
Por mais incrível que pareça, é bastante comum encontrar relatos de pessoas que perceberam mudanças na personalidade depois de passar por um transplante de órgãos. E isso não é algo novo, com alterações sendo observadas praticamente desde o início da prática de transplantes pelo mundo. Há até situações em que os pacientes dizem começar a ter memórias ou medos que parecem não ser deles.
Um exemplo disso aconteceu na década de 1990, quando um receptor disse que desenvolveu repentinamente um amor pela música, logo após receber o coração de um jovem músico. Há outros casos que revelaram novos gostos por comida, arte, sexo e até mesmo carreiras, fora aqueles que afirmam que adquiriram novas lembranças.
A ideia de que é possível que órgãos transplantados carreguem fragmentos de personalidade, gostos e até memórias do doador não é um consenso científico. Contudo, existe um estudo recente que sugere que os receptores de transplante do coração e qualquer outro órgão pode sofrer mudanças de personalidade. Saiba mais na matéria abaixo!
Transplante de órgãos causa mudança de personalidade?
Um transplante de órgãos é um procedimento cirúrgico que visa a substituição de um órgão ou tecido doente por um órgão ou tecido saudável de um doador, e tem como objetivo salvar ou melhorar a qualidade de vida do receptor.
O processo é bastante complexo, e exige a presença de uma equipe de profissionais treinados, além da avaliação clínica, laboratorial e de imagem do doador, além de diversas etapas que acompanham o pré e pós cirúrgico.
Leia mais:
- Cinco sinais de demência e Alzheimer que você deve monitorar
- Tratamento famoso para Parkinson pode provocar perda de identidade? Entenda
- Quais são as 10 doenças mais perigosas do mundo?
O primeiro transplante de órgão vital aconteceu em 1954, e desde aquela época, algumas pessoas que receberam transplantes relataram significativas mudanças em suas personalidades ou preferências. Além do caso do receptor que começou a apreciar música clássica depois de receber o coração de um músico, há também uma mulher que desenvolveu aversão a carne após receber o coração de um vegetariano.
Em outro caso, um homem de 45 anos recebeu um coração de um menino de 17 anos e, desde então, passou a adorar colocar fones de ouvido e ouvir música alta, algo que ele nunca havia feito antes do transplante.
Pesquisadores da Universidade do Colorado, nos Estados Unidos, fizeram uma pesquisa envolvendo 47 participantes, sendo 23 que passaram por transplante de coração e 24 de outros órgãos. Após responderem uma pesquisa online, 89% deles confirmaram mudanças de personalidade, sendo quatro ou mais delas, e a maioria com relação ao temperamento, emoções, comida, identidade, crenças religiosas/espirituais ou memórias.
Mas, como é possível explicar um acontecimento tão extraordinário?

Memória celular, alterações epigenéticas e efeito placebo
Essa é uma das hipóteses mais faladas. A “memória celular” sugere que células fora do cérebro também poderiam ser capazes de armazenar memórias. O conceito é controverso, mas se baseia na descoberta de que o coração, por exemplo, conta com uma complexa rede neural, que poderia desempenhar outro papel além de apenas bombear nosso sangue.
O “pequeno cérebro do coração” estaria em constante comunicação com o cérebro principal, trocando informações que poderiam impactar a identidade de quem recebe o órgão.
Segundo algumas evidências que sugerem que a biologia também tem um papel importante nessas alterações, falam sobre as células do órgão transplantado desempenharem um papel em outras partes do corpo. Diversos órgãos e suas células liberam hormônios ou moléculas sinalizadoras, que possuem um efeito local e em outras partes do corpo.
Vale ressaltar que o coração parece estar mais comumente associado a essas mudanças de personalidade. Nesse caso, as câmaras liberam hormônios peptídicos, o que inclui o peptídeo natriurético atrial e o peptídeo natriurético cerebral, que ajudam a equilibrar os fluidos no corpo afetando os rins.
Além disso, eles também desempenham um papel no equilíbrio eletrolítico, e inibem a atividade da parte do sistema nervoso que cuida da resposta de luta ou fuga. As células responsáveis por isso são encontradas no hipotálamo, parte do cérebro que desempenha um papel em tudo, desde o equilíbrio dos sistemas biológicos até o humor.

O que isso tudo significa? Pode ser que o órgão do doador pode ter um nível básico de hormônios e uma produção de peptídeos diferente do órgão do receptor, alterando o humor e a personalidade dele por causa das substâncias que libera.
Foi demonstrado também que os níveis de peptídeo natriurético são mais altos depois do transplante, nunca mais voltando ao normal. Parte dessa elevação provavelmente é uma resposta ao trauma da cirurgia, porém, ela pode não ser responsável por tudo.
Existe também a teoria que envolve alterações epigenéticas, que são mudanças na forma pela qual os genes se expressam em resposta ao ambiente, neste caso, a presença de um novo órgão no corpo. Há ainda uma sugestão de que poderia se tratar de um efeito placebo, onde uma enorme alegria de receber um novo sopro de vida poderia dar mais disposição às pessoas.
Falta de consenso
Mesmo com algumas teorias, a ciência ainda não possui um consenso sobre esse assunto. Diversos especialistas apontam as causas para fatores psicológicos ou medicamentosos, que poderiam explicar os fenômenos. Isso porque o uso de imunossupressores e analgésicos que são usados depois do transplante pode causar alterações no apetite, no humor e na percepção de si mesmo.
O impacto emocional depois de passar por uma cirurgia tão arriscada e transformadora também pode fazer com que os pacientes reavaliem suas vidas e, muito provavelmente, atribuam essas mudanças com as características do doador.
Mesmo assim, há um grande volume de relatos curiosos que não pode ser ignorado. Alguns estudos mostram que quase 90% dos receptores de transplantes de coração apresentam mudanças de personalidade após a cirurgia, o que inclui alterações em preferências alimentares, crenças religiosas e até mesmo orientação sexual. Ainda que sejam experiências difíceis de ser comprovadas, elas abrem espaço para uma investigação mais profunda a respeito das conexões entre o corpo, a mente e a memória.
Fonte: The Conversation

O post É possível mudar de personalidade após um transplante de órgãos? Veja o que diz a medicina apareceu primeiro em Olhar Digital.
Fonte: https://olhardigital.com.br/2025/02/25/medicina-e-saude/e-possivel-mudar-de-personalidade-apos-um-transplante-de-orgaos-veja-o-que-diz-a-medicina/