
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, determinou, ontem, que Jair Bolsonaro utilize tornozeleira eletrônica para evitar que fuja do país, ante à possibilidade de prisão por chefiar a trama para dar um golpe de Estado no país. Para o magistrado, junto com o filho Eduardo, deputado federal licenciado e que está nos Estados Unidos, ambos têm agido junto ao governo de Donald Trump para coagir o STF a paralisar a ação criminal em que o ex-presidente é réu. A fuga do Brasil se daria por conta da eventualidade de ser condenado.
Daí porque a ordem de Moraes — que atende a pedido da Polícia Federal (PF), endossado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) — prevê que, além do uso de tornozeleira eletrônica, Bolsonaro está proibido de aproximar-se de embaixadas e consulados de países estrangeiros, além de não poder manter contatos com representantes diplomáticos ou qualquer autoridade estrangeira. Ele também não poderá encontrar-se com os demais réus do inquérito por golpe de Estado. Mais: o ex-presidente está impedido de falar, por qualquer meio, com o filho 03 e de utilizar redes sociais, diretamente ou via terceiros.
“A autoridade policial verificou o alinhamento das condutas delitivas entre Jair Messias Bolsonaro e Eduardo Nantes Bolsonaro, pois estão: “buscando criar entraves econômicos nas relações comerciais entre os Estados Unidos da América e o Brasil, a fim de obstar o regular prosseguimento da Ação Penal nº 2.668, em trâmite nesta Suprema Corte, que visa apurar a tentativa de golpe de Estado após as eleições presidenciais de 2022” (fls. 28, da Representação Policial)”, diz a decisão de Moraes, em certo trecho.
Ao justificar a imposição de medidas cautelares a Bolsonaro, Moraes afirmou que o ex-presidente “confessou” o crime de extorsão contra Justiça brasileira ao associar fim do tarifaço imposto por Trump à anistia dos golpistas do 8 de janeiro de 2023 e também àqueles que estão respondendo à ação que corre no STF. Para o ministro, o ex-presidente pode ter cometido os crimes de coação no curso do processo, obstrução de investigação que envolve organização criminosa e atentado à soberania nacional.
“A conduta do réu Jair Messias Bolsonaro é tão grave e despudorada que na data de hoje (17/7/2025), em entrevista coletiva, sem qualquer respeito à soberania nacional do povo brasileiro, à Constituição Federal e à independência do Poder Judiciário, expressamente, confessou sua consciente e voluntária atuação criminosa na extorsão que se pretende contra a Justiça brasileira, condicionando o fim da “taxação/sanção” à sua própria anistia”, salientou Moraes.
Atentado à soberania
De acordo com o ministro, Bolsonaro estimulou a atuação do governo norte-americano contra autoridades brasileiras, como parte de uma estratégia para pressionar o STF a obstruir o inquérito do golpe. O ministro disse que o ex-presidente e o filho cometem “atentados à soberania nacional” para interferir em processos judiciais, desestabilizar a economia e pressionar o Poder Judiciário, em especial o STF, tal como no trecho a seguir:
“A implementação do aumento de tarifas tem como finalidade a criação de uma grave crise econômica no Brasil, para gerar uma pressão política e social no Poder Judiciário e impactar as relações diplomáticas entre o Brasil os Estados Unidos da América, bem como na interferência no andamento da AP 2.668/DF — que se encontra em fase de alegações finais. As condutas de Eduardo Nantes Bolsonaro e Jair Messias Bolsonaro caracterizam claros e expressos atos executórios e flagrantes confissões da prática dos atos criminosos”, anotou Moraes.
Para a PF, há indícios de que Bolsonaro estava planejando uma fuga para após a possível condenação, pelo STF, por tentativa de golpe de Estado. Daí porque a determinação de que o ex-presidente seja monitorado com uma tornozeleira e este impedido de manter contato com autoridades e representantes diplomáticos de outras nações, da mesma forma que está proibido de se aproximar de embaixadas e consulados. Em entrevista à CNN Brasil, na noite de ontem, Eduardo Bolsonaro negou que o governo Trump tenha feito qualquer oferecimento de asilo político ao seu pai ou que esteja havendo alguma intermediação entre o clã Bolsonaro e a Casa Branca para a concessão de amparo diplomático.
Segundo a PF, a suspeita de fuga de Bolsonaro em eventual condenação por golpe de Estado se justificaria por duas razões: 1) o próprio Bolsonaro anunciou que, na próxima semana, almoçaria com embaixadores, sem, porém, especificar de que nações seriam; e 2) no carnaval do ano passado, ele permaneceu dois dias na Embaixada da Hungria — país governado pelo governo de extrema-direita de Victor Órban — depois de ter o passaporte apreendido pela PF.
A decisão de Moraes pouco mais de 48 horas depois de a PGR ter pedido ao STF, nas alegações finais, a condenação de Bolsonaro ao STF por considerá-lo chefe da organização que buscou a ruptura do Estado Democrático de Direito depois da eleição presidencial de 2022. Para o procurador-geral Paulo Gonet, o ex-presidente está à frente do chamado Núcleo Central do golpe. Pelos crimes em que foi enquadrado — organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado; dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado —, Bolsonaro pode pegar mais de 40 anos de prisão. A Primeira Turma formou maioria respaldando a decisão de Moraes, em sessão que vai até as 23h59 de segunda-feira.
Amparo no CPP
Com a imposição das medidas cautelares a Bolsonaro, os aliados do ex-presidente acusaram Moraes de abuso de poder, perseguição política e afirmaram que o investigado já estaria “condenado à prisão”. No entanto, especialistas ouvidos pelo Correio explicam que as providências tomadas pela Corte estão previstas do Código de Processo Penal (CPP) e são aplicadas quando é colocada em risco a tramitação de uma ação. O ex-presidente terá de usar tornozeleira eletrônica; está proibido de comunicar-se com o filho, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro, que está nos Estados Unidos; foi impedido de acessar as redes sociais; e não pode manter contato com representantes de outros países e de se aproximar das embaixadas e consulados.
A criminalista Beatriz Alaia Colin explica que a incomunicabilidade com determinadas pessoas tem previsão legal e pode ser decretada a qualquer investigado, dadas as circunstâncias relacionadas aos fatos sob apuração. “O fato de a incomunicabilidade envolver diplomatas decorre das condições específicas do caso pelo qual Bolsonaro está sendo investigado: a tentativa de obstrução de Justiça junto às autoridades estrangeiras”, observa.
O ex-presidente deverá cumprir as ordens de Moraes por tempo indeterminado. “Com as medidas cautelares, ele fica impedido de deixar a comarca sem autorização judicial, de comparecer a determinados locais e a se comunicar com pessoas específicas. Em eventual prisão preventiva convertida em domiciliar, ficaria impedido de transitar para qualquer local e de se comunicar com qualquer pessoa, exceto as autorizadas pelo magistrado”, ressalta o advogado Wilton Gomes.
Para a criminalista Ana Beatriz Krasovic, a restrição do ex-presidente de manter contato com embaixadores é uma novidade. “Sua aplicação ao ex-presidente é temerária nesse momento inicial. É drástica e abusiva, não prevista em nossa legislação, bem como jamais aplicada em casos que envolvam ex-presidentes”, argumenta.
*Fonte: Correio Braziliense
Fonte: https://oimparcial.com.br/justica/2025/07/moraes-impoe-tornozeleira-e-restricoes-a-bolsonaro-por-risco-de-fuga-e-coercao/