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Cerca de mil animais foram deixados à própria sorte por um pecuarista em Parnarama no Maranhão; enquanto isso, brasileiros passam fome e autoridades se calam diante da crueldade
Na zona rural de Parnarama, no interior do Maranhão, uma cena brutal escancara a face mais sombria do agronegócio e do descaso do poder público: cerca de mil búfalos foram encontrados à beira da morte, abandonados pelo próprio dono, o pecuarista Antônio Jader Jerônimo de Matos. A denúncia, feita pelo Ministério Público do Maranhão, aponta para um verdadeiro cenário de calamidade: animais sem água, sem comida, muitos já em estado de inanição e outros mortos, com carcaças espalhadas pela propriedade e urubus sobrevoando a área.
A situação é revoltante. Não apenas pelo sofrimento atroz infligido aos animais, mas pela indiferença escancarada diante da vida — em um país onde milhões de pessoas enfrentam a fome diariamente.
ABANDONO, FOME E MORTE
Relatório da Polícia Civil, após vistoria realizada em 2 de julho, confirma o que já se temia: dezenas de cadáveres em decomposição, animais invadindo propriedades vizinhas em busca de alimento, prejuízo a terceiros e um rastro de negligência. A única certeza: não havia qualquer sinal de doença infectocontagiosa. O que matou e segue matando esses búfalos é a fome — a mesma que assola milhares de lares brasileiros.
A Agência Estadual de Defesa Agropecuária (Aged) corroborou o quadro: mortes por desnutrição severa. É a sentença final de uma tragédia anunciada, fruto do abandono deliberado, da ganância sem limites e de uma cultura onde o lucro se sobrepõe à vida.
AÇÃO JUDICIAL: TARDE DEMAIS PARA MUITOS
O Ministério Público ingressou com ação civil pública pedindo a apreensão imediata dos animais sobreviventes, a responsabilidade compartilhada do governo estadual e da prefeitura de Parnarama no resgate, tratamento e manutenção dos búfalos, além do bloqueio das contas do pecuarista para custear a alimentação dos animais. Também foi solicitada a aplicação de multa em caso de omissão por parte do poder público.
Mas quantas vidas já foram perdidas até que a justiça decidisse agir? Quantos dias esses animais agonizaram sob o sol escaldante, sem água e sem comida, enquanto seus gritos silenciosos eram ignorados por autoridades e vizinhos?
INDIFERENÇA OFICIAL
A prefeitura de Parnarama, confrontada pela imprensa, preferiu o silêncio. Um silêncio que mata. Que pesa. Que conivente.
E onde está o Governo do Estado? Onde estão as políticas de bem-estar animal? Onde estão os agentes públicos que deveriam zelar pela dignidade mínima de qualquer ser vivo?
Não é apenas o pecuarista que deve ser responsabilizado. O poder público também deve responder por sua omissão criminosa diante de uma tragédia anunciada. A Constituição brasileira é clara: todos têm o dever de proteger os animais da crueldade.
BRASIL, TERRA DE FOME E DESPERDÍCIO
Enquanto búfalos morrem de fome no campo, brasileiros também morrem de fome nas cidades. Segundo a Rede PENSSAN, mais de 33 milhões de pessoas vivem em situação de fome no Brasil. Em meio a esse cenário, ver milhares de quilos de carne sendo desperdiçados — com animais morrendo por negligência — é mais do que absurdo: é uma acusação direta à falência ética e social do país.
O presidente Lula afirma, com razão, que a luta contra a fome é uma prioridade nacional. Mas como erradicar a miséria em um país onde a vida — humana ou animal — é descartável?
UM GRITO POR JUSTIÇA
Este não é um caso isolado. É o retrato cruel de um sistema que falha em todos os níveis: na fiscalização, na punição, no planejamento e, principalmente, na preservação da vida.
Se nada for feito de forma exemplar e rápida, a tragédia de Parnarama será apenas mais uma estatística, um número abafado por burocracias e pela indiferença. É preciso responsabilizar — civil e criminalmente — os envolvidos. É preciso resgatar os animais sobreviventes com urgência. E é preciso transformar essa dor em política pública séria, fiscalizada e transparente.
Porque quem abandona um animal à morte comete um crime. Mas quem ignora esse crime, também.