9 de outubro de 2025
“As pessoas do fado morrem, geralmente, de amor, morre-se muito
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O novo álbum de Carminho, “Vou Morrer de Amor ou Resistir”, a sair na sexta-feira, inclui poemas de Ana Hatherly e Amália e contou com a participação de nomes como Laurie Anderson e Mário Laginha.

Em declarações à agência Lusa, a fadista afirmou que o título do disco é ambíguo e “aborda várias questões, a ambiguidade que uma pessoa pode ter nas suas certezas, que as não há, não existem, mas também esta harmonia com os temas do fado”.

“As pessoas do fado morrem, geralmente, de amor, morre-se muito de amor no fado, mas poder resistir é algo que me interessa e me interessa cantar”, acrescentou.

Para este álbum, Carminho musicou “Balada do País que Dói” e “Saber”, dois poemas de Ana Hatherly (1919-2015), que a intérprete apontou como “uma artista fabulosa, supercompleta, do ponto de vista da multidisciplinaridade que trabalhou e a experimentação que fez”.

Referindo-se a “Balada do País que Dói”, Carminho disse: “Este poema já vinha muito habitado por música, por aquela cadência […] e trouxe-me, musicalmente, essas ideias de repetição e de mantra”.

Carminho apresentou-se como autora, logo no seu álbum de estreia, “Fado” (2011), mas reconhece que essa faceta, e também a de compositora, “é agora mais notada”.

Neste álbum assina sete composições, entre elas “Sofrendo da Alma”, de Amália Rodrigues (1920-1999), e “Canção à Ausente”, de Pedro Homem de Mello (1904-1984).

À Lusa, afirmou “gostar muito de fazer composições sobre fado tradicional” e também “escrever para fados tradicionais”, citando “O Quarto”, que escreveu para o Fado Pajem, de Alfredo Marceneiro, do seu álbum “Portuguesa” (2023).

Carminho afirmou que “é uma necessidade” trabalhar muito os fados na procura de soluções: “Por exemplo, pode acontecer precisar de um decassílabo, em tom maior, mais rápido. Há, às vezes, essas necessidades que os fadistas têm, e eu acho muito interessante haver essa liberdade para a composição de fados tradicionais”.

Para a criadora de “Trazes-me Tanta Saudade”, “o fado é um instrumento, um meio para traduzir bem o sentimento de um fadista, aquilo que são os seus discursos, os seus pensamentos, sempre foi assim”.

Carminho fez uma retrospetiva fadista e referiu os contributos de Amália Rodrigues “que trouxe novos poetas para o fado”, Alfredo Marceneiro que compôs para si e Maria Teresa de Noronha que começou “a estilar nas melodias do [Fado] Menor, do Corrido e do Mouraria, criando melodias que se fixaram com novos nomes, isto é, melodias originais”.

“Eu acho que o fado sempre foi muito plástico e uma língua viva, e que está viva”, atestou a fadista, afirmando “não perceber muito bem o simplismo das análises sobre o fado”.

“O fado pode ser simples, pode ser complexo, tem a ver com a maneira como o fadista o quer trabalhar, e assim as temáticas vão-se trabalhando e também se pode trazer novas temáticas ao fado. Uma das características mais brilhantes do fado é usarmos o seu material e renová-lo, e fazer estas ligações com elementos dos cânones do fado e combiná-los, mesmo os instrumentos”.

Carminho defendeu a liberdade de um fadista trabalhar o fado, mas realçou que este “nutre-se dos clássicos, da história do fado para se poder expressar”.

Para Carminho, “Eu Vou Morrer de Amor ou Resistir” surge “na continuidade dos dois anteriores álbuns”, “Portuguesa” (2023) e “Maria” (2019), nos quais “surgiram várias perguntas, e necessidade de explorar e experimentar em estúdio, algumas regiões de som que o fado, ou pelo menos os discos anteriores não tinham”.

Neste álbum conta com o ‘cristal Bachet’, instrumento desenvolvido em 1952 pelos franceses Bernard e François Bachet e o ‘ondes Martenot’, criado em 1928 por Maurice Martenot.

Estas escolhas são justificadas pela sua vontade de “explorar coisas novas” que se propõe em cada álbum.

Uma escolha, já habitual nos seus álbuns, é a inclusão de uma marcha popular, sendo que neste álbum interpreta a Grande Marcha de Lisboa de 1935, “Lá Vai Lisboa” (Norberto Araújo/Raul Ferrão), uma criação de Beatriz Costa.

“Eu adoro cantar marchas, acho que é um género maior da música portuguesa, não por toda a cultura que está latente na criação das marchas, que tem a ver com esta ideia de gerações e gerações que se juntam, mais novos e mais velhos, fora do seu âmbito profissional, e poderem vibrar pelo seu próprio bairro, e uma ideia de pertença, e também a forma como surgem novas composições, a cada ano, e os temas”, afirmou.

“Sou bastante apaixonada por marchar e adoro cantá-las. É uma grande festa”, sublinhou.

Outra colaboração é com o pianista Mário Laginha, na canção “Dia Cinzento”, que se trata “de uma canção distante da forma do fado, não tem a estrutura de um fado tradicional”, que a levou a imaginar de imediato o piano de Mário Laginha, tendo sido “uma honra” para a fadista poder contar com “um artista superior” como é o pianista.

Sobre a participação da norte-americana Laurie Anderson, Carminho referiu-se à cantora e cineasta como “uma das melhores artistas do mundo, que é incontornável”, com quem Carminho partilha a interpretação de “Saber”, “um poema que foi escrito na mesma altura que a Laurie Anderson iniciava o seu trabalho de exploração e experimentação”.

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Fonte: https://comunidadeculturaearte.com/as-pessoas-do-fado-morrem-geralmente-de-amor-morre-se-muito-de-amor-no-fado-mas-poder-resistir-e-algo-que-me-interessa-e-me-interessa-cantar-sublinha-carminho/