As mulheres que trabalham no setor privado brasileiro continuam recebendo significativamente menos do que os homens. Segundo o novo Relatório de Transparência Salarial e Critérios Remuneratórios, divulgado nesta segunda-feira (3) pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e reportado pelo g1, a diferença média de remuneração entre os gêneros chegou a 21,2%.
O levantamento, baseado em dados do Relatório Anual de Informações Sociais (RAIS), analisou cerca de 54 mil empresas com cem ou mais empregados, considerando o período entre o segundo semestre de 2024 e o primeiro de 2025. A disparidade salarial aumentou pelo quarto semestre consecutivo: era de 19,4% em março de 2024, passou para 20,7% em setembro e alcançou 21,2% neste último relatório.
A desigualdade persiste mesmo com a maior escolaridade das mulheres. De acordo com o MTE, elas representam 41,1% dos vínculos formais, mas recebem, em média, R$ 3.908,76, contra R$ 4.958,43 dos homens.
Crescimento da participação feminina não se reflete na renda
Apesar do aumento da presença feminina no mercado de trabalho, o avanço ainda não se traduz em ganhos equivalentes. O número de mulheres empregadas em grandes empresas subiu de 7,2 milhões em 2023 para 8 milhões em 2025. No entanto, a massa de rendimentos das trabalhadoras corresponde a apenas 35% do total pago pelas companhias.
Se essa participação acompanhasse o crescimento da presença feminina, cerca de R$ 92,7 bilhões poderiam ser injetados na economia, segundo o relatório.
Os dados da Pnad Contínua, do IBGE, mostram uma tendência semelhante. Entre 2016 e 2025, o número de mulheres ocupadas passou de 37,9 milhões para 44,6 milhões, um aumento de 6,7 milhões. No mesmo período, o número de homens empregados cresceu em 5,8 milhões.
Desigualdade ainda mais grave entre mulheres negras
A diferença salarial se agrava quando recortada por raça. Mulheres negras recebem, em média, R$ 2.986,50 — menos da metade do que ganham homens não negros, cuja remuneração média é de R$ 6.391,94. A diferença chega a 53,3% no rendimento médio e a 33,5% no salário de admissão.
Para a ministra das Mulheres, Márcia Lopes, o cenário evidencia a urgência de políticas voltadas à igualdade racial e de gênero. “A inserção das mulheres no mercado não basta. É inaceitável que mulheres negras recebam metade do rendimento de homens não negros. Temos como compromisso intensificar medidas que resolvam essas distorções, promovam políticas de apoio, como a ampliação da licença-paternidade e o auxílio-creche”, afirmou.
Mesmo com o aumento de 21,1% no número de empresas com pelo menos 10% de mulheres negras — que passou de 29 mil para 35 mil desde 2023 —, o abismo salarial ainda é profundo.
Estados do Sul e Sudeste concentram as maiores diferenças
Os estados com maior desigualdade de gênero são Paraná (28,5%), Rio de Janeiro (28,5%), Santa Catarina (27,9%), Mato Grosso (27,9%) e Espírito Santo (26,9%). Já os menores índices estão no Piauí (7,2%), Amapá (8,9%), Acre (9,1%), Distrito Federal (9,3%), Ceará (9,9%) e Pernambuco (10,4%).
Empresas apontam tempo de experiência como principal justificativa
O relatório do MTE revela que as principais justificativas das empresas para as diferenças salariais são o tempo de experiência (78,7%), o cumprimento de metas de produção (64,9%) e a existência de planos de cargos e salários (56,4%).
Ainda assim, menos da metade das companhias adota políticas de equidade. Apenas 38,9% afirmam promover mulheres internamente e 21,9% oferecem auxílio-creche. A licença parental estendida é realidade em 20,9% das empresas, enquanto 44% permitem flexibilidade de jornada.
O relatório também destaca que:
- 29,6% das empresas têm políticas de incentivo à contratação de mulheres;
- 23,1% estimulam a contratação de mulheres negras;
- 19,7% contratam mulheres com deficiência;
- 18,8% priorizam pessoas LGBTQIA+;
- 18,9% promovem oportunidades para mulheres chefes de família;
- 7,8% contratam mulheres indígenas;
- 7,3% incentivam a contratação de mulheres vítimas de violência.
Para Paula Montagner, subsecretária de Estatísticas e Estudos do Trabalho, as empresas precisam agir de forma mais efetiva. “As empresas precisam avançar na construção de planos de ação que promovam a igualdade salarial entre homens e mulheres dentro de suas empresas. Precisamos acelerar esse processo”, afirmou.
Impacto econômico e fiscalização
Estudos internacionais mostram que a equidade salarial poderia gerar impacto positivo significativo na economia. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Brasil poderia ampliar seu PIB em R$ 382 bilhões com políticas de igualdade de gênero. O Banco Mundial estima que o PIB global cresceria mais de 20% se mulheres tivessem as mesmas oportunidades que os homens.
Em julho de 2023, o presidente Lula da Silva sancinou a lei de igualdade salarial para homens e mulheres. De acordo com a nova legislação, homens e mulheres que exercem a mesma função deverão receber, obrigatoriamente, o mesmo salário — mas medida nem sempre é cumprida pelas empresas.
O Ministério do Trabalho intensificou a fiscalização sobre o cumprimento das normas de transparência. Em 2025, foram realizadas 787 ações, abrangendo cerca de 1 milhão de trabalhadores. Destas, 319 já foram concluídas e resultaram em 154 autos de infração.
Do total de 54.041 empresas avaliadas, 38.233 (71%) baixaram o relatório de igualdade salarial e cerca de 31 mil informaram o site onde o documento pode ser consultado.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/desigualdade-salarial-mulheres-ganham-21-menos-que-homens-no-setor-privado-diz-mte/
