
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que representa as maiores instituições financeiras do país, enviou um ofício ao Banco Central solicitando alterações nas regras do débito automático. A entidade defende a criação de um novo mecanismo que permita a confirmação, por parte dos clientes, antes de qualquer cobrança em conta.
Desde 2021, uma resolução do Banco Central autoriza que bancos realizem débitos automáticos sem autorização direta dos clientes, desde que o pedido venha de outra instituição financeira credenciada pelo órgão regulador. A norma abriu espaço para que seguradoras e clubes de benefícios utilizassem pequenas financeiras para enviar cobranças diretamente às contas dos consumidores.
O resultado foi uma explosão de ações judiciais. Levantamento feito pelo site Escavador, a pedido do portal UOL, mostra que os processos contra três desses grupos saltaram de 1.400 em 2020 para 32 mil em 2024.
Segundo a Febraban, os bancos ficam expostos à insatisfação dos clientes e ao aumento de litígios sem poder verificar a origem das cobranças. “As instituições financeiras detentoras das contas debitadas enfrentam dificuldades, pois estão inibidas de realizar a confirmação”, afirmou a entidade.
O documento ainda ressalta que os bancos são responsabilizados pelas falhas: “Ao mesmo tempo, (as instituições financeiras estão) expostas à responsabilização perante o cliente que não reconhece o débito, gerando impacto direto em seus índices de reclamação e, também, perante o Poder Judiciário, onde, no limite, as instituições financeiras ficam expostas à litigância abusiva”.
Por isso, a federação pede que seja restabelecida a possibilidade de confirmação junto ao banco da autorização de débito automático, especialmente quando o valor é destinado a terceiros.
Resposta do Banco Central
Procurado pela reportagem, o Banco Central disse que os bancos “não estão proibidos de adotar controles que assegurem a integridade dos processos sob sua responsabilidade nos termos da resolução”. O órgão não respondeu, porém, se vai atender ao pedido da Febraban, mas afirmou que realiza “acompanhamento sistemático da aplicação e da efetividade de suas normas” e já vinha estudando possíveis aprimoramentos regulatórios.
O ofício foi enviado em 28 de julho, dias após reportagens e podcasts revelarem que aposentados e pensionistas estavam sendo vítimas de cobranças indevidas por débito automático.
Fraudes e más práticas
A Febraban destacou que tem identificado “irregularidades e práticas reiteradas por parte de terceiros”, citando como exemplo Sociedades de Crédito Direto (SCDs), seguradoras e prestadoras de serviços.
“As instituições financeiras têm reportado referidas condutas às autoridades competentes de repressão, bem como adotado procedimentos para mitigar exposição em seus índices de reclamação e impactos na sua imagem e custos de ressarcimento aos clientes”, relatou a entidade. No entanto, reconheceu que “tais medidas têm-se apresentado insuficientes”.
Por isso, reforçou a urgência do combate às más práticas: “Tornou-se mais do que necessário e urgente o combate às más práticas, de modo a apurar responsabilidades de irregularidades já praticadas por instituições financeiras destinatárias dos débitos interbancários”.
Medidas internas dos bancos
Paralelamente, a federação enviou em 24 de julho um e-mail aos bancos associados para discutir mecanismos de autorregulação. Uma primeira reunião ocorreu em 12 de agosto. Entre as medidas em estudo estão notificações prévias via SMS ou aplicativos antes da cobrança.
Instituições como Bradesco e Itaú afirmam já enviar notificações aos clientes, mas isso não tem sido suficiente para conter a onda de processos. As principais vítimas são aposentados e pensionistas do INSS, a maioria idosos com baixa instrução e dificuldades de acesso às plataformas digitais. Especialistas apontam que cadastros de contato desatualizados podem estar contribuindo para o problema.
Cobranças irregulares
A reportagem questionou a Febraban sobre casos de descumprimento das regras do Banco Central, em que bancos privados realizaram débitos automáticos sem autorização dos clientes. As denúncias envolvem os clubes de benefício Sebraseg e Binclub e a financeira Paulista Serviços de Recebimentos e Pagamentos, que não é autorizada a funcionar pelo BC.
Em resposta, a Febraban afirmou que “entende que todo débito automático tem que ser autorizado pelo cliente junto a uma instituição financeira, seja ela autorizada pelo Banco Central ou não”.
Em nota, o Banco Central reforçou que não é possível que uma autorização seja formalizada para uma instituição não autorizada a operar, sem a aplicação de procedimentos de verificação de identidade.
Bradesco, Itaú e Santander realizaram débitos em favor da Paulista Serviços. O Itaú informou que revisou os procedimentos e passou a exigir autorização expressa. O Santander adotou a mesma prática. O Bradesco, por sua vez, alegou sigilo comercial e não comentou.
Nos casos envolvendo clubes de benefício, as cobranças sem autorização recaíram apenas sobre o Bradesco. A Febraban não se manifestou especificamente sobre esses episódios.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/pressionada-por-acoes-na-justica-febraban-culpa-regras-do-bc-por-falhas-no-debito-automatico-em-bancos-privados/