
A China praticamente interrompeu as compras de soja dos Estados Unidos em 2025, abrindo espaço para o Brasil consolidar-se como o principal fornecedor mundial do grão ao país asiático, informa o colunista Jamil Chade, do portal UOL. O movimento, segundo levantamento da American Farm Bureau Federation — uma das mais influentes entidades do agronegócio estadunidense —, simboliza uma reconfiguração profunda no comércio agrícola global e expõe a crescente dependência chinesa da América do Sul.
Colapso nas vendas dos EUA
De acordo com o relatório, a China comprou 26,5 milhões de toneladas de soja dos EUA em 2024, o equivalente a metade de suas importações do produto naquele ano. Em 2025, o volume despencou para apenas 5,8 milhões de toneladas.
Para a entidade, “os mercados de soja tornaram-se o sinal mais claro de estresse no comércio agrícola dos EUA”. O documento aponta que “durante junho, julho e agosto, os EUA praticamente não enviaram soja para a China, e a China não comprou nenhuma soja da nova safra para o próximo ano comercial”.
A American Farm Bureau Federation destaca ainda que, “mesmo quando os agricultores americanos produzem safras com preços competitivos, a China tem reduzido gradualmente sua dependência dos Estados Unidos, voltando-se para o Brasil, a Argentina e outros fornecedores”.
Brasil domina o mercado
Enquanto os embarques dos EUA minguaram, o Brasil ampliou sua presença no mercado chinês. Apenas neste ano, o país já exportou mais de 77 milhões de toneladas de soja para a China, segundo o estudo. Para os produtores dos EUA, esses números “ressaltam como a América do Sul interveio para dominar o mercado e deslocar os agricultores americanos”.
A Argentina também buscou aumentar sua competitividade, suspendendo brevemente o imposto de exportação sobre a soja — medida revertida poucos dias depois, quando a arrecadação atingiu o limite de US$ 7 bilhões.
Pressão política e promessa de ajuda
A crise nas exportações agrícolas reacendeu a tensão política nos Estados Unidos. O secretário do Tesouro, Scott Bessent, anunciou que o governo de Donald Trump prepara um “apoio substancial aos nossos agricultores, especialmente aos produtores de soja”, com expectativa de anúncio ainda nesta semana.
Trump também tentou tranquilizar o setor rural, que vem demonstrando crescente insatisfação. “Os produtores de soja do nosso país estão sendo prejudicados porque a China, por razões de ‘negociação’ apenas, não está comprando”, escreveu o presidente em sua rede Truth Social. “Ganhamos tanto dinheiro com tarifas que vamos pegar uma pequena parte desse dinheiro e ajudar os nossos agricultores”, garantiu.
Durante a guerra comercial de 2019, Trump destinou mais de US$ 22 bilhões em subsídios emergenciais aos produtores rurais.
Transformação estrutural no comércio agrícola
Para os analistas da American Farm Bureau Federation, o problema atual vai além da disputa comercial. A entidade alerta que as importações chinesas de soja não diminuíram — pelo contrário, atingiram níveis recordes —, mas “a maior parte dessa demanda agora está sendo atendida por concorrentes dos produtores americanos”.
O relatório observa que “a ampla oferta global e a demanda de exportação mais fraca estão pesando fortemente sobre os preços do milho, da soja e do trigo dos EUA, reduzindo as receitas agrícolas, apesar das fortes colheitas”. A situação é agravada pelos baixos níveis de água no Rio Mississippi, que elevam os custos de transporte e comprometem ainda mais a competitividade do país.
Milho e trigo seguem o mesmo caminho
A retração chinesa não se limita à soja. Neste ano, Pequim não comprou milho, trigo nem sorgo dos Estados Unidos, e as exportações de carne suína e algodão permanecem em níveis reduzidos. O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) projeta que as exportações agrícolas estadunidenses para a China somarão US$ 17 bilhões em 2025 — uma queda de 30% em relação ao ano anterior e de mais de 50% frente a 2022. Em 2026, o total deve cair para apenas US$ 9 bilhões, o menor patamar desde 2018.
Uma mudança de longo prazo
A entidade ressalta que a atual desaceleração “não é um evento isolado”, mas parte de uma tendência que se intensifica há mais de uma década. Em 2012, a China comprava US$ 25 bilhões em produtos agrícolas dos EUA — cerca de 20% de todas as exportações estadunidenses do setor. Em 2018, as vendas haviam despencado para US$ 9 bilhões, o menor volume em dez anos.
“Desde então, a China tem diversificado constantemente seus fornecedores, voltando-se mais para o Brasil e a Argentina em busca de soja, grãos e proteína”, afirma o relatório. “As metas de política interna da China, incluindo segurança alimentar e gestão de preços, também incentivam a distribuição das compras entre vários países para evitar a dependência dos Estados Unidos”, acrescenta.
A American Farm Bureau Federation conclui que essa mudança representa uma transformação duradoura. “Ela faz parte de uma trajetória mais longa, na qual a China está se diversificando, afastando-se da agricultura americana”, afirma. “Para os agricultores americanos, essa mudança significou menos vendas, um crescente déficit comercial agrícola e maior incerteza sobre o futuro papel da China como mercado para a agricultura americana”, finaliza.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/china-corta-compras-de-soja-dos-eua-e-brasil-assume-lideranca-nas-exportacoes-globais/