
A fumaça das queimadas, já considerada grave problema de saúde em diversas regiões do mundo, pode se tornar ainda mais letal nas próximas décadas. Dois estudos publicados nesta quarta-feira (17) na Nature indicam que o avanço do aquecimento global tende a intensificar a frequência e a severidade dos incêndios florestais, aumentando significativamente as mortes relacionadas à inalação da fumaça.
Nos Estados Unidos, a estimativa é de que, até 2050, o país registre cerca de 70 mil mortes adicionais por ano causadas pela poluição resultante das queimadas, caso as emissões de gases de efeito estufa permaneçam elevadas. Globalmente, o número pode alcançar 1,4 milhão de mortes prematuras anuais até o fim do século.
Fumaça de queimadas: como a pesquisa chegou a este resultado
- Para chegar a essas projeções, cientistas usaram modelos estatísticos e de aprendizado de máquina com base em dados de emissões de fogo entre 2001 e 2021;
- As informações foram cruzadas com registros de mortalidade nos EUA entre 2006 e 2019. Dessa forma, os pesquisadores calcularam como a exposição ao material particulado fino (PM2.5) pode impactar a mortalidade futura;
- No cenário de maior aquecimento, os incêndios poderão causar 71 mil mortes extras anuais em meados do século, com a Califórnia liderando a lista de estados dos EUA mais afetados, seguida por Nova York, Washington, Texas e Pensilvânia;
- O custo econômico dessas mortes pode ultrapassar US$ 600 bilhões (R$ 3,18 trilhões, na conversão direta) por ano em 2050.
“Nossa pesquisa sugere que os impactos da fumaça das queimadas provocadas pelas mudanças climáticas podem estar entre as consequências mais importantes e custosas do aquecimento no país”, afirmaram os autores do estudo liderado por Minghao Qiu e Marshall Burke, da Universidade de Stanford e de Stony Brook (EUA).
E em escala global?
Outro estudo, coordenado por Bo Zheng e Qiang Zhang, da Universidade Tsinghua (China), analisou os impactos em escala global. Utilizando inteligência artificial (IA), os cientistas projetaram as áreas queimadas e as emissões até 2100, simulando a circulação da fumaça e seus efeitos sobre a saúde. As projeções indicam que as mortes prematuras podem crescer seis vezes, atingindo 1,4 milhão de pessoas por ano em cenário intermediário de emissões.
A África aparece como a região mais vulnerável, com aumento de até 11 vezes nas mortes relacionadas ao fogo. Nos EUA e na Europa, o crescimento estimado varia de uma a duas vezes, ainda assim em níveis preocupantes. Os estudos não apresentaram projeções específicas para o Brasil.

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Poluentes na fumaça e riscos à saúde
A fumaça das queimadas é composta por uma mistura tóxica de poluentes que inclui material particulado (PM2.5), monóxido de carbono (CO), compostos orgânicos voláteis (COVs), óxidos de nitrogênio (NOx), ozônio e metais pesados. Entre eles, o PM2.5 é considerado um dos mais perigosos por penetrar profundamente nos pulmões.
De acordo com o pneumologista Frederico Fernandes, presidente da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia (SPPT), o contato com esse tipo de partícula provoca inflamação generalizada, podendo desencadear arritmias, infartos, derrames e agravar doenças respiratórias crônicas como asma e bronquite.
“A exposição prolongada ao PM2.5 também pode agravar doenças respiratórias crônicas, como asma e bronquite, e está associada a um maior risco de câncer e outras condições crônicas, como diabetes”, disse o especialista ao g1, que não participou do estudo.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a concentração anual média de PM2.5 não ultrapasse 5 microgramas/m³, patamar que é frequentemente superado em episódios de fumaça intensa no Brasil.
Outro poluente preocupante é o monóxido de carbono, gás inodoro e tóxico que, ao se ligar à hemoglobina, impede o transporte de oxigênio no sangue. “Esses elementos desencadeiam uma cascata inflamatória diretamente nas paredes dos brônquios e na vasculatura humana e de outros animais. Os efeitos são graves e podem causar tanto intoxicações agudas quanto exacerbações de doenças crônicas”, afirmou a pneumologista Margareth Dalcomo ao g1.
A exposição prolongada ao CO pode causar desde sintomas leves, como dor de cabeça e náusea, até problemas de memória e complicações cardíacas. Crianças, grávidas e pessoas com doenças respiratórias são especialmente vulneráveis.

Os compostos orgânicos voláteis (COVs), também presentes na fumaça, elevam o risco de câncer e comprometem órgãos, como rins, fígado e sistema nervoso. Fernandes destacou que “o principal problema da exposição crônica aos Compostos Orgânicos Voláteis é o aumento do risco de câncer e o desenvolvimento de doenças pulmonares graves, como a pneumonia de hipersensibilidade”.
Já os óxidos de nitrogênio e o ozônio estão associados a crises de asma, tosse e falta de ar, especialmente em crianças, além de aumentarem o risco de infecções, como pneumonia.
Metais pesados, como chumbo e mercúrio, também são liberados durante as queimadas e podem afetar órgãos vitais, além de terem potencial cancerígeno. “A exposição crônica a esses metais pode ser cancerígena e também causa inflamação sistêmica. Além disso, aumenta o risco de doenças cardiovasculares e respiratórias crônicas”, alertou Fernandes.
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