Na abertura da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva definiu a COP30, que será realizada em novembro, em Belém, como a “COP da Verdade”. A expressão marca um teste de coerência diante da emergência climática: não há mais espaço para promessas vagas ou metas distantes. Mas a verdade, no Pará, vai estar à mesa.
Pela primeira vez, uma conferência do clima terá comida de verdade: ficou determinada a obrigação de incluir ao menos 30% da alimentação proveniente da agricultura familiar nas zonas oficiais. Ou seja, os participantes da COP30 terão à disposição refeições mais saudáveis e diversas, e não apenas fast food, como em edições anteriores. Desde agosto, o edital da Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI) prevê que os cardápios priorizem ingredientes locais, sazonais e de base sustentável. A regra pode injetar ao menos R$ 3,3 milhões na economia da Região Metropolitana de Belém — o que equivale a quase 80% do orçamento anual do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) no município.
Não é pouco. Esse dinheiro pode representar renda para milhares de famílias e o fortalecimento de cooperativas. É reconhecimento de práticas que respeitam a floresta e saberes ancestrais. Encurta o caminho entre o campo e a cidade.
Para viabilizar a proposta, foi realizado um mapeamento detalhado das cooperativas e associações locais do Pará, identificando o volume de produção, os tipos de alimentos disponíveis e a capacidade de distribuição. O estudo identificou 80 grupos produtores, entre associações e cooperativas, e cerca de 8 mil famílias da agricultura familiar aptas a fornecer alimentos para a conferência.
Há muito mais produção além dessas 8 mil famílias — este foi apenas um primeiro mapeamento para demonstrar isso. A diversidade de produtos e produtores no Pará é capaz de fornecer muito além da meta mínima estabelecida no edital. O desafio é coordenar logística, armazenagem e transporte, garantindo regularidade e qualidade no abastecimento durante a cúpula. Nesse sentido, a COP30 pode funcionar como laboratório para aprimorar compras públicas e fortalecer a conexão entre oferta local e grandes demandas.
A COP30 busca deixar um legado de políticas públicas, mostrando que é possível alinhar alimentação e clima. Todo o processo seguirá as diretrizes do Guia Alimentar para a População Brasileira, respeitando as culturas alimentares da região. A expectativa é inspirar políticas que fortaleçam a agricultura familiar após a conferência e influenciem futuras COPs a alinhar cardápios ao debate.
Alimentação sustentável não é apenas uma questão de saúde. É ferramenta contra as mudanças climáticas e vetor de inclusão econômica. Trazer a agricultura familiar para o centro da COP30 mostra que outro modelo de produção é possível e necessário. Reforça que soluções climáticas envolvem justiça social, renda e reconhecimento de quem vive e trabalha na floresta.
Existe uma conexão direta nessa equação. Dados revelam que 74% das emissões de gases de efeito estufa no Brasil estão ligadas à produção de alimentos — em especial pela agropecuária e pelo desmatamento. Globalmente, essa proporção é de cerca de 30%. Ao priorizar sistemas agroecológicos e comprometidos com a biodiversidade, a COP30 sinaliza que a cadeia alimentar pode ser parte da solução. Comer é um ato político que apoia a transição para um futuro de baixo carbono.
Oferecer uma alimentação local, nutritiva e sustentável durante a conferência é um passo para valorizarmos quem protege a floresta e produz com base em saberes ancestrais. Também pode transformar a Região Metropolitana de Belém em exemplo de priorização da agricultura familiar nas políticas de abastecimento. O legado pode se consolidar em planejamento contínuo, contratos de compra, assistência técnica e melhorias logísticas.
Se a COP30 será, como Lula prometeu, a “COP da Verdade”, o cardápio antecipa um dos caminhos possíveis. A comida de verdade, produzida de forma sustentável e com protagonismo da agricultura familiar, pode ir além da refeição servida nos intervalos: tornar-se agenda permanente de dignidade no campo, soberania alimentar e combate à crise climática. A mesa de Belém é, afinal, a mesa do Brasil: diversa e capaz de apontar um futuro em que desenvolvimento e sustentabilidade caminham juntos.
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Fonte: https://oimparcial.com.br/brasil/2025/10/a-cop-da-verdade-com-comida-de-verdade/
