
A uma semana do julgamento que pode tornar Jair Bolsonaro réu por tentativa de golpe de Estado, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) decidiu se licenciar do mandato após alegar perseguição do Poder Judiciário. O movimento do filho do ex-presidente, que surpreendeu parte do Congresso, é mais uma tentativa de mobilizar aliados diante do possível revés no Supremo Tribunal Federal (STF).
No domingo, Bolsonaro liderou uma manifestação esvaziada em Copacabana, no Rio, onde fez apelos ao Legislativo por uma anistia aos condenados do 8 de Janeiro. Agora, Eduardo pretende ficar nos Estados Unidos, segundo ele, até que o ministro Alexandre de Moraes, do STF, seja punido por “abuso de autoridade”. A ideia é continuar a dialogar com integrantes do governo Donald Trump e tentar exercer uma pressão externa sobre a Justiça brasileira.
Ao se afastar da Câmara, Eduardo citou, em vídeo divulgado nas redes sociais, um despacho de Moraes para que a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestasse sobre um pedido do PT para que seu passaporte fosse apreendido. O parlamentar está nos EUA há 22 dias, onde vem fortalecendo conexões com a direita americana.
Na terça-feira, após o anúncio de Eduardo, o procurador-geral, Paulo Gonet, pediu o arquivamento da chamada “queixa-crime” relacionada ao assunto. Na representação do PT, parlamentares alegavam que Eduardo atentava contra a soberania nacional ao criticar o STF no exterior.
Moraes arquiva caso
Horas depois, Moraes arquivou o caso, esvaziando assim os argumentos do filho do ex-presidente, que havia citado o perigo, inclusive, de decretação de prisão por parte do ministro do Supremo. Eduardo não é investigado no STF pela suposta trama golpista e responde perante a Corte apenas a processos de difamação.
— Se Alexandre de Moraes quer prender meu passaporte ou mesmo me prender para que eu não possa mais denunciar seus crimes nos EUA, então é justamente aqui que vou ficar e trabalhar mais do que nunca. Abdico temporariamente do meu mandato, irei me licenciar sem remuneração, para que eu possa me dedicar integralmente para que eu possa buscar as devidas sanções para os violadores dos direitos humanos — afirmou o filho do ex-presidente em vídeo gravado do exterior.
Na terça-feira, em entrevista à CNN Brasil, Eduardo chegou a dizer que pretendia pedir asilo político ao governo americano. Já à Revista Oeste, dirigiu críticas diretas a Moraes e disse que não havia “a mínima” chance de retornar ao país, mesmo após o pedido de apreensão do passaporte ser arquivado.
Já o ex-presidente fez um agradecimento a Trump por “abraçar” o seu filho. Bolsonaro lembrou que ele próprio está com passaporte retido devido à apuração da suposta tentativa de um golpe de Estado.
— Confiscaram meu passaporte, mas meu pensamento está com Donald Trump, que seguirá abraçando o meu filho. Coisa rara no Brasil, (no meu governo) tivemos um presidente alinhado com democracias no mundo todo, inclusive a americana. Mas todo sacrifício é válido quando queremos um país forte, independente e livre.
Durante visita a uma exposição em memória às vítimas do Holocausto no Senado, Bolsonaro associou as perseguições judiciais que Eduardo afirma sofrer ao nazifascismo.
Eduardo era cotado para assumir a Comissão de Relações Exteriores da Câmara (Creden), por indicação do PL. A ideia seria usar o cargo para uma aproximação institucional com o governo americano. O grupo é responsável pelas relações diplomáticas e consulares da Casa com governos e entidades internacionais.
Mesmo licenciado, Eduardo Bolsonaro não perde o mandato, apesar de o salário ser cortado. Na terça-feira, Bolsonaro sugeriu que já recebeu pedidos para manter o filho no exterior e indicou que ele próprio pode bancá-lo financeiramente.
Em caráter reservado, ministros do Supremo afirmam que a iniciativa do deputado federal pode indicar uma “preparação de clima” por parte de Bolsonaro para deixar o país.
Aliados do PL tentaram, durante o dia, argumentar que Eduardo resistia a atos arbitrários. Antes de tomar sua decisão, o parlamentar ligou para o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), e posteriormente avisou à bancada do partido.
— Foi uma decisão pessoal e corajosa. Ele não tinha comentado nada, mas o partido respeita a decisão dele — disse o deputado Altineu Côrtes (PL-RJ).
Flávio diz que pai fica
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), irmão de Eduardo, disse que a atitude era “necessária”. Ele negou ainda que o pai possa estar negociando qualquer pedido de asilo político ou possa ir também para os Estados Unidos.
— Não tem nada a ver uma coisa com a outra. Não podem misturar as coisas. Se o Bolsonaro quisesse estar lá fora, ele já estaria. Ele a todo momento fala que vai permanecer aqui no Brasil, por mais que saiba que o julgamento dele é completamente contaminado, em todos os aspectos.
Nas redes sociais, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), postou uma foto ao lado de Eduardo em uma motociata. Na legenda, escreveu: “Conte sempre com o meu apoio”.
Já o PL, em nota, disse receber com “tristeza” o pedido do parlamentar. “Eduardo tem o nosso respeito! O Partido Liberal segue a postos, acreditando na força política do nosso país e nas instituições”.
Parlamentares de esquerda, por sua vez, ironizaram a atitude de Eduardo. “Vai fugir, né? Tchau, querido”, postou a deputada Maria do Rosário (PT-RS), em referência a bordão da oposição no impeachment de Dilma Rousseff.
A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) comparou a ida de Eduardo para os EUA ao filme “A Fuga das Galinhas” e disse que ele teria aprendido a estratégia com o blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, foragido da Justiça brasileira desde 2021.
Desde domingo, Bolsonaro pressiona bancadas de partidos do Centrão a avançar com o projeto da anistia aos condenados do 8 de Janeiro. O presidente da Câmara, porém, resiste a apoiar a pretensão e já sinalizou que não irá tumultuar o ambiente da Casa.
Bolsonarismo sob pressão
- Ato em favor da anistia esvaziado: Bolsonaro anunciou que esperava reunir em Copacabana, no último domingo, cerca de 1 milhão pessoas na manifestação a favor da anistia aos envolvidos nos atos golpistas do 8 de Janeiro. Pesquisadores da USP estimaram 18,3 mil presentes, por meio de um método que analisa imagens aéreas.
- Proposta parada no Congresso: Os presidente da Câmara, Hugo Motta, resiste em pautar o projeto de anistia aos condenados pelo 8 de Janeiro. Ele disse a aliados que não cederá à pressão de bolsonaristas nas ruas. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, também tem sinalizado que a proposta não teria andamento da Casa. Já os partidos do Centrão estão rachados.
- Possibilidade de Bolsonaro virar réu: A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal marcou para a próxima terça-feira a análise da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outras sete pessoas por suposta tentativa de golpe de Estado. Caso a denúncia seja aceita, Bolsonaro vira réu.
Com informações de O GLOBO.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/com-bolsonarismo-na-berlinda-eduardo-tentara-mobilizar-aliados-nos-eua-contra-o-stf/