28 de agosto de 2025
PEC que blinda parlamentares é vista pela PGR como retrocesso
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A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) em discussão no Congresso, que visa blindar os parlamentares de ações na Justiça, gerou uma forte reação dentro da Procuradoria-Geral da República (PGR). Para três procuradores ouvidos de forma reservada pelo blog de Malu Gaspar, no jornal O Globo, o texto em debate representa um retrocesso, viola a Constituição e pode criar uma espécie de salvo-conduto para que deputados e senadores continuem a cometer crimes sem serem responsabilizados.

A PEC propõe que os parlamentares não possam ser afastados do cargo por decisão do Poder Judiciário, salvo em casos de prisão em flagrante por crime inafiançável. Nesse caso, o parlamentar ficaria sob a custódia da Câmara ou do Senado até que o plenário da Casa decida sobre a manutenção da prisão. A proposta também determina que medidas cautelares que afetem diretamente a atividade parlamentar, como a prisão domiciliar, só possam ser executadas se confirmadas pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF).

“Salvo-conduto para cometer mais crimes”

A avaliação dentro da PGR é de que a PEC favorece a impunidade e cria um ambiente em que parlamentares possam se sentir à vontade para cometer infrações sem as consequências legais adequadas. “Um Congresso que se preocupa em não ser preso diz muito de si. É a busca de um salvo-conduto para cometer mais crimes”, declarou um dos procuradores ouvidos, destacando o risco de um enfraquecimento das instituições democráticas.

Outro subprocurador foi ainda mais contundente, afirmando que a PEC “claramente traduz um desejo coletivo de impunidade” em um contexto político e social marcado por desrespeito às leis e pela crescente divulgação de esquemas criminosos envolvendo parlamentares. Para ele, se aprovada, a PEC “normalizará um cenário que colide com a República, o Estado de Direito e também a própria democracia”.

Ameaça do crime organizado

Além de prejudicar o funcionamento das instituições, a PEC também é vista como uma porta aberta para a infiltração do crime organizado no meio político. De acordo com outro procurador, a proposta poderia incentivar grupos criminosos a eleger seus representantes para garantir imunidade parlamentar e evitar investigações. “É péssimo porque o crime organizado vai querer eleger seus homens para lhes garantir imunidade”, comentou.

O receio se baseia em casos anteriores, como os de grupos criminosos que atuaram nas eleições municipais de 2024. Na ocasião, o Tribunal Regional Eleitoral do Rio teve de mudar 53 locais de votação em dez municípios para afastar o risco de coação de eleitores por esses grupos, que tentaram manipular o voto em favor de candidatos aliados.

Imunidade ou impunidade?

Um dos pontos mais controversos da PEC é o artigo que busca garantir que os parlamentares não possam ser responsabilizados civil nem penalmente por suas “opiniões, palavras e votos”, deixando a responsabilização restrita à esfera ético-disciplinar. Essa proposta visa reforçar uma prerrogativa prevista na Constituição, mas o STF tem adotado uma interpretação mais restritiva sobre o alcance da imunidade parlamentar.

O ex-presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, foi processado e se tornou réu em 2016 por declarações em que atacou a deputada Maria do Rosário, afirmando que jamais a estupraria. O STF entendeu que essa fala não estava protegida pela imunidade parlamentar, pois não tinha relação direta com o exercício do mandato.

Para os procuradores, a PEC está em desacordo com a jurisprudência atual e transforma a imunidade parlamentar em uma verdadeira impunidade. “A PEC contém partes que tornam mais claras as garantias do mandato, mas também traz disposições que restringem atos próprios do Judiciário e podem converter imunidade em impunidade”, criticou um dos procuradores da PGR. Ele ainda destacou o “risco de retrocesso”, afirmando que a proposta ameaça o próprio Estado de Direito.

Apesar da ampla rejeição dentro da PGR, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) ainda não se manifestaram oficialmente sobre a PEC até o fechamento da reportagem.

Fonte: https://agendadopoder.com.br/pec-que-blinda-parlamentares-e-vista-pela-pgr-como-retrocesso-e-ameaca-a-democracia/