
A camada de gelo da Groenlândia é a maior massa congelada do Hemisfério Norte, tendo uma espessura de cerca de 3 mil metros. Nas últimas décadas, ela está derretendo e preocupando os cientistas. Porém, um grupo de pesquisadores descobriu que os rios atmosféricos, um fenômeno climático que se pensava derreter a neve, estão ajudando a repor esse manto gelado.
Esses fluxos na atmosfera são normalmente associados ao transporte de calor e umidade de baixas latitudes para o Ártico. Na maioria dos casos, isso acaba por intensificar o derretimento de gelo.
No entanto, em março de 2022, um rio atmosférico intenso liberou 16 bilhões de toneladas de neve na Groenlândia. Isso foi o suficiente para compensar a perda anual de gelo da camada em 8%, relata o estudo.
A quantidade de neve fresca também foi responsável por recarregar o manto gelado do inverno. Essa nova carga de material congelado aumentou o albedo da neve e atrasou o início do derretimento em quase duas semanas.
“Fiquei surpreso com a quantidade de neve que foi despejada na camada de gelo em um período tão curto”, disse o coautor do estudo Alun Hubbard, glaciologista de campo nas Universidades de Oulu, Finlândia, e da Universidade Ártica de Tromsø, Noruega.
Uma grande nevasca mudou tudo
O Ártico aqueceu quatro vezes mais do que a média global desde 1980. As temperaturas mais altas devido às mudanças climáticas significam mais chuva, menos neve e um degelo mais intenso.
Com isso, espera-se que os rios atmosféricos aumentem de tamanho, sejam mais frequentes e tenham intensidade acentuada em respostas as mudanças do clima. Essa alteração é preocupante, pois caso a camada de gelo da Groenlândia derreta, o nível do mar subiria mais de sete metros.
A geoquímica Hannah Bailey, autora principal do estudo e pesquisadora na Universidade de Oulo, estava trabalhando em Svalbard em março de 2022 quando o fluxo atmosférico atingiu a ilha. Chuvas pesadas caíram sobre o local por dias, transformando a camada de neve do inverno em um atoleiro.

(Imagem: Schwarz Weiss / Wikimedia Commons)
Escavações na neve revelam o passado
Um ano depois, Bailey e Hubbard foram em busca de estudar traços do evento no sudeste da Groenlândia. Ambos queria compreender o impacto da nevasca no manto congelado.
Lá, a cerca de 2 mil metros acima do nível do mar, o frio é suficiente para que a neve se acumule ano após ano. Ela se comprime em camadas mais densas, chamadas de firn, e eventualmente se compacta em gelo glacial.
Nessa área, o grupo cavou um grande buraco no manto congelado e coletou amostras de 15 metros de firn. Nelas estão registrados quase uma década de acúmulo de neve.

A equipe usou isótopos de oxigênio e a densidade de diferentes camadas para calcular o perfil de idade e as taxas de acumulação da neve. Eles então compararam os dados climáticos e de tempo na área no mesmo período.
“Usar amostragem de núcleo de firn de alta elevação e análise isotópica nos permitiu localizar a queda de neve extraordinária deste rio atmosférico”, disse Bailey.
Rios atmosféricos podem ajudar a camada congelada
O rio atmosférico atingiu Svalbard com chuvas intensas. Mas, a 2 mil quilômetros de distância, trouxe neve em abundância para o sudeste da Groenlândia. Somente no dia 14 de março, 11,6 bilhões de toneladas de neve caíram sobre a camada de gelo. Cerca de 4,5 bilhões de toneladas se adicionaram ao montante nos dias seguintes.
Após três dias, a nevasca trouxe neve suficiente para compensar a perda de massa da camada de gelo em 8% no ano hidrológico de 2021-2022. Com a adição de neve fresca, o início do derretimento do gelo no verão atrasou cerca de 11 dias, apesar das temperaturas da primavera terem ficado acima da média, segundo diz o estudo.

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“Infelizmente, a camada de gelo da Groenlândia não será salva pelos rios atmosféricos”, disse Hubbard. “Mas o que vemos neste novo estudo é que, ao contrário das opiniões predominantes, sob as condições certas, os rios atmosféricos podem não ser todas más notícias.”
É necessário mais pesquisas para se compreender os efeitos complexos dos rios atmosféricos na Groenlândia. Porém, se o aquecimento global continuar, toda a precipitação desses fluxos cairá como chuva, agravando a perda de gelo, explica e conclui Bailey.
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Fonte: https://olhardigital.com.br/2025/03/09/ciencia-e-espaco/rios-atmosfericos-intensos-podem-estar-repondo-o-gelo-da-groenlandia/