Esta é uma semana emblemática para a comunidade negra no Brasil. Celebrar, ou não, os 136 anos da assinatura da Lei Áurea, que pôs fim oficialmente à escravização do povo negro em terras brasileiras?
O debate ainda divide opiniões. Desde que atuo como pesquisador, jornalista, ativista e escritor, com foco na questão racial, tenho dúvidas sobre celebrar ou não a tal data.
Em palestras como as que realizo principalmente neste período, como ocorreu nesta semana, para um público de mais de 300 estudantes na Universidade de Barra Mansa, no sul fluminense, sempre lembro que é impossível renegar a luta abolicionista no Brasil e seus personagens como Luís Gama, José do Patrocínio, os irmãos Rebouças e a luta dos quilombolas que se recusaram a viver em um país como escravizados por séculos.
Essas revoltas todas resultaram na assinatura da Lei Áurea, e isso não pode ser apagado, renegado ou esquecido.
Porém, a assinatura de uma lei sem nenhum ressarcimento, sem nenhum pagamento ou indenização – ou pior, despejando das terras os antigos escravizados, que, por séculos, haviam construído tudo que chamávamos de ciclos econômicos como ouro, cana de açúcar e café, sem nenhum direito – foi uma das maiores catástrofes humanas que o último país a abolir a escravidão no mundo poderia fazer com quem empregou o seu trabalho e sangue na construção desta nação.
A perversidade da “elite” política, militar e econômica da época não parou por ali… descontentes com a assinatura daquela lei, meses depois, deram um golpe militar e fundaram uma república na qual intensificaram o seu projeto de embranquecimento do país, ao importar e financiar a vinda de colonos europeus para substituir a mão de obra escravizada, jogando os negros para os morros, favelas e periferias, lugares em que os seus descendentes se encontram até os dias de hoje.
Isso tudo tornou o Brasil um dos países mais desiguais do mundo, um lugar onde a desigualdade tem cor e origem, e é preta e descendente de escravizados.
Acredito e muito na força do 13 de Maio, mas como chave para resolver de vez as demandas que não foram resolvidas lá em 1888, e também outros temas como educação, terra, financiamento e reintegração na economia. Em resumo, REPARAÇÃO pelos 380 anos de escravização negra. Até hoje, ninguém – nem Estado, nem sociedade – se apresentou para tratar do tema com seriedade.
Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/mauricio-pestana-136-anos-comemorar-o-que/