Especialistas alertam: mudanças climáticas, armas nucleares e inteligência artificial nos colocam a 89 segundos do fim. Ação global urgente é necessária para evitar o colapso
O mundo está mais próximo do que nunca do apocalipse. Essa foi a avaliação alarmante divulgada nesta terça-feira (28) pelo Bulletin of the Atomic Scientists, uma organização sem fins lucrativos e publicação cujo icônico Relógio do Juízo Final vem estimando — em termos diretos de “minutos para a meia-noite” — o quão perto a humanidade está da aniquilação desde 1947.
A organização afirmou que moveu os ponteiros do relógio mais perto desse dia temido — de 90 segundos para a meia-noite para 89 segundos para a meia-noite. Ela citou as ameaças representadas por armas nucleares, mudanças climáticas e o possível uso indevido da ciência biológica e da inteligência artificial — perigos existenciais que, segundo a organização, foram agravados pela disseminação de desinformação, informações falsas e teorias da conspiração.
“Em ajustar o relógio um segundo mais perto da meia-noite, enviamos um sinal claro: como o mundo já está perigosamente perto do precipício, um movimento de mesmo um único segundo deve ser visto como um indicador de perigo extremo e um aviso inconfundível de que cada segundo de atraso em mudar de rumo aumenta a probabilidade de um desastre global”, disse o boletim em um comunicado.
O relógio é ajustado pelo Conselho de Ciência e Segurança da organização, composto por especialistas em tecnologia nuclear, segurança global, ciência climática e outros campos. O relógio foi criado em 1947, quando as preocupações da organização giravam em torno da perspectiva de uma guerra nuclear entre os Estados Unidos e a União Soviética. Na época, o relógio foi definido como sete minutos para a meia-noite.
Desde então, os cientistas por trás do projeto ampliaram seu foco para considerar outras ameaças, como mudanças climáticas, doenças infecciosas e a disseminação de desinformação impulsionada pela inteligência artificial. E os ponteiros do relógio se moveram para frente e para trás. A última mudança foi em janeiro de 2023, quando o relógio passou de 100 segundos para a meia-noite para 90 segundos, principalmente por causa da guerra na Ucrânia.
O relógio ficou mais distante da meia-noite em 1991, após os Estados Unidos e a União Soviética assinarem o Tratado de Redução de Armas Estratégicas, projetado para reduzir seus estoques de armas nucleares de longo alcance. Em resposta, o boletim moveu o relógio para 17 minutos para a meia-noite.
O relógio não mudou durante a Crise dos Mísseis de Cuba em 1962 porque “muito pouco se sabia na época sobre as circunstâncias do impasse ou qual seria o resultado”, diz o boletim em seu site.
Críticos descartaram o relógio como uma manobra baseada em avaliações subjetivas. Outros disseram que seus avisos repetidos de aniquilação total poderiam acabar sendo ignorados pelo público — o equivalente em políticas públicas ao menino que gritou “lobo”.
Mas os cientistas que ajustam o relógio o chamam de um símbolo internacionalmente reconhecido e “um lembrete dos perigos que devemos enfrentar se quisermos sobreviver no planeta”.
“O objetivo do Relógio do Juízo Final é iniciar uma conversa global sobre as ameaças existenciais muito reais que mantêm os principais cientistas do mundo acordados à noite”, disse Daniel Holz, presidente do Conselho de Ciência e Segurança e diretor fundador do Laboratório de Risco Existencial da Universidade de Chicago.
Este ano, o boletim afirmou que os líderes globais estão falhando em enfrentar as crescentes ameaças à sobrevivência humana.
Ele disse que a guerra na Ucrânia, agora em seu terceiro ano, “poderia se tornar nuclear a qualquer momento devido a uma decisão precipitada, um acidente ou um erro de cálculo”. Alertou que os controles globais de armas nucleares estão “entrando em colapso”.
E afirmou que os impactos das mudanças climáticas aumentaram no ano passado, que foi quase certamente o mais quente já registrado. O crescimento da energia solar e eólica, disse o boletim, “tem sido impressionante, mas ainda é insuficiente para estabilizar o clima”.
Em uma clara alusão ao ex-presidente Donald Trump, a organização disse: “A julgar pelas recentes campanhas eleitorais, as mudanças climáticas são vistas como uma prioridade baixa nos Estados Unidos e em muitos outros países.”
Trump assinou uma ordem executiva para retirar os Estados Unidos do Acordo de Paris, o pacto global para combater as mudanças climáticas, como parte de uma série de ações para promover combustíveis fósseis e retirar o apoio às energias renováveis.
O boletim também alertou sobre a disseminação da gripe aviária e disse que os avanços rápidos na inteligência artificial “aumentaram o risco de que terroristas ou países possam adquirir a capacidade de projetar armas biológicas para as quais não existem contramedidas”.
Apesar da perspectiva sombria, o boletim disse que ainda há uma oportunidade para o mundo se afastar da beira do colapso se os países — principalmente Estados Unidos, China e Rússia — trabalharem mais de perto para combater as mudanças climáticas, doenças e outras ameaças.
“Ainda há tempo para fazer as escolhas certas para retroceder os ponteiros do Relógio do Juízo Final”, disse Juan Manuel Santos, ex-presidente da Colômbia e ganhador do Prêmio Nobel da Paz, em uma coletiva de imprensa na terça-feira. “Na Colômbia, dizemos: ‘Cada segundo conta’. Vamos usar cada um com sabedoria.”
Por Michael Levenson para o The New York Times
Fonte: https://www.ocafezinho.com/2025/01/29/relogio-do-juizo-final-avanca-mais-um-segundo/