10 de março de 2025
Em 7 estados brasileiros, informalidade ultrapassa os 50% e supera
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O Brasil atingiu recorde de vagas formais e o menor nível de desemprego da História em 2024, mas a informalidade ainda predomina em algumas regiões do país. Em sete estados, mais da metade dos ocupados não tem carteira assinada. Os dados, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua trimestral do IBGE, foram compilados pelo pesquisador Rodolpho Tobler, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), a pedido do jornal O GLOBO.

Segundo especialistas ouvidos pela reportagem, contribuem para esse quadro a baixa remuneração em vagas formais, especialmente para as que exigem pouca qualificação, além do desejo de maior flexibilidade de horários e da distância para o local de trabalho, no caso de quem mora na periferia.

Pesa ainda o fato de que a diferença de rendimento entre trabalhadores formais e informais no Brasil diminuiu nos últimos anos, conforme os dados do IBGE compilados por Tobler. Em 2015, a remuneração de empregados com carteira superava em 73% a daqueles sem carteira. No fim de 2024, essa diferença caiu para cerca de 31%.

No Pará, Piauí, Maranhão, Ceará, Amazonas, Bahia e Paraíba, a informalidade continua acima de 50% (veja infográfico abaixo). Esse patamar se mantém desde início da atual série histórica do IBGE. Em 2020, na Paraíba e na Bahia o índice chegou a recuar para entre 47% e 48%, mas foi reflexo da pandemia, não da melhora no mercado formal.

Retomada pós-pandemia puxa emprego formal

Segundo Tobler, o reaquecimento da economia após a pandemia impulsionou um aumento disseminado do emprego com carteira assinada, especialmente nos últimos dois anos. Esse crescimento foi maior, em termos percentuais, no Norte e Nordeste, onde a informalidade é historicamente mais alta e havia mais espaço para a expansão do trabalho formal. Mas não alterou o quadro estrutural dessas regiões, diz o pesquisador:

— Tem muito a ver com a dinâmica da atividade econômica. A estrutura produtiva dessas regiões, muitas vezes, está ligada à informalidade. Um grande ponto dessa questão estrutural é ter políticas públicas que tentem reduzir isso e busquem qualificar e formalizar essas pessoas (informais). Algo já tem sido feito, mas talvez seja preciso um olhar mais local, que é muito importante.

Manoel de Jesus, de 72 anos, morador de São Luís, no Maranhão, teve seu último emprego com carteira assinada, como chefe de almoxarifado, há sete anos. Hoje, vende produtos eletrônicos e acessórios para celular em uma loja on-line que promove nas redes sociais. Ele sente falta do regime CLT, que lhe permitia planejar melhor o orçamento:

— Gostaria de voltar a ter carteira assinada, mas para a minha idade fica difícil.

Destaques de alta e de baixa

Na Bahia, apesar do recorde de 1,8 milhão de trabalhadores com carteira assinada no setor privado no fim de 2024 — o maior em dez anos —, mais da metade dos ocupados (51,4%) ainda estava na informalidade. No Pará, mesmo com o emprego formal no maior nível desde 2012, a taxa de informalidade ficou em 58,1%. Já na Paraíba, vagas com carteira também bateram recorde, com alta de 15,1%, mas a informalidade ficou em 50,6%.

Por outro lado, Santa Catarina, outro estado recordista de emprego formal, registrou a segunda menor taxa de informalidade da série. É um estado com desemprego muito baixo, cujo resultado foi puxado pelo desempenho positivo da indústria, diz Tobler.

O Distrito Federal alcançou o maior patamar de empregados no mercado formal no ano passado. Mato Grosso do Sul (32,7%), Mato Grosso (32,9%) e Goiás (36,5%) também ficaram com baixas taxas de informalidade.

Esses estados, explicam analistas, têm renda per capita maior e economias mais desenvolvidas. No caso do DF, pesa ainda a grande parcela de funcionários públicos.

Rio na contramão

Enquanto a maioria dos estados brasileiros avança na formalização do trabalho, o Rio de Janeiro vai na contramão. A informalidade, em alta desde 2017, atingiu 38,3% em 2024. Para Bruno Imaizumi, economista da LCA Consultores, é um reflexo de problemas de segurança pública, violência e corrupção, que dificultam a atração negócios para gerar empregos no estado.

A configuração do emprego informal no país também mudou na última década, explica Tobler. Embora a maioria dos trabalhadores brasileiros esteja nessa condição pela necessidade, uma parte crescente tem optado por esse caminho para ter controle sobre seu tempo e sua renda. Um reflexo do aumento da participação dos serviços na economia.

— A informalidade acabou ganhando mais peso, e o que vemos é uma dualidade. Muitos que estão na informalidade, embora queiram a estabilidade e os benefícios do emprego formal, já valorizam a flexibilidade que o emprego informal proporciona — diz Tobler.

Formal ganha mal

Uma das razões pelas quais o trabalhador permanece na informalidade é a perspectiva de maior renda, explica João Saboia, professor emérito do Instituto de Economia (IE) da UFRJ. Para um profissional com baixa escolaridade e pouca qualificação, a escolha é entre um emprego formal com salário mínimo e uma ocupação informal com potencial de dobrar o rendimento.

— As pessoas gostam de ter a carteira assinada, mas se a renda for muito baixa, é melhor recorrer à informalidade e trabalhar por conta própria — afirma Saboia.

Isso ficou evidente em uma pesquisa da UFRJ, que ouviu motoristas e entregadores de aplicativos no Rio. O estudo, publicado na Revista de Economia Contemporânea do IE, em 2024, mostra que o trabalho formal hoje é pouco atraente para eles.

— Ficou claro que a alternativa (formal) para eles é muito ruim. E tem essa questão de ser dono do seu nariz e não ter o empregador direto enchendo o saco. E isso não acontece só entre o pessoal que trabalha via aplicativo. O sonho de “ser empreendedor” cresceu nos últimos anos — diz Saboia.

Da Marinha para o app

Morador do Rio, Johny Branco, de 31 anos, era militar concursado, mas deixou a Marinha em 2021 para trabalhar em tempo integral como motorista de aplicativo. Em troca da estabilidade e dos benefícios do setor público, diz, pesaram a maior liberdade e a remuneração.

— Foi uma escolha muito pensada. Já fazia as corridas nos fins de semana, como complemento, e entendi que poderia ganhar mais. Fora que sou dono do meu tempo.

Parte da renda extra vai para a manutenção do carro, e o resto, para viagens com a mulher e os filhos. Quanto ao futuro, ele conta que passou a pagar a aposentadoria como microempreendedor individual (MEI), por onde também fez seu plano de saúde.

Branco ainda planeja cursar uma faculdade para, quem sabe, prestar outro concurso e conquistar uma remuneração maior. Para ele, trabalho no setor privado com carteira, só por pelo menos R$ 5 mil e de segunda a sexta-feira.

Mais difícil na periferia

Para trabalhadores das periferias, conseguir um emprego que pague mais que um ou dois salários mínimos é raro, e as vagas formais não oferecem oportunidades reais de crescimento, diz Renato Meirelles, fundador do Data Favela. A distância entre a casa e o trabalho é outro fator que leva muitos a preferirem o empreendedorismo ou bicos, para ter mais controle sobre o próprio tempo.

— Não surpreende que a pesquisa do Data Favela mostre que 67% das pessoas acreditam que o fim da escala 6×1 daria mais tempo para o lazer e a família. O brasileiro da periferia quer ser dono do seu relógio, poder assistir um jogo de futebol em paz no fim de semana, levar os filhos para passear sem pressa, viver além de simplesmente trabalhar — diz Meirelles.

Embora o emprego formal ofereça maior proteção social, os mais jovens têm disposição para encarar jornadas de até 12 ou 14 horas em troca de maiores ganhos e autonomia, aponta Saboia. Assim, com a menor taxa de desemprego da História, muitas empresas relatam dificuldades em encontrar profissionais qualificados.

Para Saboia, o principal desafio do mercado de trabalho é superar a baixa produtividade, diretamente ligada à qualificação profissional e a maiores investimentos privados. Ele aponta que a solução passa por políticas como o aumento do salário mínimo — adotada pelo governo Lula —, que torna o emprego formal mais atraente e impacta até a renda dos informais, já que o piso serve de referência para o mercado.

Incentivo ao MEI

O professor da UFRJ também defende o incentivo à formalização via MEI, o avanço na regulamentação do trabalho por aplicativos e o reforço da fiscalização das empresas que não contratam formalmente.

— É política pública. Tem de convencer as pessoas de que vale a pena ser MEI. Os jovens têm dificuldade de pensar no futuro — diz Saboia.

Medidas que garantam alguma segurança previdenciária, direitos básicos e apoio financeiro transformam o emprego informal em oportunidade, diz Meirelles. Para ele, a digitalização evidenciou o desejo do brasileiro de ser dono do próprio negócio:

— Hoje, o trabalhador informal não é só aquele que vende pastel na esquina, mas também quem entrega comida por aplicativo ou faz vendas pela internet. Se isso é sustentável ou não, depende de como lidamos com essa transformação.

Como exemplo de políticas públicas, Meirelles cita a necessidade de crédito fácil e barato, simplificação dos processos burocráticos e capacitação profissional para os informais:

— O exemplo do MEI já mostrou que é possível dar certo, mas precisamos ir além.

Com informações de O GLOBO.

Fonte: https://agendadopoder.com.br/em-7-estados-brasileiros-informalidade-supera-em-50-o-trabalho-formal-saiba-quais-sao/