
Se o atual modelo de produção de veículos elétricos (EVs) se mantiver, o Brasil poderá perder 13,9 mil hectares de floresta por ano — o equivalente a 46 campos de futebol por mês — nas próximas duas décadas e meia. O alerta faz parte de um estudo divulgado nesta quarta-feira (7), encomendado pelas organizações Fern e Rainforest Foundation Norway e lançado durante o Fórum da OCDE sobre mineração responsável.
O relatório projeta que o impacto ambiental será impulsionado pela demanda da União Europeia por minerais críticos usados nas baterias dos EVs, como lítio, níquel, cobre, cobalto, bauxita e manganês. Esses materiais são essenciais para o cumprimento do Pacto Verde Europeu, que visa alcançar a neutralidade de emissões de gases do efeito estufa até 2050.
Segundo o estudo, a União Europeia deverá consumir cerca de 23 milhões de toneladas de metais por ano até meados do século para alimentar sua frota elétrica. Boa parte desse volume virá de áreas com vegetação nativa, gerando impactos severos sobre as florestas tropicais, principalmente em países como Indonésia e Brasil.
“Não há dúvida de que precisamos de uma transição sustentável no setor de transportes”, afirmou Perrine Fournier, ativista da organização Fern, que atua na defesa de florestas e direitos humanos. “Mas precisamos garantir que isso não aconteça às custas das florestas do mundo e das pessoas que vivem nelas.”
Projeções preocupantes
O relatório avaliou o impacto ambiental da extração de minérios a partir de três cenários distintos, variando o tipo de bateria utilizada:
- Cenário 1: uso diversificado de tecnologias de bateria.
- Cenário 2: adoção integral de baterias NMC 811 (lítio, níquel e cobalto), que hoje dominam o mercado europeu.
- Cenário 3: substituição total por baterias LFP (lítio, ferro e fosfato), consideradas menos danosas.
Nos dois primeiros cenários, a Indonésia seria a mais afetada pelo desmatamento, respondendo por 42% e 63% da devastação, respectivamente, seguida pelo Brasil (com 18% e 11%). Já no terceiro cenário, com o uso de baterias LFP, o Brasil se tornaria o principal prejudicado, concentrando 36% do desmatamento projetado. Em todos os casos, os países europeus sofreriam menos de 1% do impacto.
A estimativa mais alarmante é a de que 118 mil hectares de floresta em todo o mundo poderão ser destruídos até 2050 para suprir a demanda europeia por veículos elétricos. Isso representa a derrubada de 18 campos de futebol de vegetação por dia durante 25 anos.
Impacto social e alternativas viáveis
O relatório também chama atenção para os efeitos sociais da mineração. De acordo com os dados, 54% das reservas minerais destinadas à transição energética estão localizadas em territórios indígenas ou próximos a eles. Se incluídas as áreas ocupadas por comunidades de agricultura familiar, o percentual sobe para 70%.
“A mineração também provoca deslocamentos e reassentamentos. Comunidades vulneráveis estão sendo removidas devido à expansão da mineração sobre terras e outros recursos naturais dos quais dependem — especialmente a água”, diz o relatório.
Apesar do cenário preocupante, os autores defendem que é possível evitar essa trajetória com políticas públicas e escolhas tecnológicas mais sustentáveis. O estudo mostra que, ao combinar o uso de baterias LFP com estratégias de mobilidade inteligente — como caronas compartilhadas, uso de microcarros e a redução da quilometragem percorrida por passageiro — o desmatamento global projetado poderia cair de 118 mil para 21,3 mil hectares.
A análise reforça a necessidade de reavaliar os impactos colaterais da transição energética e buscar soluções que considerem tanto o clima quanto a preservação da biodiversidade e os direitos das populações tradicionais.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/para-suprir-carros-eletricos-da-uniao-europeia-brasil-desmatara-46-campos-de-futebol-por-mes-diz-estudo/