O Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a condenação de Gabriel Ferreira Mesquita a seis anos de prisão pelo crime de estupro. Ele é proprietário do bar Bambambã, na Asa Norte, em Brasília.
Um grupo de 12 mulheres acusou Gabriel de abusos durante relações sexuais. O processo julgado envolve o caso de duas mulheres. Elas afirmaram que tiveram a relação sexual consentida com o acusado, mas depois de pedirem para interromper o ato, ele continuou forçadamente. A ação tramita em segredo de Justiça.
Na primeira instância, o acusado foi condenado a seis anos por estupro, mas a sentença foi anulada na segunda instância. No entendimento dos magistrados, não ficou configurado o constrangimento das vítimas, que deveria ter ocorrido com “reação séria e efetiva” para recusar o ato pretendido pelo acusado.
Sobre o julgamento no STJ
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) entrou com Recurso Especial contra decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) que absolveu, em segunda instância. A Sexta Tuma do STJ aceitou o recurso do MPDFT. O placar foi de 3 a 2, para restabelecer a condenação de Gabriel.
Em seu voto, na abertura da sessão que julgou o caso, o ministro Sebastiao Reis Júnior, presidente do STJ, afirma que “a violência ficou configurada pelo uso de força física para vencer a resistência da vitima, apresentada por meio de seu dissenso explícito e reiterado para com a relação. Nesse ponto, o dissenso é fundamental para caracterização do delito”. Ele reforça que “a concordância e o desejo da vítima tem de perdurar durante toda atividade sexual”.
Outro ministro que votou pela condenação, Rogerio Shietti Cruz, relator do caso, reiterou a negativa da vítima pelo ato. “Por tudo que conta dos autos, não há duvidas de que as evidências sinalizam para o expresso e reiterado dissenso da vitima, que não foi suficiente para fazer cessar a iniciativa do acusado”, disse Shietti Cruz.
No placar de 3 a 2 pela condenação, o ministro Antônio Saldanha Palheiro votou ponderando jurisprudência firmada pelo CNJ em matéria penal, e disse não sentir confortável em votar pela condenação.
“Não tenho dúvidas que a palavra da vítima tem destaque. (..) mas se apesar da relevância dessas declarações, permanecer dúvidas fundadas, não existe caminho para o julgador em matéria penal, que não seja a absolvição”, disse Saldanha em sessão do STJ.
Decisão histórica pode criar nova jurisprudência
De acordo com essa decisão, não se exige a comprovação de que houve algum tipo de violência física ou ameaça à mulher para que seja caracterizado o estupro. Basta apenas que ela, a vítima, verbalize a negativa, mesmo que durante a prática sexual que se iniciou de forma consentida.
A CNN conversou com o professor de Direito Penal, Processo Penal e Lei Maria da Penha, Rafael Paiva, que analisou o caso.
“De fato se trata de uma decisão histórica do STJ, uma vitória na luta pela liberdade sexual das mulheres. Não tenho dúvidas de que é uma vitória”, analisa o especialista em direito penal.
Ele explica que nos casos de estupro, é comum que a Justiça leve em consideração o que é produzido, em termos de prova, após o ato sexual criminoso.
“É fato que em crimes sexuais, conhecidos como crimes entre quatro paredes, a palavra da vítima tem uma validade maior, e agora, com essa nova decisão, ganha um poder maior ainda” afirma Paiva.
Entretanto, na prática dos julgamentos, sobretudo em primeira e segunda instância, esse entendimento deve encontrar muita resistência, em razão da produção da prova.
“É normal que se façam os seguintes questionamentos: A vítima se submeteu a exame de corpo de delito? Procurou ajuda? Tem lesões no corpo?”, explicou o professor de direito.
A lei brasileira define estupro como conjunção carnal ou ato libidinoso mediante violência ou grave ameaça, mas é a interpretação o juiz que, na prática, entende se aquele ato é violento ou não.
Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/stj-pode-mudar-interpretacao-de-estupro-no-brasil-entenda/