
Hoje, dia 19 de abril, é celebrado o Dia dos Povos Indígenas, uma data criada para valorizar a história, a cultura e a contribuição dos povos originários na formação do Brasil. A data foi escolhida em homenagem ao Primeiro Congresso Indigenista Interamericano, que aconteceu em 19 de abril de 1940, no México. O congresso reuniu líderes indígenas de várias regiões do continente americano para debater medidas de proteção aos povos originários.
Em 1943, o então presidente Getúlio Vargas instituiu o dia 19 de abril como o “Dia do Índio”. Mas em 2022, a Lei nº 14.402 alterou a denominação da data para “Dia dos Povos Indígenas”. Além de ser uma homenagem, esse dia é também um convite à reflexão sobre o papel essencial que os indígenas desempenham na proteção da natureza, sobre seus direitos e sobre a demarcação de terras.
Segundo o Censo 2022, o Maranhão é o 3º estado com maior população indígena do Nordeste. De acordo com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), hoje existem 20 territórios indígenas no Maranhão, nos quais vivem etnias, como Ka’apor, Guajá, Tenetehara, Timbira, Kanela, Krikati e Akróa Gamella.
Preservação do meio ambiente
O jornal O Imparcial teve a oportunidade de conversar com o Kum’tum Akróa Gamella, da aldeia Cajueiro Piraí, localizada na Terra Indígena Taquaritiua, no município de Viana. Kum’tum é membro do Conselho de Lideranças e falou sobre a importância dos povos indígenas na preservação do meio ambiente. “Nós estamos lutando todos os dias pelo nosso futuro, não só o nosso, como também o futuro da Terra”.
Além de garantir a própria sobrevivência, o povo Akróa Gamella desempenha um papel fundamental no combate às mudanças climáticas. Isso porque a preservação das florestas ajuda a controlar o clima, regular as chuvas, proteger nascentes e armazenar carbono — um dos gases responsáveis pelo aquecimento global. Em outras palavras, proteger os territórios indígenas é também proteger o planeta.
Ao ser questionado sobre a relação dos povos indígenas com a natureza, Kum´tum afirmou que seria quase como uma relação umbilical, ambos complementam a própria existência.
“O conhecimento tradicional construído por milhares de gerações indígenas permitiu que os povos estabelecessem uma relação profunda de respeito com as vidas que lhe cercam. Podemos viver sem destruir, diferente de um plantador de soja”, afirma.
Além da relação de respeito, o povo Akróa Gamella também possui uma rotina de práticas sustentáveis que ajudam a preservar a natureza em que eles vivem. Segundo Kum’Tum, as práticas de extração de madeira e palha acontecem de acordo com determinadas fases da Lua, para que não se estraguem e o impacto seja menor. “Essa é a relação que a gente estabeleceu ao longo dos séculos e que ainda nos permite estar aqui”, expressa.
COP30
Em novembro deste ano, na cidade de Belém, acontecerá a COP30, 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (Conferência das Partes), um encontro global anual onde líderes mundiais, cientistas, organizações não governamentais e representantes da sociedade civil discutem ações para combater as mudanças do clima.
Kum´tum também conversou com O Imparcial sobre o assunto. Para ele, a COP30 não deve ser um espaço onde grandes empresas e grandes negócios irão discutir sobre como continuar destruindo o planeta, emitindo gases e queimando florestas para o plantio. “Não pode ser o lugar de negociar o futuro da Terra. A sociedade precisa nos ouvir”.
“O debate sobre mudança climática só vai acontecer de verdade, se levar para o centro dele a vivência dos povos originários com a natureza. Eles podem negociar o que chamam, erroneamente, de recursos naturais, mas para nós é a nossa vivência”, acrescenta Kum’tum Akróa Gamella.
A COP30 ser realizada em Belém, no Brasil, é uma esperança de que as vozes dos povos originários serão ouvidas, de que a história será reparada. Afinal, não haveria Brasil sem os povos originários.
Demarcação de terras
O território reivindicado pelo povo Akróa Gamella possui uma documentação desde o ano de 1759, limitando a área em 14 mil hectares. De lá para cá, ocorreram muitas invasões as terras por fazendeiros que os queriam fora das suas terras, parte dessas foram loteadas e vendidas. Os Gamella foram considerados extintos pelo Estado brasileiro. Atualmente, o povo só ocupa 552 hectares de todo o território original.
No ano de 2014, a comissão do povo Akróa Gamella demandou novamente a demarcação das terras indígenas para a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), fundação responsável por promover e proteger os direitos indígenas. Todavia, o processo foi interrompido durante o governo Bolsonaro devido ao seu posicionamento.
Em 2023, com o Governo Lula, a política de demarcação de terras voltou a funcionar e desde então o povo Akróa Gamella tem esperado o seu direito ser atendido. Sobrevivendo a lutas diárias de preconceito, negligência e violência, os Gamella esperam ter seus direitos territoriais, culturais e sociais serem reconhecidos pelo governo municipal, estadual e federal.
Kum’Tum contou que a unidade de saúde da SESAI (Secretaria de Saúde Indígena), em Viana nega atendimento ao seu povo com a justificativa de que eles não habitam em terras demarcadas pelo Estado.
“A demarcação de terras indígenas é uma imposição constitucional. Quando não somos reconhecidos por não ter a terra demarcada, somos penalizados duas vezes. Por não ter nossa terra e pelos nossos direitos não serem atendidos”, declara Kum’Tum.
Os Akróa Gamella lutam pela demarcação de terras, pelo direito à saúde e educação, pelo simples direito de viverem livres nas suas terras. Os Gamella são alvos de grilagem de terras, expulsão de famílias e pulverização com agrotóxicos. Eles resistem e lutam para manter a sua cultura e identidade vivas.
A data de 19 de abril, portanto, é mais do que uma celebração. É um lembrete de que os povos indígenas não estão apenas cuidando da natureza, mas também lutando por seus direitos e pela sua sobrevivência. Reconhecer essa importância e apoiar sua luta é uma das formas mais eficazes de garantir um futuro mais equilibrado e consciente para o Brasil.
Fonte: https://oimparcial.com.br/brasil/2025/04/dia-dos-povos-indigenas-resistencia-do-povo-akroa-gamella-e-a-preservacao-de-sua-terra/