*Por Lucas Reis, Doutor em Big Data aplicado à Comunicação, Pesquisador Associado do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (INCT-DD), fundador da Zygon Adtech e da Digital IsCool, Presidente da Associação Baiana do Mercado Publicitário (ABMP) e Vice-Presidente de Operações do IAB Brasil.
Na terça-feira, 30/07, o Governo Federal apresentou o Plano Nacional de Inteligência Artificial. O material afirma ter uma visão ambiciosa e tem pontos louváveis, como o foco no bem-estar humano. Mas, a meu ver, se aproxima mais de um Manifesto de Intenções ou um Compilado Inicial de Iniciativas, do que de um Plano Estratégico.
Sun Tzu fala que um aspecto básico da Estratégia é a concentração dos recursos num ponto a fim de chegar a um fim. A identificação deste ponto de concentração vem de uma análise minuciosa e consequente, e essa é a principal falha do documento: falta um diagnóstico, um caminho e uma visão Estratégica.
O documento lista uma série de ações, tentando cobrir diversos pontos, mas não deixa claro qual é o ponto-chave. Ou seja, qual “O” papel que o Brasil buscará ocupar no mundo na era da IA, e qual “O” grande obstáculo atual que deve ser endereçado para que cheguemos lá.
Há iniciativas para desenvolvimento de grandes computadores, fomento da indústria de microchips, estímulo à construção de data centers que usem energia renovável, aplicação de recursos de IA nos serviços públicos, formação profissional desde o nível técnico ao de doutorado e mais. Pode parecer que isso torna o plano completo, mas, na verdade, é um indício do contrário: ao tentar fazer tudo, tende a não sendo efetivo em nada. Além disso, estas ações não estão encadeadas: são iniciativas estanques, sem sinergias intencionais entre si.
O Brasil não tem recursos ilimitados. Então, concorrer com o mundo inteiro em todos os pontos (das aplicações de IA na saúde à fabricação de microchips) dá ao Plano um uso retórico, mas não funcional para execução. A melhor chance de o país performar bem na era da Inteligência Artificial é definindo um foco, o que vem da visão estratégica.
Por exemplo, o Brasil pode, sim, se diferenciar como um polo global de processamento de dados alimentado por energia limpa. Isso é extremamente relevante, pois um datacenter dedicado à IA consome 20 vezes mais energia que um comum. Mas essa iniciativa representa apenas 2% do valor orçado no Plano, e não está encadeada com as outras (de desenvolvimento de startups, formação de mão de obra etc).
O maior orçamento do plano está direcionado para a ação “Soluções de IA para as Missões da Nova Indútria Brasil”, com R$ 9,1 bilhões estimados (cerca de 34% do total). O que demonstra uma visão antiga de que o desenvolvimento econômico vem do desenvolvimento industrial. 70% do PIB brasileiro é gerado pelo setor de serviços, que é onde surge a maior parte dos empregos e das empresas que se baseiam em IA. Direcionar tanto recurso para aplicações focadas na Indústria é um erro estratégico.
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O Plano apresentado tem mais o mérito de colocar algo para ser debatido, amadurecido e refinado, do que de mostrar a Estratégia Nacional para que o Brasil seja relevante globalmente na era da inteligência artificial, e que possa usar a Revolução tecnológica em curso para se tornar um país justo e desenvolvido.
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