14 de agosto de 2025
STF mantém cobrança da Cide sobre remessas ao exterior e
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Em meio ao acalorado debate sobre o PL do streaming, que pretende taxar plataformas de vídeo sob demanda no Brasil, a Netflix sofreu um novo revés jurídico com potencial de gerar um ônus bilionário à empresa. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por 6 votos a 5, que é constitucional a cobrança da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre remessas ao exterior, inclusive quando não há ligação direta com importação de tecnologia.

A decisão mantém a validade das alterações legislativas de 2001 e 2007, que ampliaram o alcance da Cide-Royalties para incluir pagamentos relacionados a cessão e licença de uso de marcas, royalties e serviços técnicos. O julgamento, no Recurso Extraordinário (RE) 928.943, tem impacto estimado de R$ 19,6 bilhões para o governo federal nos últimos cinco anos.


Netflix na mira da tributação

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) confirmou que a Netflix é contribuinte da Cide. Em relatórios financeiros recentes, a plataforma admitiu risco de desembolsar até US$ 400 milhões anuais (cerca de R$ 2,1 bilhões) devido a litígios tributários no Brasil — valor que não está relacionado ao PL do streaming, mas que se refere a “tributos não incidentes sobre a renda”.

Diferentemente de concorrentes como Disney e Warner-Discovery, a Netflix está classificada na CNAE como “portais, provedores de conteúdo e outros serviços de informação na internet”, o que influencia a forma como é enquadrada em obrigações fiscais. Já a Disney é categorizada como “distribuição cinematográfica e de programas de TV” e a dona da HBO Max como “atividades relacionadas à TV por assinatura”.


Maioria do STF amplia alcance da Cide

A tese vencedora foi aberta pelo ministro Flávio Dino, que sustentou que a Constituição não exige que a Cide esteja vinculada exclusivamente à exploração de tecnologia estrangeira. Para Dino, basta que os recursos arrecadados sejam integralmente destinados à ciência, tecnologia e inovação, como prevê a Lei 10.168/2000. Ele foi acompanhado por Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso.

O voto divergente foi do relator, ministro Luiz Fux, que defendia restringir a cobrança apenas a contratos ligados à exploração de tecnologia, excluindo casos como royalties de direitos autorais, softwares sem transferência tecnológica e serviços administrativos. Fux foi seguido por Cármen Lúcia, André Mendonça, Nunes Marques e Dias Toffoli.


Caso Scania e repercussão geral

O processo teve origem em recurso da Scania Latin America Ltda., que contestava a cobrança sobre valores enviados à matriz na Suécia, referentes a contrato de cost sharing para pesquisa e desenvolvimento. O TRF-3 havia mantido a tributação, entendimento agora confirmado pelo STF.

A tese de repercussão geral fixada foi:

I – É constitucional a Cide destinada a financiar o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação, instituída pela Lei 10.168/2000, com alterações das Leis 10.332/2001 e 11.452/2007;
II – A arrecadação deve ser integralmente aplicada em ciência e tecnologia, nos termos da lei.


Impacto para ciência e tecnologia

A Cide é hoje a principal fonte de financiamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), responsável por 74% dos recursos destinados ao setor. Segundo a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, a decisão “assegura um instrumento capaz de gerar empregos, combater desigualdades e promover o desenvolvimento sustentável”.

Para Luiz Antonio Elias, presidente da Finep, o resultado representa “uma vitória para a soberania tecnológica do país e para a continuidade de políticas públicas estratégicas”.


Perspectivas

Com o julgamento, a Netflix e outras big techs que realizam remessas ao exterior para pagamento de royalties e licenças devem se preparar para impactos significativos em seus balanços. No cenário político, a decisão pode influenciar o andamento do PL do streaming, que busca instituir a Condecine sobre as receitas brutas das plataformas de vídeo sob demanda no Brasil.

Enquanto isso, o governo garante uma fonte robusta de recursos para pesquisa, inovação e desenvolvimento tecnológico, fortalecendo o elo entre universidades, centros de pesquisa e setor produtivo.

Fonte: https://agendadopoder.com.br/stf-mantem-cobranca-da-cide-sobre-remessas-ao-exterior-e-decisao-pode-gerar-impacto-milionario-para-a-netflix/