
Diferentes áreas do cérebro controlam funções cognitivas diferentes. A percepção da fala e a interpretação da linguagem, por exemplo, são dominadas pelo hemisfério esquerdo do órgão. Mas pesquisas recentes apontam que o hemisfério direito também processa sons, mas faz isso de maneira diferente. O assunto foi tema de um artigo publicado pela professora Hysell V. Oviedo, da Universidade de Washington em St. Louis, no portal The Conversation.
Essa “divisão do trabalho” do cérebro para processar informações sonoras é conhecida pela comunidade científica há mais de 160 anos, mas os mecanismos ainda são pouco estudados.
Pesquisadores sabem que tipos diferentes de neurônios precisam ser sintonizados para diferentes frequências e tempos de som. Estudos realizados nas últimas décadas, utilizando animais, principalmente camundongos, ajudam a identificar como cada lado compreende esses sons.
A pergunta principal que orienta essas pesquisas é: “O que faz com que regiões quase idênticas em hemisférios opostos do cérebro processem diferentes tipos de informação?”
A resposta a essa pergunta pode contribuir para a compreensão de como a vivência influencia a formação dos circuitos neurais durante períodos críticos do desenvolvimento.
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Como a pesquisa foi conduzida e o que revelou
Por mais de uma década, meu trabalho como neurocientista tem se concentrado no córtex auditivo. Meu laboratório demonstrou que camundongos processam sons de forma diferente nos hemisférios esquerdo e direito do cérebro, e trabalhamos para desvendar os circuitos subjacentes.
Hyssel V. Oviedo
O lado esquerdo, por exemplo, detecta características importantes da fala, como a identificação de palavras diferentes. Já o lado direito processa melhor melodias e a entonação da fala. Pesquisadores acreditam que essa divisão começa na cóclea, uma região interna do ouvido.
(Imagem: Jonathan E. Peelle, CC BY-SA)
A pesquisa também aponta que o tempo é um fator importante que influencia as diferenças de desenvolvimento entre a audição esquerda e a direita. O trabalho monitorou como os circuitos neurais nos córtex auditivos esquerdo e direito se desenvolvem desde o nascimento até a idade adulta. Para isso, os seguintes passos foram seguidos:
- Registro de sinais elétricos nos cérebros dos camundongos para observar o amadurecimento do córtex auditivo.
- Observação de como experiências sonoras influenciam a estrutura do córtex auditivo.
Assim, os pesquisadores chegaram a algumas conclusões:
- O hemisfério direito apresentou desenvolvimento mais rápido e refinado que o esquerdo.
- Foram identificadas janelas críticas de desenvolvimento distintas para cada hemisfério, ou seja, períodos curtos em que o cérebro é especialmente sensível aos sons do ambiente.
- Cada hemisfério é mais sensível em momentos diferentes desse desenvolvimento.
- A exposição a sons durante essas janelas críticas causou alterações permanentes no processamento auditivo dos camundongos.

(Imagem: Gorodenkoff/Shutterstock)
Após identificar que cada hemisfério é mais sensível em momentos diferentes, os camundongos jovens foram expostos a tons específicos em períodos sensíveis do desenvolvimento – o que levou a outras conclusões:
- O processamento sonoro nos cérebros dos camundongos adultos foi permanentemente distorcido.
- Camundongos expostos a tons durante a janela crítica inicial do hemisfério direito apresentaram uma super-representação das frequências no córtex auditivo direito.
A pesquisa revelou que as janelas críticas de desenvolvimento variam de acordo com o sexo. Em camundongos fêmeas, a janela crítica do hemisfério direito se abre mais cedo, enquanto a do hemisfério esquerdo aparece apenas alguns dias depois. Já nos camundongos machos, a janela crítica do hemisfério direito é altamente sensível, mas nenhuma janela foi detectada no hemisfério esquerdo. Esses achados sugerem que o sexo pode desempenhar um papel importante na plasticidade cerebral.
Os resultados também oferecem uma nova perspectiva sobre como os diferentes hemisférios do cérebro processam o som e por que isso pode variar de pessoa para pessoa. Além disso, fornecem evidências de que áreas paralelas do cérebro não são intercambiáveis: o mesmo som pode ser codificado de maneiras radicalmente diferentes, dependendo do momento em que ocorre e de qual hemisfério está preparado para recebê-lo.

Alterações no equilíbrio entre os hemisférios em condições neuropsiquiátricas
A divisão de tarefas entre os hemisférios cerebrais pode ser prejudicada em condições neuropsiquiátricas, como o autismo e a esquizofrenia.
No caso da esquizofrenia, as alucinações auditivas são um forte indicativo de falhas na codificação da informação linguística.
Em pessoas dentro do espectro do transtorno autista, é possível observar uma mudança no processamento da linguagem: o hemisfério direito passa a assumir funções que normalmente seriam do hemisfério esquerdo. Isso pode prejudicar o desenvolvimento da linguagem. Outro ponto observado é que o hemisfério direito parece responder aos sons mais cedo do que o esquerdo.
A pesquisa sugere que esse domínio precoce do hemisfério direito na codificação de sons pode ampliar seu controle sobre o processamento auditivo, aprofundando o desequilíbrio entre os hemisférios.
Essas descobertas ajudam a entender melhor como as áreas do cérebro relacionadas à linguagem se desenvolvem. Também podem contribuir para o desenvolvimento de tratamentos mais precoces e direcionados, especialmente para apoiar a fala inicial em crianças com distúrbios do neurodesenvolvimento da linguagem.
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