7 de abril de 2025
China quer transformar crise das tarifas “em oportunidade” de crescimento
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Enquanto diversos países ao redor do mundo tentam negociar concessões em resposta à intensificação da guerra comercial global promovida pelo presidente dos EUA, Donald Trump, a China adotou uma estratégia distinta.

Apenas 48 horas após o anúncio das tarifas, a segunda maior economia do planeta reagiu com suas próprias medidas punitivas contra produtos e empresas dos Estados Unidos.

Agora, a China envia uma mensagem clara: está bem preparada para enfrentar uma guerra comercial e sair mais forte no final do processo.

Essa mensagem foi transmitida de forma contundente tanto para o público interno chinês quanto para países estrangeiros, por meio de uma intensa cobertura da mídia estatal e uma série de declarações governamentais no fim de semana, após o ataque de Trump ao sistema de comércio global.

“Desde que os EUA iniciaram a (primeira) guerra comercial em 2017, não importa como os EUA lutem ou pressionem, continuamos a nos desenvolver e progredir, demonstrando resiliência — ‘quanto mais pressão recebemos, mais fortes nos tornamos’”, dizia o comentário.

“As tarifas dos EUA terão impacto (na China), mas ‘o céu não cairá’”, disse um comentário no porta-voz do Partido Comunista Chinês, o People’s Daily, no domingo (6).

Trump anunciou na quarta-feira (2) uma tarifa adicional de 34% sobre todos os produtos chineses importados para os EUA, aumentando os impostos sobre as importações chinesas para os Estados Unidos para mais de 54%, quando as tarifas atuais entrarem em vigor.

Em resposta, Pequim reagiu na sexta-feira (4) com suas próprias tarifas de 34% sobre todas as importações estadunidenses, além de outras medidas, como o controle de exportação de minerais de terras raras e restrições comerciais direcionadas a empresas específicas dos EUA.

O posicionamento de Pequim pode servir como uma estratégia de propaganda para tranquilizar o público chinês, que tem enfrentado dificuldades econômicas nos últimos anos, ao mesmo tempo em que busca projetar confiança para o resto do mundo.

No entanto, também reflete o que parecem ser os sinais da estratégia do líder chinês, Xi Jinping, e de sua equipe em Pequim: a percepção de que Trump não está utilizando as tarifas apenas como uma tática de negociação e que a interrupção do comércio global pode acabar prejudicando mais os EUA do que a própria China.

“Muitos colegas (da República Popular da China) argumentaram que os EUA estão cometendo um erro que prejudicará sua própria posição global”, escreveu Ryan Hass, membro sênior do think tank Brookings Institution, sediado em Washington, no domingo.

A publicação na rede social X aconteceu após reuniões com autoridades governamentais, acadêmicos e líderes empresariais durante uma visita à China.

“Há um debate sobre se o mundo está entrando em um período de blocos ou uma transição para uma era de globalização sem os EUA. Pequim parece preferir o último cenário”, disse ele, acrescentando que “os líderes da China não vão tolerar ser vistos como passivos em resposta aos EUA”.

Pronto para competir

Como as tarifas de Trump têm como alvo amigos e inimigos, as autoridades chinesas já tentaram projetar a China como uma economia globalizada que aumentou a prosperidade de países ao redor do mundo, bem como uma parceira econômica estável e um paraíso para os negócios.

“Como a segunda maior economia do mundo e o segundo maior mercado consumidor, a China continuará a abrir mais suas portas, independentemente das mudanças no cenário internacional”

Especialistas econômicos falando com a emissora estatal chinesa CCTV no sábado deram a entender que a abertura para assumir esse manto era uma oportunidade para Pequim.

“A China está enviando uma mensagem significativa ao mundo: não podemos recuar ou tolerar o bullying dos EUA, pois a tolerância acaba levando a mais bullying”, disse Liu Zhiqin, pesquisador sênior do Instituto Chongyang de Estudos Financeiros da Universidade Renmin da China, à emissora.

“A China e os EUA são agora rivais diretos na reformulação da ordem do comércio internacional”, disse Ju Jiandong, professor da Escola de Finanças do Banco Popular da China da Universidade de Tsinghua.

“Estamos dispostos a assumir o desafio — estamos prontos para competir com os EUA na redefinição do novo sistema de comércio global”, acrescentou.

Pequim é bem conhecida por exercer o acesso ao seu enorme mercado como uma arma para convencer países, muitas vezes com posições políticas diferentes às da China.

Muitos também bservarão com cautela se as exportações chinesas inundarão seus próprios mercados, prejudicando sua própria produção doméstica ou reduzindo os preços ao consumidor.

Mas os países podem ter pouca escolha a não ser buscar fortalecer os laços com a China se as tarifas dos EUA, que atingem tanto os aliados estadunidenses quanto os rivais, se tornarem o novo normal.

Pequim manteve conversas econômicas no mês passado com o Japão e a Coreia do Sul, atingidos na semana passada com tarifas de 24% e 25%, respectivamente, bem como com a União Europeia, punida com taxas de 20%.

Muitas economias do Sudeste Asiático, principais centros de fabricação para empresas que buscam diversificar para além da China, foram particularmente afetadas pela guerra tarifária de Trump. Embora poucos queiram brigar com Washington publicamente, a região está abalada.

Em Cingapura, um adepto do livre comércio conhecido por seguir uma linha diplomática cautelosa, o primeiro-ministro, Lawrence Wong, enviou uma mensagem à população no fim de semana.

“O recente anúncio do ‘Dia da Libertação’ pelos EUA deixa pouco espaço para dúvidas”, disse ele.

“Ele marca uma mudança sísmica na ordem global. A era da globalização baseada em regras e do livre comércio acabou. Estamos entrando em uma nova fase, mais arbitrária, protecionista e perigosa”, complementou.

Desafios internos

A China, no entanto, continua se preparando para o impacto e uma provável escalada.

No ano passado, os EUA e a China totalizaram cerca de meio trilhão em comércio, e as tarifas vêm enquanto a China tem visto alguns sinais de vitalidade econômica após anos lutando contra uma crise no setor imobiliário, alta dívida do governo local e as consequências dos controles da pandemia de Pequim.

No mês passado, o governo anunciou uma série de medidas para acelerar o consumo doméstico, pois antecipou o impacto em seu crescimento impulsionado pela exportação.

Agora, a China “impulsionaria vigorosamente o consumo doméstico com esforços extraordinários… e introduziria uma série de políticas de reserva conforme apropriado”, segundo o comentário do People’s Daily.

“A nova tarifa de 34% pesaria no PIB chinês em pelo menos 0,7 ponto percentual este ano”, escreveram analistas do Goldman Sachs em uma nota no domingo, prevendo que os formuladores de políticas da China “irão acelerar significativamente as medidas de flexibilização” para atingir sua meta de crescimento de “cerca de 5%” definida no mês passado.

Mas a retaliação “mais rápida e menos contida” da China desta vez também aumentou o risco de mais escalada tarifária de ambos os lados, alertaram os analistas.

Com informações da CNN Brasil.

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Fonte: https://agendadopoder.com.br/china-quer-transformar-crise-das-tarifas-em-oportunidade-de-crescimento/