
O desequilíbrio fiscal brasileiro tem efeitos concretos sobre a vida da população, afirmam economistas. O aumento do custo de vida, o crédito caro e a estagnação econômica são algumas das consequências mais visíveis de um país que sistematicamente gasta mais do que arrecada. O cenário, segundo especialistas, afasta investidores e compromete o futuro.
Para Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda e sócio da consultoria Tendências, a solução passa por reformas estruturais que promovam o equilíbrio fiscal. “Reformas trariam mais produtividade e crescimento à economia, mais emprego e, portanto, mais renda para a população. Provocariam um ciclo virtuoso com efeitos muito positivos”, afirma.
Segundo Nóbrega, o aumento dos gastos do governo eleva a demanda sem que a oferta acompanhe, gerando inflação. Esse fenômeno, que afeta principalmente os mais pobres, exige a manutenção de juros elevados pelo Banco Central para conter a economia. “Se não houvesse a distorção fiscal, a taxa de juros de equilíbrio poderia ser a metade da Selic que temos hoje, de 15%”, observa.
O economista Raul Velloso, referência em contas públicas, vê no descontrole fiscal um dos principais motivos para o baixo crescimento da economia e a queda no investimento em infraestrutura. Segundo ele, o setor público praticamente abandonou a área, e o setor privado, além de desconfiar do governo, não considera atrativas as remunerações oferecidas. “O país está condenado a não investir mais em infraestrutura. Então o Produto Interno Bruto (PIB) paga a conta e não cresce”, afirma.
Velloso aponta como fator central do desequilíbrio o crescimento persistente dos gastos com a Previdência. Ele destaca que a população em idade ativa, responsável por financiar o sistema, está diminuindo. Um levantamento feito pelo economista revela que, entre 2011 e 2018, os regimes previdenciários dos municípios cresceram 12,5% em termos reais. Nos estados, o avanço foi de 5,9% entre 2006 e 2018. Já na União, o aumento foi de 3,1% (2006 a 2021), e no INSS, de 5,1% (2006 a 2020).
Enquanto isso, os investimentos em infraestrutura despencaram. Em 2014, representavam 10% do PIB; em 2022, caíram para -3,4% em termos reais. O PIB, que crescia 4% em 2014, avançou apenas 0,4% em 2022.
Luiz Fernando Figueiredo, presidente do Conselho de Administração da Jive Mauá e ex-diretor do Banco Central, critica o descompasso entre as políticas fiscal e monetária. De um lado, o governo estimula a economia com gastos; de outro, o Banco Central tenta conter os efeitos com juros altos, o que trava a atividade econômica e encarece o crédito.
Segundo ele, a dívida pública brasileira, que já representa quase 80% do PIB, é a mais elevada entre os países emergentes. “O governo deveria fazer um ajuste fiscal de 1% a 3% do PIB no gasto, incluindo as isenções fiscais, ao longo do tempo. Esse ajuste para um país que arrecada o equivalente a 35% do PIB é quase nada”, diz. Ele também defende que o salário mínimo seja reajustado apenas pela inflação, o que reduziria o ritmo de crescimento das despesas.
Maílson da Nóbrega avalia que uma nova reforma da Previdência será inevitável, com unificação das regras para o INSS e servidores públicos, além de revisão no Benefício de Prestação Continuada (BPC). Ele ressalta que, ao contrário do que ocorre em outros países, onde os aposentados têm reposição inflacionária, no Brasil o benefício é reajustado com ganho real, por estar atrelado ao salário mínimo. “O Brasil gasta com aposentadorias 32% do Orçamento primário, enquanto a média de outros países, inclusive mais ricos, é de 7,5%”, afirma.
Para ele, o sistema fiscal brasileiro se tornou disfuncional, com mais de 90% do Orçamento comprometido por gastos obrigatórios, como os pisos constitucionais de saúde e educação. “O governo foi perdendo a margem de gastos para financiar políticas públicas de ciência, cultura e investimento público. Todos os brasileiros deveriam se conscientizar que esta situação é uma calamidade.”
Velloso reforça que, sem o avanço acelerado das despesas previdenciárias, o país poderia ter superávit em suas contas. “O IBGE, que faz o censo, tinha que ter alertado que houve um crescimento muito forte da população acima de 65 anos, o que impactaria nos gastos previdenciários”, conclui.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/crise-fiscal-ameaca-crescimento-e-impacta-vida-dos-brasileiros-alertam-economistas/