24 de novembro de 2024
O ensaio do governo Lula rumo a direita?
Compartilhe:

Me parece bastante grave a informação de que o Ministério da Fazenda junto a pasta do Planejamento, liderados por Fernando Haddad e Simone Tebet, estejam propondo desvincular os benefícios do INSS (como auxílio doença e auxílio incapacidade), BPC e seguro-desemprego ao valor do salário mínimo.

A informação foi amplamente circulada nos grupos de apoio ao Planalto e gerou fortes críticas até mesmo dentro do PT. A presidente do partido, Gleisi Hoffmann, foi uma das primeiras a se posicionar contrária a ideia. Nas redes sociais, Gleisi mandou uma indireta para Haddad.

Alguns parlamentares do partido já mandaram o recado ao Planalto de que se a proposta for apresentada a Lula haverão críticas públicas. Como sabemos, a maioria da bancada do PT é engajada na luta pela valorização de benefícios sociais.

Segundo Tebet, a medida propõe desvincular esses benefícios dos reajustes automáticos do salário mínimo, que é corrigido anualmente com base no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e na inflação. Obviamente que a declaração da ministra foi bastante festejada entre os grandes jornais e pela Faria Lima.

“Ao vincular a valorização do salário mínimo a todos os benefícios, trazemos na próxima década um custo de mais de 1,3 trilhão. Quando falamos da vinculação [do salário mínimo], estamos falando de uma série de benefícios, e aí não é 8 ou 80, desvincular todos”, declarou durante participação da Comissão Mista de Orçamento (CMO) no Senado.

Na prática, isso deixaria os valores desses auxílios abaixo do mínimo, causando impactos negativos em milhões de brasileiros e famílias que dependem desses benefícios, situação semelhante ao que aconteceu no Chile na era Pinochet.

É bom frisar que além do desgaste político, o governo Lula também enfrentaria uma onda de impopularidade (talvez irreversível), especialmente nas suas bases, com a sanção da proposta.

Vale destacar que essa ideia de Haddad e Tebet faz parte de um ‘pacotaço‘ de cortes de gastos que (pasmem!) inclui também uma revisão dos pisos de educação e saúde. Escrevo com toda tranquilidade que nem os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, ambos de direita, foram tão longe.

Com o antigo teto de gastos, Temer e Bolsonaro suspenderam a aplicação desses pisos, o que já é terrível, trabalhando apenas com recursos corrigidos pela inflação do ano anterior.

Após o fim do velho teto de gastos sancionado na era Temer, o governo Lula retomou a obrigatoriedade de investimentos mínimos em saúde e educação. Sendo assim, os pisos para as duas áreas crescem de acordo com a arrecadação federal.

Atualmente, a educação deve receber 18% da receita líquida de impostos (RLI) e a saúde, 15% da receita corrente líquida (RCL).

Mas a proposta de Haddad quer ir além, praticamente revogar os pisos para se adequar ao novo teto de gastos formulado por ele próprio em 2023, que permite um aumento real entre 0,6% e 2,5%.

Se a proposta for aceita por Lula, a medida já valerá para o Orçamento de 2025. Nesta semana, o próprio Haddad anunciou publicamente que deve apresentá-la ao presidente.

“Por ocasião da discussão do Orçamento, nós vamos levar algumas propostas para o presidente, que pode aceitar ou não, dependendo da avaliação que ele fizer”, afirmou em coletiva de imprensa.

Como disse no início do texto, me parece bastante grave essas informações. Logo no começo do seu terceiro governo, Lula garantiu publicamente que não iria mexer nos recursos de Saúde e Educação, pois “no Brasil, tudo que é para o pobre é (tratado) como gasto”, enquanto “tudo que é para o rico é investimento”.

“O Brasil sempre tratou investimento em educação como gasto. Quando você vai fazer o Orçamento, sempre vai aparecer alguém para dizer que está se gastando demais. Cortar na educação é mexer na qualidade. Quando se corta gastos na saúde, é menos médico”, declarou o presidente em 6 de dezembro de 2023 durante cerimônia de credenciamento do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa) como instituição de ensino superior, no Rio de Janeiro.

E agora, presidente? Sua opinião mudou em apenas seis meses? A sanha de um ministro em cumprir o novo teto de gastos a todo custo valerá mais que o apoio da sua base? Valerá mais do que a estabilidade do seu governo?

Ficam os questionamentos.

Fonte: https://www.ocafezinho.com/2024/06/13/o-ensaio-do-governo-lula-rumo-a-direita/