1 de agosto de 2025
entenda como a nova medida vai afetar o seu bolso
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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou nesta quarta-feira (30) um decreto que oficializa a imposição de tarifas de 50% sobre produtos exportados pelo Brasil. A medida, que entra em vigor no dia 1º de agosto, já causa preocupação em diversos setores da economia e deve atingir o bolso de todos os brasileiros — mesmo aqueles que não têm nenhuma relação direta com exportações. Além das consequências econômicas, a medida também traz impactos políticos profundos na relação entre Brasil e Estados Unidos, já que foram aplicadas sanções ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. Após a assinatura oficial do decreto de Trump, o documento também listou uma série de produtos que ficarão de fora da taxação, o que gerou um intenso debate sobre o tema. Afinal, trata-se realmente de um tarifaço, ou na verdade não passa de uma “tarifinha”?

Com a alta do dólar e a redução da entrada de moeda estrangeira no Brasil, os preços de diversos produtos e serviços tendem a subir, aumentando o custo de vida da população e ameaçando empregos em regiões dependentes do comércio com os EUA. Além disso, o governo brasileiro, a indústria e entidades estaduais já se mobilizam para tentar minimizar os impactos da medida. A seguir, entenda de forma clara o que muda e como isso pode afetar sua vida:

Alta do dólar e impacto no dia a dia

– A tarifa de 50% desestimula exportações brasileiras para os EUA, o que reduz a entrada de dólares no país.

– Com menos dólares circulando, o real se desvaloriza, fazendo com que a moeda americana fique mais cara.

– Como diversos produtos são cotados em dólar, a alta do câmbio encarece itens essenciais.

Produtos que devem subir de preço

Combustíveis: Gasolina e diesel, por serem derivados de petróleo cotado em dólar, devem ficar mais caros.

Alimentos: Mesmo o pão pode sofrer aumento, já que ingredientes como ferro e ácido fólico, adicionados à farinha, são importados da China e Índia.

Eletrônicos e peças: Produtos como celulares, computadores, peças de carro e eletrodomésticos vão encarecer.

Medicamentos: Muitos são fabricados com insumos importados, o que eleva o custo final.

Prejuízo bilionário no Rio de Janeiro

De acordo com levantamento da Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro) em parceria com a UFMG, o estado poderá perder até R$ 830 milhões com a aplicação da tarifa. O Rio é o segundo maior estado exportador para os EUA, atrás apenas de São Paulo.

Em 2024, o estado exportou R$ 7,4 bilhões aos americanos, principalmente petróleo bruto e aço, e importou R$ 8,9 bilhões. Só as indústrias de petróleo, gás e metalurgia empregam mais de 88 mil pessoas diretamente no estado.

48 municípios fluminenses podem ser afetados, incluindo Rio de Janeiro, Duque de Caxias, São João da Barra, Macaé e Volta Redonda.

O presidente da Firjan, Luiz Césio Caetano, se reuniu com o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, em Brasília / Divulgação

A Firjan participa de um grupo de trabalho com o governo estadual para discutir medidas. “Essa imprevisibilidade prejudica principalmente as pequenas e médias empresas”, afirmou o presidente da entidade, Luiz Césio Caetano.

CNI propõe medidas para reduzir impactos

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) também demonstrou preocupação com o tarifaço e descartou retaliações. A entidade propôs oito medidas emergenciais ao governo federal para proteger a indústria nacional:

– Linha de crédito do BNDES com juros entre 1% e 4% ao ano;

– Aumento do prazo de liquidação de contratos de exportação (de 750 para 1.500 dias);

– Prorrogação do prazo de financiamentos do comércio exterior (como PROEX e BNDES-Exim);

– Aplicação de medidas antidumping com resposta rápida;

– Adiamento de 120 dias no pagamento de tributos federais e parcelamento sem multas;

– Pagamento imediato de ressarcimentos tributários já aprovados (PIS/Cofins e IPI);

– Ampliação da alíquota do Reintegra para 3%;

– Reativação do Programa Seguro-Emprego (PSE), com melhorias.

Além disso, a CNI está organizando uma missão empresarial aos EUA para sensibilizar empresas norte-americanas sobre os prejuízos do tarifaço para ambos os lados.

Produtos isentos do aumento tarifário

Apesar da elevação generalizada para 50%, cerca de 700 produtos brasileiros foram isentos da tarifa adicional de 40% (mantendo os 10% anteriores). As isenções se aplicam principalmente a produtos destinados à aviação civil e a alguns setores específicos.

O suco de laranja está entre os produtos que não serão taxados pelos EUA / Divulgação

Exemplos de produtos isentos:

Agroindústria: castanhas-do-pará, suco de laranja, frutas processadas;

Máquinas: motores, bombas, compressores, peças industriais;

Aeronáutica: peças de aviões civis, drones, turbojatos;

Eletrônicos: monitores, baterias, roteadores;

Além destes, também estão fora da taxação itens como minérios e fertilizantes; produtos químicos e plásticos técnicos; papel, madeira tropical e móveis industriais.

Produtos já submetidos a tarifas setoriais específicas, como aço e alumínio, também não terão aumento adicional.

Parceria com os EUA é histórica — e está em risco

A relação econômica entre Brasil e Estados Unidos é sólida: os EUA são o 3º maior parceiro comercial do Brasil e o principal destino das exportações da indústria de transformação.

Hoje, existem 3.662 empresas americanas no Brasil e 2.962 empresas brasileiras nos EUA. Entre 2013 e 2023, os EUA receberam o maior número de investimentos produtivos (greenfield) brasileiros.

As exportações para os EUA geram milhares de empregos no Brasil: a cada R$ 1 bilhão exportado, são criados 24,3 mil empregos, com R$ 3,2 bilhões gerados em produção.

Lula responde: “Brasil é soberano”

Em nota oficial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva condenou as medidas anunciadas por Trump — tanto a tarifa quanto a sanção imposta ao ministro Alexandre de Moraes, do STF.

“O Brasil é um país soberano e democrático, que respeita os direitos humanos e a independência entre os Poderes. […] É inaceitável a interferência do governo norte-americano na Justiça brasileira.”

Ele manifestou solidariedade a Moraes, que foi alvo de sanções por investigar o ex-presidente Jair Bolsonaro, e criticou os políticos brasileiros que, segundo ele, “traem a pátria”.

“Justiça não se negocia”, disse Lula, destacando que a democracia depende da independência do Judiciário.

O presidente Lula defendeu a soberanoa brasileira e disse que o país não se curvará a chantagens / Divulgação

O presidente também questionou a justificativa política para as tarifas comerciais, lembrando que o Brasil tem déficit comercial com os EUA há décadas.

O governo brasileiro afirma que está disposto a negociar no campo comercial, mas sem abrir mão da soberania ou dos instrumentos legais de defesa, como a Lei de Reciprocidade Comercial.

“Nossa economia está cada vez mais integrada aos mercados globais. Já iniciamos a avaliação dos impactos e a elaboração das ações para apoiar e proteger os trabalhadores, as empresas e as famílias brasileiras”, conclui a nota.

O tarifaço imposto pelos EUA atinge em cheio a economia brasileira. Os efeitos vão muito além do comércio internacional: atingem o consumo diário, a geração de empregos, o preço dos alimentos, combustíveis e remédios. As respostas do governo, da indústria e dos estados mostram que o Brasil está se preparando para enfrentar um período de instabilidade e incerteza, buscando preservar sua economia e sua soberania.

“É um terremoto econômico”, afirma Paulo Baía

Segundo o sociólogo e cientista político Paulo Baía, colunista do Agenda do Poder, trata-se de um “terremoto econômico cujos tremores já se fazem sentir antes mesmo da implementação formal da medida”.

O anúncio das tarifas gerou uma onda de incertezas em praticamente todos os setores da economia brasileira. Da agroindústria à mineração, passando pelo setor automobilístico e pela indústria farmacêutica, empresas já suspenderam contratos, congelaram investimentos e começaram a revisar metas e compromissos. O risco-país foi elevado, o que afetou diretamente a confiança dos investidores. Para Baía, “a instabilidade se alastra como um vírus silencioso, corroendo expectativas e destruindo empregos”.

O impacto, segundo ele, vai além da economia e atinge a esfera geopolítica. A medida, considerada por Baía como um “ataque econômico”, é vista como uma ação hostil por parte de um parceiro histórico, que não apenas eleva o custo das exportações brasileiras, mas também intensifica uma escalada de tensões diplomáticas que transcende o comércio internacional.

Baía alerta que os efeitos financeiros são profundos e estruturais. A moeda nacional já dá sinais de desvalorização, enquanto os juros sobem em resposta à crescente percepção de risco. O ambiente político volátil e a sensação de submissão a interesses externos afastam os investidores estrangeiros. O setor agrícola, especialmente dependente do mercado norte-americano, projeta perdas bilionárias que afetam tanto grandes exportadores quanto pequenos produtores.

A indústria nacional, enfraquecida por anos de desmonte das políticas de fomento, perde ainda mais competitividade e acesso ao maior mercado consumidor do mundo.

“A consequência direta disso é o aumento da desigualdade social, o aprofundamento da pobreza e a destruição de mecanismos de inclusão que já eram frágeis”, afirma o sociólogo. Para ele, o Brasil se vê, mais uma vez, “submetido à lógica assimétrica do sistema internacional, onde as regras do jogo mudam ao sabor das conveniências dos mais poderosos”.

Entretanto, o que mais agrava o cenário é o componente político embutido na decisão. A imposição tarifária veio acompanhada de uma exigência direta: que o Supremo Tribunal Federal interrompa o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de seus aliados, acusados de atentar contra o Estado Democrático de Direito durante a tentativa de golpe de 8 de janeiro. Para Baía, trata-se de uma “chantagem econômica”.

Além disso, os Estados Unidos tomaram uma medida sem precedentes nas relações bilaterais: incluíram o ministro Alexandre de Moraes, relator de investigações contra Bolsonaro no STF, na lista de sanções da Lei Magnitsky Global — mecanismo utilizado para punir indivíduos envolvidos em violações de direitos humanos e corrupção. Moraes teve seus bens eventualmente bloqueados em território norte-americano, está proibido de realizar transações financeiras nos EUA e impedido de entrar no país.

Baía classifica essa ação como uma “violação frontal da soberania do Judiciário brasileiro” e “uma interferência sem precedentes em assuntos internos de um país soberano”. Ele avalia que o gesto tem como objetivo deslegitimar instituições que operam dentro dos princípios constitucionais da República Federativa do Brasil.

As consequências políticas, segundo o cientista político, são devastadoras. Ao sancionar um ministro da mais alta corte do país, os Estados Unidos rompem com uma tradição diplomática de mais de dois séculos baseada no respeito institucional e no diálogo. O Brasil, defensor histórico do multilateralismo, agora se vê diante de uma “diplomacia coercitiva”, que ameaça sua independência e o coloca diante de uma escolha crítica: ceder à pressão externa ou afirmar sua soberania, mesmo sob o risco de repercussões geopolíticas imprevisíveis.

Para Baía, a ofensiva contra o STF se insere em um contexto mais amplo de deterioração das normas internacionais e do uso crescente da força como instrumento de influência política.

“A tentativa de interferir nos julgamentos de um tribunal constitucional é, além de um ataque jurídico, um gesto político que visa enfraquecer a democracia brasileira”, adverte.

Diante dessa conjuntura, o sociólogo defende uma resposta firme por parte do Brasil.

“Neste momento crítico, o país deve responder com firmeza, inteligência e dignidade. Não há economia forte sem justiça soberana, não há política sólida sem instituições respeitadas, não há futuro possível sem autonomia nacional”, afirma.

Para ele, condicionar o desenvolvimento do país à impunidade de um ex-presidente acusado de crimes graves é uma afronta direta aos pilares da Constituição de 1988. Mais do que um embate entre governos, trata-se, em sua visão, de uma disputa por valores. “Ou o Brasil se curva a um modelo de dependência e vassalagem, ou reafirma seu lugar no mundo como nação livre, justa e comprometida com a verdade dos fatos e com a justiça das leis.”

Mesmo com mais de 200 anos de relações diplomáticas com os Estados Unidos, Baía conclui:

“A dignidade de um povo é um valor que não se mede pelo tempo, e sim pela coragem de mantê-la intacta, mesmo quando o preço é alto e a pressão esmagadora.”

Fonte: https://agendadopoder.com.br/tarifaco-dos-eua-entenda-como-a-nova-medida-vai-afetar-o-seu-bolso-e-a-economia-brasileira/