
Em Paço do Lumiar, mais precisamente na comunidade da Maioba, a tradicional manifestação cultural do bumba meu boi ganha novos significados, nas mãos de alunos e educadores. Tal perspectiva foi observada pela professora e mestra em História Social pela Universidade Federal do Maranhão (Ufma), Marivânia Melo Moura, na pesquisa “Auto do bumba meu boi como resistência na comunidade da Maioba”. A proposta é transformar e ressignificar o olhar dos adolescentes, sobre suas próprias origens culturais.
De acordo com os relatos da pesquisadora, o processo de apuração, que contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (Fapema), apareceu após uma inquietação pedagógica. Durante as aulas de História do Brasil Colonial, ela percebeu que muitos estudantes da escola Ribeiro do Amaral – que fica ao lado do barracão do Boi da Maioba e onde o estudo foi aplicado – evidenciavam certo distanciamento pelas contribuições culturais de negros e indígenas.
“Nas aulas, notei que boa parte dos jovens daquela comunidade tinha certo desprezo pela herança cultural de negros e indígena. Isso me preocupou profundamente”, conta a professora Marivânia Moura. A partir de uma visita cultural ao Centro de Criatividade Odylo Costa, filho, no Centro Histórico de São Luís, ao passarem no trajeto, alguns estudantes expressaram orgulho ao gritar: Aqui é a Maioba! O grito espontâneo serviu de alerta para professora, ressaltando que ali havia um sentimento de pertencimento, um vínculo com a cultura local que poderia ser utilizado pedagogicamente.
“Eu observei que ali tinha um orgulho, uma identidade cultural. E pensei que, se todos tivessem uma aproximação com a brincadeira do bumba meu boi, talvez houvesse menos rejeição, menos preconceito com as manifestações culturais de origem indígena e africana”, relata.
O estudo se aprofundou na simbologia do auto do bumba meu boi, identificando-o como uma expressão cultural de resistência das populações historicamente subalternizadas pelo sistema colonial, escravocrata e patriarcal. Ao pesquisar e revisitar o enredo do boi – com seus personagens, música, dança e indumentárias -, os alunos entraram em uma narrativa rica de conflito cultural.
“A história da sociedade maranhense existe muito antes da chegada dos europeus à Ilha de Upaon-Açu. Os povos indígenas têm uma história a ser contada, e os africanos se rebelaram contra a condição de escravizados, de várias formas. Neste contexto, o auto do bumba meu boi se apresenta como uma dessas muitas formas de resistência”, destaca Marivânia Moura.
Entre os objetivos alcançados pela pesquisa, destaca-se a transformação do contexto escolar. A abertura do currículo para histórias marginalizadas possibilitou o surgimento de uma identidade cultural mais diversa, inclusiva e democrática.
“Quando damos visibilidade ao protagonismo das culturas indígenas e africanas, mostramos que há outras formas de contar a história. A supremacia da história europeia nos currículos escolares apenas reforça preconceitos sociais, raciais e de gênero”, analisa Marivânia Moura.
Conhecimento, pertencimento e valorização
Ao decorrer da formulação do estudo, foram feitas oficinas de cultura popular, dança dos caboclos de pena, bordado das indumentárias e de fotografia. A pesquisa possibilitou ainda que os estudantes visitassem espaços culturais, como o Museu Cafua das Mercês, ampliando o contato com a história afro-indígena da região.
A pesquisa caracteriza o valor do bumba meu boi como expressão cultural e mostrou que a educação pode ser um espaço real de emancipação e pertencimento. “Foi emocionante ver os alunos descobrindo a própria história, reconhecendo suas raízes. Eles aprenderam sobre o passado e puderam perceber o quanto essas culturas continuam vivas, afirmando sua potência de vida e de luta. Ou seja, aquele grito de orgulho, agora ecoa ainda mais forte entre os muros da escola”, destaca a pesquisadora.
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Fonte: https://oimparcial.com.br/noticias/2025/06/auto-do-bumba-meu-boi-destaca-resistencia-e-identidade-cultural-entre-estudantes-na-regiao-da-maioba/