O Dia Internacional para a Abolição da Escravatura, celebrado em 2 de dezembro, foi instituído pela ONU em 1949 como um marco global de combate a todas as formas contemporâneas de exploração humana. A data não se limita a lembrar o fim oficial do sistema escravocrata no século XIX; ela chama atenção para práticas que persistem no mundo atual, como trabalho forçado, tráfico de pessoas, exploração infantil, servidão por dívidas e formas modernas de submissão laboral.
No Brasil, apesar dos avanços legais e institucionais, a escravidão contemporânea ainda é uma realidade. O país é internacionalmente reconhecido por sua política de fiscalização e pelos resgates realizados por grupos móveis do Ministério do Trabalho, mas também enfrenta desafios estruturais que permitem a continuidade dessas violações. É nesse contexto que o Maranhão ocupa uma posição central no debate.
Historicamente marcado por desigualdades socioeconômicas, o Maranhão figura entre os estados brasileiros com maior número de trabalhadores aliciados para condições análogas à escravidão em outros estados, especialmente em atividades como pecuária, carvoarias e agricultura extensiva. Muitos maranhenses, buscando oportunidades, acabam caindo em redes de aliciamento que se aproveitam da vulnerabilidade social, da baixa oferta de empregos formais e da falta de políticas públicas eficazes em algumas regiões. Além disso, o estado também registra casos internos de trabalho escravo, especialmente em zonas rurais e em setores como a produção de carvão vegetal, agricultura familiar precarizada e, em menor escala, exploração urbana.
Nos últimos anos, operações de fiscalização vêm revelando situações de servidão por dívidas, jornadas exaustivas, alojamentos indignos e restrição de liberdade — práticas que lembram, de forma dolorosa, os mecanismos da escravidão histórica.
Entre 2003 e 2023, aproximadamente 9.580 trabalhadores resgatados no Brasil eram maranhenses, o que corresponde a cerca de 21% do total nacional, evidenciando o peso da vulnerabilidade social do estado nesse cenário. A maior parte dessas vítimas é composta por homens adultos, geralmente com baixa escolaridade e oriundos de comunidades rurais pobres. Os dados revelam também um perfil racial marcado: de 2014 a 2023, 67% dos resgatados maranhenses se declararam pardos, 20% pretos e 12% brancos, refletindo a permanência de desigualdades estruturais.
As atividades nas quais os trabalhadores maranhenses mais aparecem em situação de exploração têm variado ao longo dos anos. Tradicionalmente associadas à pecuária e às carvoarias, as situações de trabalho escravo envolvendo pessoas do estado passaram, na última década, a se concentrar também na produção de cana-de-açúcar, na construção civil e em atividades agrícolas sazonais.
No próprio Maranhão, os casos também persistem. Em 2024, foram registrados 82 trabalhadores resgatados dentro do território estadual, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra. O governo estadual monitorou, no mesmo ano, sete operações envolvendo vítimas maranhenses, totalizando 47 pessoas encaminhadas à assistência social. Esses números revelam que, apesar de avanços institucionais, a exploração continua acontecendo, tanto por agentes locais quanto por redes interestaduais de aliciamento.

Dados
Entre os dias 13 e 27 de agosto deste ano, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por meio do Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM), resgatou, nos municípios de Magalhães de Almeida e Barreirinhas, 80 trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão em atividades de extração da palha de carnaúba e de pesca artesanal em alto-mar.
E no dia 27 de outubro 16 trabalhadores dos estados do Piauí e Maranhão que viviam em condições semelhantes à escravidão no Ceará, foram resgatados em uma força-tarefa.
Dentre eles estavam trabalhadores das cidades maranhenses de Pastos Bons, Buriti Bravo, São João dos Patos e Colinas.

Ao mesmo tempo, é importante destacar que o Maranhão também se torna cenário de resistência e transformação. Organizações da sociedade civil, movimentos sociais, universidades e órgãos governamentais têm atuado ativamente na conscientização e no combate ao trabalho escravo.
Campanhas educativas, programas de reinserção socioeconômica e ações de fortalecimento da agricultura familiar e de geração de renda vêm sendo fundamentais para romper ciclos de vulnerabilidade.
Assim, o 2 de dezembro não é apenas uma data simbólica: é um convite à reflexão sobre como a escravidão se reinventa em contextos de pobreza, exclusão e concentração de renda — e como a sociedade maranhense pode continuar enfrentando esse problema.
A abolição, portanto, é um processo inacabado. No Maranhão e em todo o Brasil, ela exige vigilância constante, políticas públicas sólidas e o compromisso coletivo com a dignidade humana.
Atualmente, diversos mecanismos estão à disposição para denúncias de trabalho degradante ou análogo à escravidão. Entre eles o Disque 100 e o portal Ipê do governo federal. O endereço é ipe.sit.trabalho.gov.br.
Fonte: https://oimparcial.com.br/noticias/2025/12/abolicao-da-escravatura-a-luta-continua-no-brasil-e-no-maranhao/
