21 de setembro de 2024
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O debate sobre economia política no Brasil tem sido tumultuado por muita desinformação, vindo de vários espectros políticos. 

A direita, por exemplo, tenta emplacar a narrativa de que o país vive uma situação econômica desastrosa. 

A maioria dos indicadores, no entanto, sinaliza exatamente o oposto: emprego em alta, PIB crescendo, e inflação sob controle.

Não se trata aqui de opinião do jornalista. O debate político no país, sobretudo em assuntos de economia, precisa estar fundamentado em dados, ou então se torna uma discussão vulgar de botequim (com todo o respeito às discussões de botequim).

PIB em alta

Em primeiro lugar, falemos do Produto Interno Bruto, o famoso PIB. A saudosa Maria da Conceição Tavares dizia que a gente não come PIB, no que estava correta, mas não podemos esquecer que a recíproca não é verdadeira. Ou seja, o PIB, quando tem fome, come o brasileiro.  

Segundo o IBGE, o PIB do Brasil, no primeiro trimestre de 2024, cresceu 2,5% sobre o mesmo período de 2023. É um ótimo crescimento, sobretudo porque atingido com inflação dentro da meta (abaixo de 4% ao ano).

Além disso, foi um crescimento com qualidade, porque se registrou uma expressiva alta, de 2,7%, na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), um nome complicado para o que é conhecido mais popularmente como investimento. E também porque foi puxado sobretudo pelo consumo das famílias, que avançou impressionantes 4,4% (sempre comparando com o mesmo período de 2023).

Outro fator positivo do PIB brasileiro no primeiro trimestre foi o crescimento da indústria, que avançou 2,8% na comparação com o mesmo período de 2023. Por aí se vê, a propósito, a contribuição do setor industrial para a estabilidade econômica do país, pois se dependessemos apenas da agropecuária, que registrou queda de 3% no primeiro trimestre, o PIB poderia ter ficado negativo. 

A propósito, os números da indústria, apesar de um recuo na média geral em maio, ainda mantém um crescimento acumulado de 2,5% no ano, com destaque para a recuperação do setor de bens de capital, que acumula alta de 4,1% nestes cinco primeiros meses do ano. Tudo indica que a indústria brasileira terá mais um bom ano, e até mesmo a alta do dólar deve lhe beneficiar, porque deixa os manufaturados nacionais mais competitivos, tanto para o consumidor brasileiro quanto para o resto do mundo.

Na comparação com o trimestre imediatamente anterior, o crescimento do PIB no primeiro trimestre de 2024 foi de 0,8%, o que também é um excelente número.

A inflação é motivo de acaloradas discussões nas redes, mas é preciso desfazer algumas confusões. A mais comum é confundir os altos e baixos nos preços de alguns produtos específicos com a taxa média da inflação no país.

Nos últimos meses, houve alta de preço de alguns alimentos importantes, como o arroz, mas as carnes e pescados seguem com preços bem menores do que há alguns anos. 

Houve um repique inflacionário em fevereiro, sobretudo, quando o IPCA chegou a 0,83%, mas a partir de março a situação normalizou-se. Na média de 12 meses, a inflação ainda vive dias tranquilos, situando-se em 3,93%, abaixo do teto da meta, que é 4%. 

Exportações continuam a bater recordes históricos

A dissonância cognitiva de quem vê um “desastre econômico” no Brasil se torna mais evidente quando olhamos para nosso comércio exterior, que está mais pujante do que nunca.

Nos últimos 12 meses, até junho, o saldo comercial do país bateu um novo recorde histórico (para o período jul/jun) e chegou a quase 100 bilhões de dólares, ou mais precisamente 97 bilhões de dólares

As exportações geraram receita de 342 bilhões de dólares nos 12 meses terminados em junho. Ao contrário do senso comum, que pinta o Brasil apenas como um “fazendão”, exportador unicamente de produtos primários, 51% das exportações brasileiras são produtos manufaturados, classificados como indústria de transformação.

Esse é nosso mais sólido e indestrutível seguro contra ataques especulativos à nossa moeda. Por isso também não faz sentido nenhum pânico cambial.

O problema das oscilações cambiais bruscas é que elas tumultuam os negócios. Um dólar um pouco mais alto pode pressionar alguns itens importantes para a inflação, como remédios, pão, serviços de tecnologia e transportes. Mas também beneficia a indústria brasileira, como já falamos lá em cima, porque deixa nossos produtos mais competitivos no mercado internacional. Ou seja, os próprios fundamentos da economia brasileira garantem uma moeda estável, porque se o real se desvalorizasse muito, nossas exportações iriam aumentar tanto, nossas importações iriam cair tanto, que pressionariam pela revalorização da nossa moeda (pois estaria entrando mais dólar, pela exportação em alta, e saindo menos dólar, pela importação em baixa).

Diante desses números, inequivocamente positivos, a direita passou a tocar o tambor do terrorismo fiscal. Neste caso, ela conta com a ajuda de sua velha aliada nestes assuntos, a mídia corporativa, que ajuda a promover desinformação e pânico.

Na verdade, todavia, as contas públicas estão sólidas. A receita total do governo central, no acumulado de 12 meses, foi de 2,53 trilhões de reais, um recorde histórico incrível. E os recordes estão vindo, sobretudo, nos últimos meses.

O problema, naturalmente, é o resultado primário, que é a soma de receitas e despesas. Em 12 meses, o resultado primário ficou negativo (ou seja, virou déficit primário) em 268 bilhões de reais. O déficit nominal, que inclui a conta de juros, chegou a R$ 1 trilhão em maio último.

Esses são os números que a mídia usa para falar em “rombo fiscal”.

Acontece que esses números, em si mesmos, não fazem muito sentido. É preciso olhar sobretudo para o percentual do resultado primário sobre o PIB, porque uma economia maior pode suportar, sem maiores problemas, níveis maiores de endividamento público.

O déficit primário em maio de 2024, no acumulado de 12 meses, correspondia a 2,42% do PIB. A previsão do mercado, porém, é que ele baixe para próximo de 1% do PIB até o fim do ano. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está comprometido em zerar o déficit neste ano ou em 2025.

Podemos até fazer uma comparação com outros momentos ruins, como a crise política vivida pelo governo Dilma em 2015 e 2016, e com a pandemia de 2020 e 2021, mas não nos termos em que a direita tem feito.

Tanto na crise de 2025 quanto na pandemia, o PIB estava em declínio, o desemprego explodindo e o Brasil não tinha um saldo comercial de quase 100 bilhões de dólares. Hoje o PIB está em ascensão, o nível de emprego se mantém firme e o comércio exterior bate recordes.

Por fim, precisamos falar de algumas críticas injustas vindas da própria esquerda, fruto também de falta de informação – e neste sentido o governo deve ter alguma responsabilidade.

A principal delas, a meu ver, é a acusação de que o governo Lula é neoliberal, e de que a gestão de Haddad à frente do ministério da Fazenda é austericida.

Eu acho que, neste caso, as pessoas confundem a linguagem de Haddad, que precisa manter um diálogo com agentes do mercado e do setor produtivo, e o que, na prática, ele vem fazendo.

O governo Lula III pode ser tudo, menos neoliberal.

Os números não mentem. O governo Lula não está adotando, definitivamente, uma política de austeridade fiscal. Aliás, é justamente por isso que o governo vem enfrentando pesados ataques da mídia e do mercado financeiro, por se recusar a cortar despesas, especialmente aquelas de cunho social.

Os gastos federais com Bolsa Família, Saúde e Educação, no acumulado de 12 meses encerrado em maio último cresceram fortemente em relação aos 12 meses do último ano de Bolsonaro. Usamos aqui, naturalmente, valores devidamente deflacionados, ajustados pelo IPCA do IBGE de maio de 2024. E somamos gastos obrigatórios e discricionários.

O gasto federal com Bolsa Família, nos 12 meses até maio deste ano, totalizou 172 bilhões de reais, 180% acima do valor gasto pelo governo Bolsonaro em seu último ano.

Com educação, as despesas federais totalizaram R$ 45,7 bilhões nos 12 meses encerrados em maio último, um aumento de 160% sobre o último ano de Bolsonaro!

As despesas federais com saúde, por sua vez, chegaram a R$ 196 bilhões no acumulado de 12 meses até maio de 2024, um aumento de 132% sobre 2022, último ano da administração anterior.

Os gráficos abaixo ilustram bem o aumento impressionante das despesas federais com esses três itens fundamentais para a questão social: bolsa família, saúde e educação.

No caso da educação, chama atenção a forte queda dessas despesas no governo Bolsonaro. Por aí se entende a situação difícil vivida pelas universidades federais, e o tamanho do problema que explodiu em mãos do ministro Camilo Santana.

Aliás, até mesmo na saúde, se nota que os gastos caíram muito durante o governo Bolsonaro, mesmo com a pandemia pressionando dramaticamente o serviço público.

Como percentual do PIB, as despesas federais com educação caíram fortemente desde o início da crise política provocada pela Lava Jato, em 2014 e 2015, acentuando-se após o golpe de 2016, e caindo ainda mais durante o governo Bolsonaro. Em dezembro de 2022, último mês da administração anterior, as despesas federais com educação haviam caído para o mínimo histórico de 0,28% do PIB.

Desde que o governo Lula assumiu seu terceiro mandato, porém, os gastos com educação voltaram a subir, e agora já estão em 0,41% do PIB.

Conclusão

O debate sobre a economia política do governo Lula deve ser feito com dados, porque essa é a única maneira de fazer as críticas corretas, mesmo construtivas.

Fonte: https://www.ocafezinho.com/2024/07/07/a-economia-vai-bem/