao land bank no Estado de São Paulo —, concluímos que a PDG Realty ainda possui bons ativos em seu balanço patrimonial e um potencial considerável para futuros lançamentos”, destaca a SHKP.

“Mesmo que a empresa esteja passando por um momento difícil, entendemos que o pior já ficou para trás, e os ativos atuais, alinhados à marca reconhecida e capacidade de execução, estão em sinergia com o atual momento da SHKP”, afirma o diretor de fusões e aquisições, Chen Wei, no documento.

“Nossa experiência em fortalecer estruturas de capital e retomar lançamentos com alta qualidade tem possibilitado a maximização do valor dos ativos e a liberação de significativas oportunidades de crescimento”, diz

Por que a oferta é incomum

A movimentação é incomum por vários aspectos. Primeiro porque a compra de incorporadoras é algo raro no Brasil. A maioria dos empresários entende que faz mais sentido adquirir os terrenos por conta própria e montar uma boa equipe de projetos em vez de se unir a outra empresa que pode carregar passivos de obras e vendas mal realizadas no passado.

O setor tem um ciclo longo desde a abertura do estande até a entrega da obra, e os problemas, como rescisões de vendas ou defeitos construtivos, costumam estourar só com o passar do tempo. A própria PDG Realty foi constituída a partir da compra e consolidação de três outras empresas, e o negócio saiu mal.

O segundo ponto é que o mercado imobiliário exige muito conhecimento local, passando pelas regras de licenciamento que variam a cada prefeitura, até a definição de qual é o melhor empreendimento para cada localização e público. Essa foi uma das maiores lições do passado.

Depois que as incorporadoras fizeram as primeiras ofertas de ações em Bolsa e se capitalizaram, nos idos de 2005 a 2010, houve uma corrida desenfreada para compra de terrenos. Tempos depois, muitos projetos não se mostraram viáveis.

Então, por que uma empresa estrangeira decidiu comprar uma incorporadora local, ainda mais a PDG, que carrega passivos?

Um analista de mercado imobiliário de um grande banco, que preferiu ficar no anonimato pelas regras de compliance, respondeu que não via “racional” por entender que construção seja um business local, “impossível estrangeiro tocar bem”. Na sua avaliação, tocar esse tipo de negócio requer “conhecer as esquinas de cada praça” e ter “boots on the ground (pé na lama)”.

Outro analista, com mesmo perfil, avaliou que, do “lado bom”, a empresa asiática largaria com toda a estrutura de uma empresa por um preço relativamente barato. Do “lado ruim”, entende que ela levaria junto todos os passivos, como dívida, obras atrasadas, contingências, disputas judiciais, entre outras, “que geralmente tornam o negócio inviável”.

Um terceiro analista ponderou que a empresa asiática talvez busque o negócio como forma de entrar no Brasil com uma marca conhecida. Segundo ele, parece ser um caso de pagar muito pouco para comprar uma empresa que já foi a maior do Brasil. Além disso, observa que a PDG seria um caso mais de reestruturação de passivos do que operacional. /Com Beth Moreira

Com informações do jornal Estado de São Paulo, Estadão

Fonte: https://agendadopoder.com.br/gigante-de-hong-kong-quer-comprar-a-pdg-realty-saiba-que-empresa-e-essa/