
Em entrevista concedida à Folha de S.Paulo nesta quarta-feira (30), o ex-presidente do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), Alessandro Stefanutto, rebateu publicamente pela primeira vez as acusações que embasaram seu afastamento do cargo pela Operação Sem Desconto, da Polícia Federal.
Stefanutto é investigado por suposta omissão e liberação indevida de descontos em aposentadorias e pensões, que beneficiariam entidades como a Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), mesmo diante de alertas técnicos e jurídicos.
Em tom emotivo, o ex-presidente chorou ao afirmar que não recebeu nenhum tipo de benefício pessoal e que suas decisões foram pautadas pelo interesse público. “Nenhum ato feito nesta gestão foi motivado, da minha parte, por qualquer tipo de estímulo, agrado, ou qualquer tipo de coisa. Tenho convicção da minha correção, da minha inocência. Vou provar isso”, declarou.
Stefanutto defende que a liberação dos descontos seguiu entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo ele, um acórdão da corte, de junho de 2024, autorizava a retomada dos abatimentos desde que fossem cumpridos certos requisitos, como a adoção da biometria e a assinatura digital. “Não há de se dizer que foi contra a norma. O acórdão está aí, para todo mundo ver”, afirmou.
O ex-dirigente também reconheceu que autorizou o desbloqueio de cerca de 34 mil benefícios ligados à Contag, mesmo após parecer contrário da Procuradoria do INSS. Justificou a decisão com base em interpretações jurídicas divergentes e afirmou que isso é parte da rotina de uma autarquia: “Pela legalidade estrita, você não consegue fazer algumas coisas. Às vezes é preciso interpretar o direito para aplicar a melhor solução possível”.
Ainda de acordo com Stefanutto, quando surgiram reportagens sobre os descontos indevidos, sua gestão tomou medidas para apurar os fatos e implementar mecanismos de controle, como a exigência de biometria para novos cadastros e a abertura de investigações internas. Ele destacou ainda que sua gestão descredenciou entidades suspeitas e criou ferramentas para facilitar a remoção de descontos indevidos pelos beneficiários.
Suspeitas sobre servidores da cúpula
O ex-presidente também se defendeu das suspeitas de que integrantes da alta cúpula do INSS possam ter lucrado com o suposto esquema. Alegou desconhecer os detalhes das investigações e garantiu não ter apadrinhado os servidores citados. “Um dos diretores eu sequer conhecia. O outro foi escolhido pelo currículo técnico. Não sabia de nada que o desabonasse”, afirmou.
Críticas à morosidade institucional
Durante a entrevista, Stefanutto reconheceu que o INSS é uma estrutura lenta e que muitas ações implementadas por sua gestão poderiam ter sido mais ágeis. “Várias providências que eu tomei demoraram porque o INSS é muito grande. Nossa folha de pagamento envolve mais de 40 milhões de brasileiros”, argumentou.
Ele também criticou o prazo imposto pelo TCU para implementação da revalidação biométrica dos descontos, classificando-o como insuficiente: “Era muito pouco tempo para convocar idosos para fazer biometria. Entramos com embargo e aguardávamos julgamento”.
Legado e defesa pessoal
Servidor de carreira, Stefanutto comandava o INSS desde julho de 2023. Ele afirmou estar “sofrendo por não poder ir trabalhar” e comparou seu afastamento ao caso do ex-reitor da Universidade Federal de Santa Catarina Luiz Carlos Cancellier, que se suicidou após ser alvo de investigação. “O que mais doía para ele era não poder voltar à universidade. Eu me identifico com isso, porque minha vida sempre foi a Previdência”, declarou.
O ex-presidente concluiu afirmando que tem se dedicado à construção de sua defesa com base em documentos e atos administrativos. “Tenho convicção de que tudo o que fiz esteve dentro do direito. É um processo com um timing mais demorado, mas as decisões foram tomadas com responsabilidade. Vou mostrar os fatos concretos.”
RAIO-X | Alessandro Stefanutto, 53 anos
Ex-presidente do INSS, ocupava o cargo desde julho de 2023. Servidor público de carreira, foi também diretor de Finanças e Logística da autarquia. Afastado por decisão judicial no âmbito da Operação Sem Desconto, que apura supostas fraudes em descontos aplicados a aposentados e pensionistas.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/outro-lado-ex-presidente-do-inss-diz-que-seguiu-decisao-do-tcu-e-nega-omissao-sobre-descontos-irregulares/