
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva avalia a substituição do atual modelo de vale-refeição e vale-alimentação por repasses diretos aos trabalhadores via Pix. A medida, em estudo pela equipe econômica, integra o debate sobre a regulamentação do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) e busca, entre outros objetivos, eliminar custos operacionais associados à intermediação de grandes empresas do setor.
A proposta é considerada uma alternativa para garantir que os valores cheguem integralmente ao trabalhador, sem descontos aplicados por operadoras de cartões, ao mesmo tempo em que o governo tenta mitigar os efeitos da alta da inflação de alimentos. O aumento nos preços tem impactado o poder de compra da população de baixa renda, elevando a preocupação no Palácio do Planalto com os reflexos sociais e políticos dessa pressão inflacionária.
Segundo integrantes do governo, o novo modelo também poderia modernizar o sistema de benefícios e aumentar a eficiência do uso dos recursos. No entanto, há divergências internas sobre a possibilidade de os valores serem utilizados para outros fins que não a alimentação, caso sejam transferidos diretamente para contas bancárias.
“Nós temos que trabalhar internamente aqui para ver se elas [definições] são juridicamente viáveis para, no prazo de mais ou menos 30 dias, termos uma primeira iniciativa de regulamentação do PAT em benefício do trabalhador”, afirmou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, após reunião no Palácio do Planalto com os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Luiz Marinho (Trabalho e Emprego), além do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo.
Uma ala do governo defende que os valores repassados por Pix tenham destinação livre, como forma de ampliar o poder de decisão dos trabalhadores. Outra parte sustenta que a finalidade deve permanecer restrita à alimentação, preservando o espírito original do PAT.
O debate também mobiliza entidades empresariais. A Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), que representa as principais operadoras de vale-refeição e alimentação, criticou a proposta. Em nota, a entidade classificou a medida como “uma ameaça à existência do PAT”, programa criado há quase cinco décadas e que atualmente atende mais de 23 milhões de brasileiros, em sua maioria com renda de até cinco salários mínimos.
Segundo a ABBT, a transformação do benefício em repasse direto alteraria sua natureza jurídica, passando a ser considerado parte do salário e, portanto, sujeito a encargos trabalhistas, previdenciários e fiscais. Esse aumento de custos, argumenta a associação, poderia levar muitas empresas a deixarem de oferecer o benefício, que hoje é facultativo.
A entidade também alertou para o risco de desvio de finalidade. De acordo com a ABBT, estudos apontam que, quando pagos em dinheiro, os valores do benefício tendem a ser utilizados em despesas como pagamento de dívidas, entretenimento ou apostas.
Como alternativa, a ABBT defende a ampliação do PAT, com extensão dos incentivos fiscais a micro e pequenas empresas do Simples, atualmente fora do escopo do programa. Para a entidade, a proposta em debate pode representar “uma perda irreparável para o trabalhador”, especialmente em um cenário de inflação elevada e insegurança alimentar.
A resistência também vem do setor de alimentação. O presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci, afirmou que a proposta pode reabrir espaço para o chamado rebate — prática em que operadoras oferecem descontos a empresas para fechar contratos, o que já foi alvo de críticas e medidas de combate por parte do governo.
“O que sempre defendemos foram ajustes regulatórios que levassem a mais concorrência, o que aos poucos tem acontecido”, disse. “O problema é o subsídio e a interferência do Estado. O governo e suas empresas não deveriam subsidiar mais este benefício ao trabalhador, até por razões fiscais”, disse Solmucci.
A proposta de pagamento via Pix surge paralelamente às discussões sobre a regulamentação da portabilidade e da interoperabilidade entre os cartões oferecidos pelas empresas beneficiárias do PAT. Uma das possibilidades em análise é que o Ministério do Trabalho assuma a regulação do setor, uma vez que o Banco Central já sinalizou que não pretende assumir essa função.
As decisões finais ainda dependem de avaliações jurídicas e da costura política em torno da regulamentação do programa, cuja revisão se tornou prioridade diante do cenário econômico e das pressões por maior eficiência e justiça na concessão de benefícios aos trabalhadores.
Com informações da Folha de S. Paulo.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/governo-lula-estuda-substituir-vale-refeicao-por-pagamento-via-pix-direto-aos-trabalhadores/