23 de março de 2025
Prefeituras perderão R$ 4,9 bi com isenção do IR para
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A mudança no Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) proposta pelo governo federal deverá isentar em torno de 2 milhões de servidores municipais, o que deverá atingir em cheio os cofres das prefeituras, mostra um estudo da Confederação Nacional de Municípios (CNM). As perdas com a redução do IRPF retido na fonte que fica nos municípios foi estimada em R$ 4,9 bilhões por ano, para todas as prefeituras somadas.

O projeto de lei (PL) enviado ao Congresso deixou de fora a compensação dessas perdas. Por isso, parlamentares já estão se articulando para mudar essa parte da proposta desenha pelo Ministério da Fazenda.

Embora o IRPF seja federal, o bolo total da arrecadação obtida com o tributo é compartilhado com estados e municípios, um princípio da Constituição Federal.

A proposta da equipe econômica é compensar a perda de receita com a ampliação da isenção com uma tributação maior sobre os mais ricos, mantendo a arrecadação total com o IRPF no mesmo nível. Mas estados e municípios deverão sair perdendo porque, dada a maneira como se dá o compartilhamento dos recursos, a União ganharia participação no bolo.

A divisão dos recursos se dá de duas formas. A primeira é pelo IRPF retido na fonte. A Constituição prevê que os valores retidos na folha de pagamentos dos funcionários públicos estaduais e municipais ficam com o próprio ente público.

Por exemplo, a Prefeitura do Rio fica com R$ 2,1 bilhões do IRPF retido na fonte de seus servidores. Com a ampliação da faixa de isenção, haveria uma redução de 11%, ou R$ 235,4 milhões a menos nesse montante por ano, segundo um estudo do gabinete do deputado federal Pedro Paulo (PSD-RJ).

No total, as cerca de 5,5 mil prefeituras do país empregam em torno de 7,5 milhões de servidores, segundo a CNM. Pelas regras atuais, 3,4 milhões já são isentos do IRPF. Com a elevação da isenção, mais 2 milhões de servidores municipais entrariam nessa condição. No conjunto, a receita anual com essa fonte cairia em R$ 4,9 bilhões, estimou a CNM.

Ao anunciar a proposta, na terça-feira, o Ministério da Fazenda disse que não haveria perdas para os governos locais: “Apesar da redução na retenção de IR na fonte, estados e municípios se beneficiarão do aumento da massa salarial recebida pelos trabalhadores e do consumo, ampliando a arrecadação de ICMS, ISS e IBS”, diz um trecho do material divulgado pela pasta. Mas essa arrecadação adicional via consumo é incerta, segundo economistas.

É diferente da compensação para manter a arrecadação total do IRPF, que se daria alíquota mínima do IRPF sobre os contribuintes que ganham mais de R$ 50 mil ao mês. Esse adicional será compartilhado com estados e municípios, mas apenas uma parte dele.

Isso porque a segunda forma pela qual se divide o bolo é via os fundos de Participação dos Municípios (FPM) e dos Estados (FPE). A Constituição prevê que a União destine para o FPM e o FPE uma parte da arrecadação com o IR.

Se o bolo total da arrecadação com o IRPF for mantido no mesmo nível, teoricamente, estados e municípios não teriam perdas nessa frente. Mesmo assim, a CNM estimou que a mudança proposta pela Fazenda poderia reduzir em 3% os valores destinados ao FPM, ou R$ 6,9 bilhões ao ano a menos — no total, a CNM estimou que a perda anual de arrecadação das prefeituras poderá chegar a R$ 11,8 bilhões.

O economista Paulo Tafner, fundador e diretor-presidente do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS), chamou a atenção para o fato de que os municípios menores deverão perder mais, em termos relativos.

Em novembro, quando o governo federal anunciou que faria a proposta de mudança do IRPF, Tafner estimou que, nos municípios até 50 mil habitantes, a perda de receita com o IR poderia atingir de 70% a 80% do total arrecadado nessa fonte. No Orçamento dos municípios menores, tanto os valores retidos na fonte na folha de pagamentos dos servidores quanto os repasses do FPM representam uma fatia maior do total de receitas.

— Como sempre, toda a vez que a União mexe em tributos, dá um jeito de colocar mais para ela e ignorar os entes — disse o deputado Pedro Paulo.

Segundo o parlamentar, já há uma articulação entre deputados, prefeitos e governadores em torno de mudar esse ponto durante a tramitação do PL no Congresso. Um dos caminhos será destinar aos governos locais parte da arrecadação com o IRPF que seria retido na fonte dos rendimentos com dividendos de contribuintes que ganham mais de R$ 50 mil por mês.

Pedro Paulo disse que já apresentou requerimento de convocação dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, para tratar do tema na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara:

— Estou recebendo muitas ligações de prefeitos e até de governadores relatando a indignação com essa mão grande na sua arrecadação. E não é só o presidente Lula, não. O Bolsonaro fez isso com o ICMS dos combustíveis e aconteceu isso na Reforma Tributária. É cultura de Brasília, querer concentrar recursos lá.

Apesar das críticas do deputado, o economista Manoel Pires, coordenador do Centro de Política Fiscal e Orçamento Público do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) e pesquisador da UnB, ponderou que eventual mudança na repartição do bolo de arrecadação do IRPF se dará num contexto diferente do padrão histórico nacional.

Segundo Pires, os dados fiscais mostram que, desde 2015, a tendência tem sido o contrário do que aponta Pedro Paulo: estados e municípios vêm ganhando participação no bolo total da receita tributária nacional. Além de repasses via FPM e FPE, o movimento é puxado pelas receitas com royalties do petróleo e com o salto nos valores das emendas parlamentares ao Orçamento da União, que, em muitos casos, vão diretamente para os cofres das prefeituras.

— Tem que ver os valores para saber se, no crescimento da arrecadação (via FPM e FPE), será possível absorver as perdas com o IR retido na fonte — afirmou Pires.

Com informações de O Globo

Fonte: https://agendadopoder.com.br/prefeituras-perderao-r-49-bi-com-isencao-do-ir-para-2-milhoes-de-servidores-estima-cnm-rio-teria-reducao-de-r-235-milhoes-por-ano/