No passado dia 30 de Maio, a Aula Magna foi palco de uma peculiar defesa de tese de doutoramento. Foi diferente de tantas outras que já decorreram naquele espaço da capital portuguesa em vários sentidos. Primeiro, porque foi levada a cabo por mais do que uma pessoa: os BADBADNOTGOOD (BBNG) — trio composto pelo baterista Alexander Sowinski, o baixista Chester Hansen e o guitarrista e saxofonista Leland Whitty — subiram a palco acompanhados pelo percussionista Juancarlos Magallanes, por Felix Fox nas teclas e por Kae Murphy no trompete. Segundo, foi provavelmente a única tese de doutoramento esgotada a ocorrer no edifício. Não é de estranhar tendo em conta o substancial trabalho na área que os BBNG já apresentaram. Desde 2011 que a banda tem demonstrado inovação com a sua música instrumental inspirada no jazz e de comunhão com outros géneros como o hip hop. E em terceiro lugar, porque o público era convidado a vibrar com os candidatos a doutorados, coisa que fez efusivamente durante toda a apresentação.
Depois de uma calorosa ovação inicial e uma entrada em palco musicada, o sexteto aninhou-se em palco com Sowinski ao leme das boas-vindas. Foi o baterista quem fez a ponte entre a banda e os fãs durante todo o concerto, introduzindo o espectáculo enquanto a atmosfera convidativa de “Eyes On Me” se começava a instalar com descontracção e se fundia com as suas palavras. Falava de uma experiência audiovisual enquanto projecções de película se desenrolavam atrás da banda, em sintonia com a música de baixo possante e guitarra agradavelmente estridente. Sowinski pediu ao público para se levantar, para se juntar à festa que se iniciava a bom ritmo com “Take Me With You”. Com o público de volta aos lugares, o grupo prosseguiu a dissertação com “Weird & Wonderful”, o terceiro tema tocado naquela noite que faz parte do novo álbum da banda, Mid Spiral. O projecto foi lançado como três EPs separados: Chaos, Order e Growth. E depois de uma amostra caótica do novo álbum da banda, estava na altura de voltar até ao passado.
“Confessions” trouxe a energia do discretamente majestoso álbum III para o palco, com o solo tenso de saxofone a ser escutado de forma expectante. A viagem pela discografia de BBNG continuou com a adequada “Confessions Part II”, que surgiu da música anterior numa transição sem espinha e com direito a solos entrelaçados de saxofone e trompete que foram recebidos de forma avassaladora pelo público. Em “Unfolding”, decidiram abrandar o ritmo: começou por se ouvir Leland Whitty a “cantar” com o seu saxofone, enquanto no ecrã se viam ondas que pareciam mover-se ao som da voz metálica que enchia a sala, um momento mais intimista que permitiu desacelerar a actuação. Mas felizmente que os momentos mais recatados foram discretos e bem colocados, porque a energia dos BBNG é para ser celebrada com fervor. Em “Juan’s World”, Sowinski pediu novamente ao público para se levantar e o ritmo quente das congas de Juancarlos Magallanes incitava a que todos obedecessem de bom grado. As temperaturas continuaram a subir com a ginga tropical de “Sétima Regra” antes do incisivo balde de água fria que é “Lavender” quebrar o calor que a antecedeu. Os seus graves ameaçadores fizeram estremecer o chão e à terceira já não foi preciso pedir: o público levantou-se instintivamente e saltou no final efusivo daquele que é um dos grandes temas da carreira dos BBNG.
“Last Laugh” e o seu solo esperançoso de guitarra a rasgar terminaram o espectáculo com uma grande energia em palco, correspondida por largos e intensos assobios de um público rendido a uma demonstração do poderio instrumental de BBNG. Imploraram a bons pulmões por um encore, e não foi preciso esperarem muito tempo até que o pedido fosse concedido: “Chocolate Conquistadors” iniciou a recta final com grande destaque para Félix Fox nas teclas, nesta canção que o grupo toca frequentemente e é um tributo ao inventivo rapper MF DOOM, campeão do underground que faleceu em 2020. Depois do tema acabar, eram poucos os que resistiam a estar de pé. A destreza e perícia do grupo esteve presente durante todo o concerto mas especialmente na apoteótica a expansiva “Cs60”. Progressiva e bem encadeada, o tema foi uma conclusão digna de um concerto explosivo, um festim para os ouvidos e para os pés.
No final, podia ler-se projecto no ecrã “Obrigado por compartilhar esta música connosco”. Esta defesa de tese foi meramente simbólica. Aquela noite foi uma celebração de uma obra sonora de um grupo que já provou incontáveis vezes que sabe o que está a fazer. Com o passar dos anos, vão reinventando a sua abordagem musical sem nunca perderem a sua essência. Mas está mais provado e sabido que os BADBADNOTGOOD são doutores da boa groove. E naquela noite não foi excepção.
Fonte: https://comunidadeculturaearte.com/badbadnotgood-na-aula-magna-doutores-da-boa-groove/