
Um levantamento realizado pelo jornal Folha de S.Paulo na Justiça do Trabalho revelou que dezenas de empresas brasileiras foram condenadas por praticar assédio eleitoral em apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a campanha presidencial de 2022. As decisões judiciais mostram um padrão de intimidação e pressão sobre trabalhadores, em práticas que remetem ao antigo voto de cabresto da República Velha.
A reportagem identificou 30 sentenças, em primeira e segunda instância, que reconheceram a responsabilidade de companhias por tentar influenciar a escolha de seus funcionários por meio de coação, ameaças ou promessas de benefícios.
Exemplos de assédio comprovados na Justiça
Em Minas Gerais, a Agronelli Ltda. foi condenada por fixar adesivos de Bolsonaro em mesas e computadores, além de promover palestras em defesa do então presidente. Em um desses eventos, um diretor afirmou que, caso o PT vencesse, a empresa seria prejudicada e empregos estariam em risco.
No Paraná, a Transben Transportes enviou vídeos aos colaboradores pedindo votos para Bolsonaro. Em uma das gravações, um representante dizia: “Se o Lula ganhar vai ter desemprego. A nossa empresa vai sofrer bastante”. A empresa também ofereceu ajuda de custo para motoristas viajarem a fim de votar no candidato.
No Espírito Santo, a Febracis foi condenada a indenizar uma funcionária em R$ 10 mil após gestores afirmarem que a eleição era uma “guerra espiritual”, apresentando Bolsonaro como “enviado de Deus” e Lula como o “Diabo”.
Outro caso ocorreu em Minas Gerais, no Frigorífico Serradão, onde trabalhadores receberam camisetas com slogans bolsonaristas e a promessa de um pernil para quem comprovasse o voto. Para a Justiça, vídeos anexados aos autos demonstraram “apoio explícito a um candidato imposto pela empresa”.
Demissões e perseguições
Alguns trabalhadores relataram perseguição direta. Um motorista da Sada Bioenergia e Agricultura afirmou ter sido demitido aos 64 anos, após 12 anos na empresa, por se recusar a usar um adesivo de Bolsonaro. Na Radiodoc, em São Paulo, funcionários foram avisados de que “sofreriam as consequências” se não votassem no ex-presidente. A empresa ainda prometeu folga para quem participasse de atos de campanha.
Impacto nacional
Segundo dados do Ministério Público do Trabalho (MPT), em 2022 foram registradas 3.145 denúncias de assédio eleitoral em todo o país. Para lidar com os casos, o órgão firmou 560 termos de ajuste de conduta e ajuizou 105 ações civis públicas.
Em uma dessas ações, a SLC Agrícola, no Piauí, foi condenada a pagar R$ 100 mil em danos morais coletivos. A empresa teria deslocado 34 funcionários para uma fazenda distante no dia do segundo turno, sem fornecer transporte, dificultando que pudessem votar.
No Mato Grosso, a Fomentas foi condenada a indenização de R$ 50 mil após serem exibidas imagens de funcionários segurando uma faixa em apoio a Bolsonaro e participando de reuniões onde eram exibidos vídeos contra Lula.
Risco à democracia
Para especialistas, o assédio eleitoral representa uma ameaça direta à democracia. Eneida Desiree Salgado, professora de direito constitucional e eleitoral da Universidade Federal do Paraná, afirmou: “Assim como o voto de cabresto no contexto do coronelismo da Primeira República, o que está em jogo não é apenas a liberdade de um voto. Com a existência do assédio eleitoral, toda a lisura do sistema é posta em risco”.
Pesquisas reforçam a gravidade do fenômeno. De acordo com o Datafolha, 4% dos eleitores brasileiros declararam ter sofrido algum tipo de assédio eleitoral durante a campanha de 2022, o que expõe a dimensão do problema e a necessidade de mecanismos de proteção mais eficazes para garantir a livre expressão do voto.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/empresas-sao-condenadas-por-assedio-eleitoral-a-trabalhadores-em-favor-de-bolsonaro/