O rastro de fumaça que se dissipou sobre o Atlântico na noite desta segunda-feira (22) levou consigo muito mais do que combustível e metal. A destruição do foguete HANBIT-Nano, da sul-coreana Innospace, representou o fim prematuro de oito cargas úteis que materializavam anos de desenvolvimento científico brasileiro e internacional. Onde se esperava receber os primeiros sinais de telemetria orbital hoje pela manhã, restou apenas o silêncio dos monitores.
A perda é um golpe duro para a comunidade acadêmica e para o setor privado de tecnologia espacial, que viam na missão “Operação Spaceward” uma chance rara de validar tecnologias em ambiente real.
A bordo do veículo de 22 metros viajavam experimentos que não podem ser simplesmente “recomprados” na prateleira. O destaque mais doloroso para a ciência nacional é a perda dos equipamentos da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). A instituição havia integrado ao foguete dois nanossatélites (CubeSats) desenvolvidos com foco educacional e de validação tecnológica.
Para estudantes e pesquisadores da UFMA, o lançamento não era apenas um teste, mas a culminação de teses de doutorado e projetos de iniciação científica que buscavam provar que o Maranhão pode produzir tecnologia espacial, e não apenas ceder o território para esse tipo de atividade.
Além da academia, o setor privado brasileiro também sofreu um revés técnico significativo. A empresa Castro Leite Consultoria (CLC) perdeu dois equipamentos considerados cruciais, que estavam a bordo para qualificação em voo: um receptor GNSS (Sistema Global de Navegação por Satélite) de alta precisão e um sistema de Navegação Inercial (INS).
A validação desses componentes era um passo essencial para a autonomia tecnológica do Brasil em sistemas de guiagem, uma área sensível e de alto valor agregado. A destruição do material impede que a empresa obtenha o chamado “space heritage”, selo que comprova que um equipamento foi testado em ambiente espacial e que é fundamental para competir no mercado global.
A falha também atingiu parceiros internacionais. A startup indiana Grahaa Space perdeu seu nanossatélite demonstrador, que seria o primeiro de uma constelação projetada para transmitir vídeos da Terra em alta definição e quase em tempo real. O colapso do veículo adia os planos da empresa de entrar no mercado de streaming de dados orbitais.
Também foram perdidos três dispositivos experimentais não separáveis, que permaneceriam presos ao estágio superior do foguete, além de uma carga simbólica da marca coreana BREWGURU, totalizando as oito cargas declaradas no manifesto da missão.
Embora os valores exatos de seguro e desenvolvimento sejam protegidos por cláusulas de confidencialidade industrial, estimativas apontam que o desenvolvimento das cargas úteis, somado aos custos de integração e logística, ultrapassa a casa dos milhões de reais em investimento intelectual e material direto.
“Satélites podem ser reconstruídos, mas o tempo da janela de oportunidade e os dados que deixaram de ser coletados hoje são irrecuperáveis a curto prazo”, comentou um engenheiro ligado à operação, que pediu anonimato enquanto as investigações da Innospace e da Força Aérea Brasileira (FAB) seguem em andamento.
Alcântara amanhece com a base intacta, mas com seus laboratórios parceiros vazios. A ciência brasileira, mais uma vez, é chamada a exercer sua virtude mais testada: a resiliência.
Fonte: https://oimparcial.com.br/noticias/2025/12/destruicao-do-foguete-hanbit-nano-aniquila-experimentos-de-ponta-da-ufma-e-setor-privado/
