
A visita de Estado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Japão, entre 24 e 27 de março, deve ter um viés comercial destacado. Os países organizam um fórum empresarial em Tóquio, e autoridades japonesas esperam que mais de 100 executivos de empresas brasileiras, entre elas a Embraer e a JBS, integrem a delegação que acompanhará o presidente.
Em fevereiro, a companhia aérea japonesa ANA (All Nippon Airways) anunciou uma encomenda de até 20 aviões da fabricante brasileira Embraer para atender rotas domésticas. Serão 15 aeronaves E190-E2 com possibilidade de extensão para mais 5 unidades do mesmo modelo de 100 assentos. Será a estreia do jato regional no mercado japonês. Ele deve começar a operar em 2028. O valor é de US$ 1,6 bilhão.
A JBS, por sua vez, busca expandir suas exportações de carne suína e, assim como as demais do setor, abrir o mercado de carne bovina ao Japão. Segundo o Itamaraty, cerca de 70% da carne bovina consumida no país é importada − sendo que EUA e Austrália conseguem atender exigências e dominam o mercado nipônico com participação de 80%.
Há anos autoridades públicas brasileiras e o setor privado de proteína animal tentam abrir o mercado japonês. Missões recentes foram realizadas nas últimas semanas, bem como visitas ministeriais e técnicas de autoridades agrícolas japonesas para inspecionar animais e frigoríficos no Centro-Oeste − entre eles uma unidade da JBS em Mozarlândia (GO).
Os japoneses buscam que o Brasil se adeque às suas exigências sanitárias. No ano passado, o ministro Carlos Fávaro (Agricultura) disse que a principal barreira era ter todo o rebanho nacional livre de febre aftosa sem vacinação. O País anunciou a autodeclaração em maio. O Ministério da Agricultura espera receber esse reconhecimento internacional, passados 12 meses, em maio de 2025, pela Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA).
Há grande expectativa de concretizar a negociação bilateral durante a visita de Lula, mas autoridades envolvidas nas conversas pregam cautela. Uma fonte do governo disse que talvez a viagem não consiga resolver a questão. Pode ser que o embarque em si comece meses depois. O Japão é reconhecidamente um mercado exigente, com carnes de alta qualidade, e por isso também interessante do ponto de vista de preços pagos aos produtores. Há possibilidade de remuneração maior.
Em fevereiro, uma missão técnica discutiu: a flexibilização da idade limite para o abate de bovinos, a habilitação de novas plantas frigoríficas para exportação de carne de aves termoprocessadas, a abertura do mercado japonês para a carne bovina e da ampliação do acesso da carne suína, ajustes nos requisitos de tratamento térmico para a exportação de mangas e medidas para regionalizar o controle da influenza aviária.
A expectativa do governo brasileiro é que o país autorize as primeiras importações da carne brasileira a partir da visita de Lula. No mês passado, o presidente disse que viajaria “com a perspectiva de abrir o Japão para comprar carne brasileira” e citou que, em 2005, no primeiro mandato, conseguiu negociar a exportação de frutas ao país, segundo maior parceiro comercial do Brasil na Ásia.
Parte dos frigoríficos australianos que exportam ao Japão pertence à gigante brasileira JBS e, no momento, há interesse japonês em diversificar as fontes de proteína animal por causa do aumento de preços da carne bovina americana, ressaltam diplomatas, relacionado à escassez de gado nos EUA.
O setor privado estima a demanda em 700 mil toneladas por ano e entende que consegue fazer frente, em preço, aos produtos americanos e australianos. O foco inicial não seriam os cortes premium, mas a chamada carne ingrediente, usada na indústria alimentícia. O mesmo perfil da exportação brasileira à China.
Mercosul
Outro potencial assunto é o avanço de negociações entre Mercosul e Japão para um acordo comercial. Já houve uma rodada inicial de conversas. Há alguns anos o bloco mantinha aproximação por meio de um “diálogo” recorrente entre autoridades dos dois lados, mas o formato se esgotou.
Segundo uma fonte diplomática, agora falta a decisão política de dar início formal às negociações de um acordo. O Mercosul é favorável, mas há resistências no Japão, justamente para proteção do agronegócio local.
A avaliação é de que a conclusão de negociações do acordo de associação do Mercosul com a União Europeia − e sua potencial assinatura neste ano − coloca pressão sobre o Japão − um exemplo é que as montadoras de automóveis japonesas tendem a ficar em desvantagem em relação às europeias.
Na Ásia, o primeiro acordo do Mercosul foi fechado em 2023, com Singapura. Há contatos com Vietnã − país que também é foco da carne brasileira e será visitado por Lula em seguida nos dias 27 e 28 de março −, Indonésia e Canadá.
Palácio Imperial
A visita é cercada de prestígio. Lula será recebido no Palácio Imperial em visita de “primeira categoria”, conforme o protocolo japonês. O imperador Naruhito somente recebe um chefe de Estado por ano com tal deferência.
Conforme diplomatas japoneses, há 30 anos um presidente brasileiro não é recebido no país com essas honras. Lula foi o escolhido para retomar a prática, no Palácio Imperial, após seis anos de paralisia − as recepções ficaram suspensas sobretudo por causa da covid-19.
“Escolhemos o presidente brasileiro para retomar e isso mostra como é importante a relação com o Brasil para o povo japonês”, disse o embaixador Teiji Hayashi.
Lula vai ao Japão pela segunda vez neste mandato. Em 2023, ele visitou Hiroshima para participar como convidado da Cúpula do G-7. No ano passado, vieram ao Brasil o atual primeiro-ministro japonês, Shigeru Ishiba, para a Cúpula do G-20, e o antecessor, Fumio Kishida.
Lula confirmou a visita ao Japão no ano passado. Os países celebram em 2025 os 130 anos de amizade. O Japão sedia neste ano a Expo Osaka 2025 − a Apex Brasil instalou um pavilhão de 1 mil metros quadrados.
Turismo
Também na vertente de negócios, os países vão celebrar o acordo de 2023 para isenção recíproca de vistos de curta duração (90 dias). O governo Jair Bolsonaro havia isentado de vistos de turismo Japão, Estados Unidos, Austrália e Canadá.
Lula prometeu retomar a cobrança em 2023, baseado na reciprocidade, e abriu negociações. Depois postergou a isenção. A cobrança deve voltar a partir de abril para viajantes americanos, australianos e canadenses.
Números compartilhados na quarta-feira, 12, em evento na embaixada japonesa mostram um crescimento no fluxo de pessoas, próximo de 150 mil em trânsito anualmente.
Segundo a JNTO, órgão de fomento ao turismo no Japão, houve um aumento na chegada de brasileiros de 51% com a queda do visto.
Com a isenção, segundo o Ministério do Turismo, houve um aumento de 42,3 mil turistas japoneses no Brasil, em 2023, para 61,1 mil em 2024 − 44% a mais. A projeção da Embratur é que o contingente chegue a 82 mil neste ano. Já 76 mil brasileiros visitaram o Japão entre janeiro e novembro de 2024, um aumento de 73% em relação a 2023.
Um dado relevante são os gastos, conforme a Embratur. Uma pesquisa mostra que o gasto médio diário de turistas em viagens internacionais é de US$ 265. No perfil dos japoneses, as despesas são de US$ 2,4 mil.
O Brasil conta com a maior população nipodescendente fora do Japão: são mais de 2 milhões de pessoas. Do outro lado, o Japão abriga a quinta maior comunidade brasileira no exterior, com 211 mil expatriados.
Com informações do jornal Estado de São Paulo, estadão
Fonte: https://agendadopoder.com.br/lula-deve-levar-ao-japao-comitiva-com-100-empresarios-entre-eles-jbs-e-embraer/