9 de dezembro de 2025
Tarcísio estrangula Metrô e CPTM para garantir lucro das linhas
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Concessionárias privadas ficaram com 88% dos recursos do Bilhete Único, enquanto as estatais, que transportam mais, recebem centavos por usuário

Levantamento realizado pelo portal Plamurb revela o verdadeiro assalto contra o Metrô e a CPTM realizado pelo governo de São Paulo com o objetivo de garantir gigantescas margens de lucro às linhas que foram privatizadas. De R$ 2,8 bilhões destinados às linhas de metrô e trens da cidade, somente R$ 335 milhões ficaram com as empresas estatais, enquanto os outros R$ 2,458 bilhões abasteceram os cofres privados que, inclusive, transportam menos passageiros.

A análise tem como base os recursos do repasse do Bilhete Único, gerido pela Prefeitura de São Paulo, para o transporte sobre trilhos, administrado pelo governo Tarcísio de Freitas. Em 2024, o Bilhete Único movimentou R$ 6,9 bilhões e, desse total, R$ 2,8 bilhões foram destinados ao sistema sobre trilhos. E, mesmo assim, Metrô e CPTM ficaram com menos de 5% desse valor. 

Os números são oficiais e foram obtidos pelo Plamurb, canal dedicado à mobilidade urbana no Estado de São Paulo, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). Para conseguir os dados, o autor do estudo, Thiago Silva, recorreu à SPTrans, Metrô, CPTM e Artesp — e, no caso das concessionárias, algumas respostas só vieram após recursos, diante de inconsistências, segundo o veículo.

O convênio do Bilhete Único estabelece uma Câmara de Compensação: toda a arrecadação é reunida e distribuída entre os operadores, públicos e privados, conforme regras contratuais. E é justamente nesse ponto que aparece o grande problema. Pelas regras criadas pelo governo paulista, as operadoras privadas têm prioridade no saque. Retiram primeiro suas cotas, baseadas na chamada “tarifa contratual” — um valor muito superior à tarifa pública paga pelo usuário na catraca. O que sobra — se sobrar — vai para Metrô e CPTM.

O resultado é um desequilíbrio tão grotesco quanto calculado. A ViaQuatro (Linha 4-Amarela) recebeu sozinha R$ 1,03 bilhão, quase cinco vezes mais que o Metrô. As operadoras privadas ficaram com 88% de todos os recursos destinados ao transporte sobre trilhos. O Metrô, que transporta mais que qualquer concessionária, ficou com apenas R$ 219 milhões. A CPTM, responsável pela mobilidade de toda a Região Metropolitana, recebeu R$ 116 milhões. E, quando se observa a tarifa média por passageiro, o absurdo se torna ainda mais claro: ViaQuatro, R$ 5,19 por usuário; Metrô, R$ 0,59; CPTM, R$ 0,72. 

Divisão da receita do Bilhete Único no transporte sobre trilhos- Foto: Thiago Silva/Operadores

Como resume a Fenametro (Federação Nacional dos Metroferroviários), “quem mais transporta recebe menos; quem menos transporta recebe dez vezes mais”.

Segundo a federação, “esse desequilíbrio não é técnico. É ideológico, é contratual, é intencional. O governo criou um modelo para garantir rentabilidade privada enquanto estrangula as estatais”. Os dados provam. Metrô e CPTM transportam mais gente, cobrem uma rede maior, têm mais estações, mais funcionários e custos gerais maiores — e, mesmo assim, recebem a menor fatia do BU. Ainda assim, mesmo somando toda a receita tarifária (BU + TOP), suas tarifas médias seguem menores do que as das concessionárias privadas.

LINHA AMARELA

A Linha 4-Amarela é o exemplo acabado do modelo: menor extensão, menos estações, alto grau de automação, menos funcionários. Seria a mais barata de operar — mas é a que mais suga recursos. “Menor custo operacional + tarifa contratual mais alta = lucro garantido para o privado; maior demanda + tarifa menor = sufocamento das estatais”, afirma a Fenametro. Quando as concessionárias enfrentam falhas, que se multiplicaram nos últimos anos com incêndios, quebras e descarrilamentos, o governo rapidamente aponta o dedo para as estatais, criando falsos argumentos para justificar novas privatizações.

E elas já estão contratadas. Em 2025, entrou a TIC Trens. Em 2026, virão Acciona (Linha 6-Laranja) e Trivia Trens (Linhas 11, 12 e 13). Todas com garantias robustas, tarifas contratuais altas e prioridade no fluxo da Câmara de Compensação. A pergunta feita pelo Plamurb é óbvia: quando todas quiserem sacar primeiro, de onde virá o dinheiro? A resposta, diz a Fenametro, também é óbvia: “o povo de São Paulo, com tarifas mais altas, serviços mais precários e mais dinheiro público socorrendo empresas privadas ‘superavitárias’”.

Mesmo com os repasses reduzidos ao mínimo, Metrô e CPTM continuam entregando mais do que todas as concessionárias. E isso incomoda o projeto privatista. O governo paulista, admitindo o desequilíbrio, passou desde 2022 a repor parte das perdas das estatais — com recursos do Tesouro, ou seja, dinheiro público. Mas, politicamente, é mais conveniente manter a desculpa esfarrapada de que as concessionárias são superavitárias e as estatais deficitárias, do que assumir que o Estado subsidia empresas privadas. Na Assembleia Legislativa, o governo tentou relativizar o problema dizendo que “repassa depois”.

A própria comparação ampla confirma a distorção: quando se divide toda a receita tarifária real — e não apenas o BU — pelo total de viagens, Metrô e CPTM seguem com tarifas médias menores do que qualquer linha privatizada. Em outras palavras, são as empresas públicas que sustentam a operação pesada, com maior rede e maior demanda, extraindo o máximo de cada real investido enquanto as concessionárias operam em condições muito mais vantajosas.

Como conclui a Fenametro, “o desmonte do transporte sobre trilhos em São Paulo não é uma tragédia inevitável. É um projeto consciente de transferência de riqueza pública para o bolso de concessionárias privadas”. É a escolha política de um governo que governa para os empresários, não para o povo, e que entrega patrimônio público enquanto esconde quem paga a conta: os milhões de trabalhadores que dependem diariamente do transporte sobre trilhos.

Fonte: https://horadopovo.com.br/tarcisio-estrangula-metro-e-cptm-para-garantir-lucro-das-linhas-privatizadas/