18 de abril de 2025
Mesmo após recuo, taxas impostas por Trump provocam boicote internacional
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Apesar de o pacote de tarifas batizado por Donald Trump de “tarifas do Dia da Libertação” ter sido temporariamente suspenso e em parte suavizado, consumidores internacionais continuam promovendo boicotes a produtos dos Estados Unidos.

Entre os mais impactados estão os tradicionais parceiros comerciais estadunidenses. Do Canadá à Europa, ganham força campanhas de “compre local”, que se espalham tanto por redes sociais quanto por estabelecimentos físicos.

Em 2 de abril, Trump anunciou a aplicação de uma sobretaxa geral sobre todas as importações para os EUA, além de “tarifas recíprocas” direcionadas a determinados países. No entanto, no dia 9, o ex-presidente adotou um tom mais moderado, anunciando uma pausa de 90 dias nas medidas e reduzindo a maioria das tarifas para uma alíquota básica de 10%.

A única exceção ao abrandamento foi a China, que agora está sujeita a tarifas de 125%, sob a justificativa de Trump de que teria demonstrado “falta de respeito” com “os mercados do mundo”.

Enquanto governos de países afetados respondem com suas próprias barreiras comerciais, cidadãos têm aderido a iniciativas espontâneas de protesto.

Na União Europeia — que havia sido atingida por uma sobretaxa de 20% sobre suas exportações antes do recuo do dia 9 —, consumidores estão buscando reverter o protagonismo dos EUA no mercado, até mesmo de forma literal.

Mobilização nas redes e nas empresas

Desde que a Casa Branca sinalizou com medidas tarifárias, surgiram diversos grupos no Facebook organizando boicotes e campanhas.

O grupo francês “Boycott USA: Achetez Français et Européen!” (Comprem francês e europeu!) já reúne mais de 30 mil membros. Na Suécia, os grupos “Bojkotta varor från USA” e “Boykot varer fra USA” (Boicote aos produtos dos EUA) acumulam, juntos, mais de 180 mil participantes, todos empenhados em pressionar pelo fim das sanções.

Na Alemanha, uma pesquisa conduzida pelo instituto Cuvey revelou que 64% da população prefere evitar produtos dos EUA sempre que possível. Uma pequena maioria afirmou que as políticas adotadas por Trump já influenciam suas escolhas de consumo.

Nas redes sociais e fóruns como o Reddit, movimentos online incentivam consumidores europeus e canadenses a colocarem produtos estadunidenses de cabeça para baixo nas prateleiras dos supermercados, como forma de alertar e desencorajar compradores.

Empresas europeias também têm adotado posicionamentos contrários a marcas dos EUA. O Salling Group, maior varejista da Dinamarca, anunciou que passará a identificar os produtos europeus com uma estrela preta, para facilitar a escolha dos consumidores.

No LinkedIn, o CEO da empresa, Anders Hagh, afirmou que continuará comercializando produtos estadunidenses, mas que a nova sinalização é “um serviço extra para fregueses que querem comprar artigos de marcas europeias”.

Outras companhias têm ido ainda mais longe. A Haltbakk Bunkers, fornecedora norueguesa de óleo e combustível para navios, comunicou que deixará de abastecer embarcações da Marinha dos EUA.

Tesla sofre impacto direto

A Tesla, marca estadunidense de veículos elétricos comandada por Elon Musk — maior doador da campanha de Trump e atual conselheiro especial da Casa Branca na força-tarefa do Departamento de Eficiência Governamental (Doge) —, tem sido a mais atingida pelo boicote global.

A empresa viu seu valor de mercado cair 40% na bolsa de valores e tem sido alvo de protestos em diversas partes do mundo, alguns deles com episódios de violência.

As vendas globais da Tesla despencaram 13% no primeiro trimestre de 2025, apesar das promoções e incentivos oferecidos. Na Europa, a queda foi ainda mais acentuada: em janeiro, as vendas foram 45% inferiores às do mesmo mês do ano anterior, segundo a Associação de Construtores de Automóveis Europeus.

Em contrapartida, montadoras locais se beneficiaram. A Volkswagen liderou as vendas de carros elétricos no primeiro trimestre de 2025, seguida pela BMW e por três subsidiárias do grupo: Skoda, Audi e Seat. A Tesla, que antes ocupava a liderança, caiu para a oitava posição.

Canadá em clima anti-Trump impulsiona liberais

Em março, Trump determinou uma sobretaxa de 25% sobre aço, alumínio e automóveis vindos do Canadá, além de bens que não estão incluídos no acordo USMCA (EUA-México-Canadá).

Esse ambiente hostil favoreceu politicamente o Partido Liberal, atualmente liderado por Mark Carney, sucessor de Justin Trudeau, que viu sua popularidade crescer a ponto de figurar à frente nas pesquisas para as eleições de 24 de abril.

A rejeição aos produtos estadunidenses no Canadá também é evidente. O governador de Ontário, Doug Ford, rescindiu um contrato de 100 milhões de dólares canadenses (equivalente a R$ 412 milhões) com a empresa Starlink, de Elon Musk. Em publicação na plataforma X, Ford escreveu: “Ontário não faz negócios com quem está doido para destruir a nossa economia.”

Empresas canadenses lançaram campanhas com o lema “Buy Canadian”. O Conselho de Bebidas Alcoólicas de Ontário declarou que deixará de estocar uísques bourbon e vinhos dos EUA, e outras províncias, como Colúmbia Britânica e New Brunswick, adotaram medidas semelhantes.

Surgiram também sites e aplicativos como Buy Beaver, Maple Scan e Made in CA para ajudar os consumidores a identificar e evitar produtos estadunidenses. Em entrevista à revista Business Insider, Dylan Lobo, fundador do Made in CA, comentou: “Há muito patriotismo no momento, neste país. Há um forte sentimento de que os canadenses querem apoiar outros canadenses.”

“Freedom fries” revisitado?

Fora da Europa e do Canadá, executivos do setor empresarial observam atentamente as possíveis consequências das retaliações e como elas podem afetar suas atividades — sobretudo os que operam com marcas de origem estadunidense.

Poucas semanas após o retorno de Trump à presidência, Takeshi Niinami, CEO da multinacional japonesa Suntory Holdings — dona de marcas como o bourbon Jim Beam —, antecipou que haveria rejeição global aos produtos dos EUA.

— Nós elaboramos o plano estratégico e orçamentário para 2025 partindo do princípio de que os produtos americanos, inclusive o uísque, serão menos aceitos fora do país, por causa, em primeiro lugar, das tarifas, e em segundo, de emoção — declarou à revista Financial Times.

Para o professor de história Garritt van Dyk, há paralelos entre o atual movimento de repúdio aos produtos dos EUA e a campanha de 2003 que rebatizou as “french fries” como “freedom fries”, em protesto à oposição francesa à guerra do Iraque.

— Em outros momentos no passado houve essa reação esquisita de ‘a gente não quer mais pertencer a essa cultura’ — observa o docente da Universidade de Waikato, na Nova Zelândia. Para ele, o impacto sobre a reputação das empresas americanas pode ser significativo, uma vez que, “num mercado superlotado, as pessoas podem fazer suas próprias escolhas”.

Com informações do g1.

Fonte: https://agendadopoder.com.br/mesmo-apos-recuo-taxas-impostas-por-trump-provocam-boicote-internacional-a-produtos-dos-eua/