
Ex-conselheiros do Carf (Conselho de Administração de Recursos Fiscais) e advogados tributaristas tornaram-se réus em ações penais que apuram supostos esquemas de corrupção para interferir em decisões do órgão vinculado ao Ministério da Fazenda. As denúncias envolvem pagamento de propinas para beneficiar empresas em disputas tributárias com a Receita Federal. As defesas dos acusados negam qualquer irregularidade. As informações são do jornal Folha de S. Paulo.
Desde o ano passado, a Justiça Federal de São Paulo aceitou pelo menos duas denúncias relacionadas ao caso. Uma delas, sob sigilo, trata da suspeita de pagamento de propina para cancelar uma dívida de R$ 161 milhões de uma empresa de turismo ligada a Guilherme Paulus, fundador da CVC. A atual CVC Brasil, comprada parcialmente por um grupo norte-americano, não é alvo da investigação.
Paulus também figura como réu no processo, mas firmou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal e poderá ser beneficiado em eventual sentença. O caso faz parte da Operação Descarte, deflagrada em 2018 para investigar fraudes envolvendo empresas de limpeza urbana, e que posteriormente se desdobrou em outros inquéritos envolvendo escritórios de advocacia e crimes como sonegação fiscal, corrupção e lavagem de dinheiro.
A denúncia recebida em 2023 tornou réus dois ex-conselheiros do Carf: João Carlos Cassuli Junior, que foi relator do caso, e Fernando Lobo d’Eça. Segundo o Ministério Público, os dois teriam recebido R$ 5 milhões em dinheiro vivo para votar favoravelmente à empresa de Paulus e permitir a análise de um recurso fora do prazo legal. A decisão resultou no cancelamento da dívida e impossibilitou a interposição de recurso por parte da Receita Federal.
Os réus respondem por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Já Paulus é acusado de corrupção ativa e lavagem.
Outro caso desdobrado da mesma operação — batizado de Operação Checkout, deflagrada em 2019 — identificou que um auditor da Receita violou o sigilo profissional ao alertar um lobista sobre a lavratura de um auto de infração contra a empresa de Paulus, o que teria sido parte do esquema para burlar o processo administrativo.
Além dos ex-conselheiros, também foram denunciados outros advogados e empresários. Um deles é Eduardo Rocca, que figura como réu em um segundo processo aberto neste ano. De acordo com a nova denúncia, ele teria solicitado R$ 350 mil para garantir uma decisão favorável no Carf a uma empresa do setor de borrachas e bombas industriais. Os conselheiros envolvidos nesse processo não foram denunciados por falta de provas.
A acusação contra Rocca tem como base o depoimento de outro advogado, delator no caso, que também foi denunciado. A investigação revelou movimentações em espécie e a emissão de notas fiscais supostamente falsas por uma empresa de fachada usada para lavar o dinheiro do esquema.
Defesas rebatem acusações
As defesas dos acusados negam as acusações e apontam fragilidade nas denúncias do Ministério Público.
A defesa de João Carlos Cassuli classificou a ação como “uma aventura jurídica”. Segundo o advogado Guilherme Favetti, “o inquérito policial comprova de forma robusta que João Cassuli conduziu os processos que relatou de forma isenta e técnica. O voto proferido foi juridicamente fundamentado em sólida jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, e foi acompanhado à unanimidade pelos demais conselheiros, inclusive pelos representantes da Receita Federal”. Ele ainda destacou que não houve recurso por parte da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).
O advogado Gerson Mendonça, que defende Fernando Lobo d’Eça, também sustenta que a decisão do Carf foi unânime e respaldada por jurisprudência do STF. “Vale lembrar que a decisão do Carf foi submetida novamente à 4ª Turma, dois anos depois, tendo os conselheiros, em nova composição da turma (sem o Dr. Fernando), julgado novamente a matéria com o mesmo resultado”, disse. Segundo Mendonça, a Corregedoria do Ministério da Fazenda arquivou um inquérito preliminar sobre o caso envolvendo seu cliente.
Já a defesa de Eduardo Rocca, representada por Jair Jaloreto, afirma que a denúncia “deriva de uma delação premiada maldosa e mentirosa, cujo objetivo foi somente beneficiar o delator e proteger sua família”. Ele também ressaltou que, durante a fase de inquérito policial, a autoridade investigadora havia se manifestado pelo arquivamento do caso por falta de indícios de crime.
Procurado pela reportagem, Guilherme Paulus não respondeu às perguntas. Em declarações anteriores, ele afirmou que “firmou acordo com o Ministério Público Federal e a PF, tornando-se colaborador da Justiça”, e que prestou os devidos esclarecimentos às autoridades, mantendo-se sob compromisso de confidencialidade.
Em 2015, o Carf teve suas atividades paralisadas após a deflagração da Operação Zelotes, que expôs um amplo esquema de venda de decisões dentro do conselho. As novas denúncias retomam suspeitas antigas sobre a vulnerabilidade do órgão e reforçam o debate sobre a necessidade de mecanismos mais rigorosos de transparência e controle nas instâncias administrativas de julgamento fiscal.
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