19 de dezembro de 2024
Força-tarefa resgata 14 trabalhadores submetidos a trabalho análogo à escravidão
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O Ministério Público do Trabalho do Rio de Janeiro (MPT-RJ) e a Auditoria-Fiscal da Superintendência Regional do Trabalho no estado resgataram 14 trabalhadores em situação análoga à escravidão no Rock in Rio deste ano.

A força-tarefa, criada em setembro, responsabilizou diretamente a empresa Rock World S.A, organizadora do evento, pela situação dos trabalhadores, em razão da negligência na fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista. A empresa nega as acusações. 

Nesta última quarta-feira (18), em uma coletiva de imprensa, os procuradores do MPT informaram que os resgates tiveram início em 22 de setembro deste ano, como parte de uma fiscalização para verificar se os expositores, comerciantes e contratantes de músicos estavam cumprindo as obrigações trabalhistas.

As investigações apuraram trabalho análogo à escravidão em decorrência das condições degradantes do alojamento, da jornada exaustiva e de trabalho forçado.

De acordo com o MPT, as vítimas trabalhavam como carregadores de grades, caixas de equipamentos, iluminação, bebidas, barricadas, brindes e estruturas metálicas, além de atuarem na montagem e na limpeza dos espaços.

Os trabalhadores haviam sido contratados com a promessa de receber diárias entre R$ 90 e R$ 150, conforme a quantidade de horas trabalhadas. No entanto, os valores prometidos não foram integralmente pagos. Muitos dobraram jornadas por vários dias consecutivos na tentativa de aumentar seus ganhos, chegando a trabalhar até 21 horas em um único dia, com apenas três horas de descanso antes de retomar o serviço. Mesmo assim, muitos ficaram sem receber a remuneração devida.

A ação teve início após indícios de que trabalhadores da empresa contratada pela organizadora do evento estavam pernoitando no escritório da empresa, localizado dentro do festival, na Arena de Tênis do Parque Olímpico, e realizando jornadas consecutivas.

Na madrugada de 22 de agosto, Auditores-Fiscais do Trabalho estiveram no local e encontraram 14 trabalhadores dormindo precariamente na base da empresa. Eles estavam deitados sobre papelões, sacos plásticos e lonas, alguns usando cobertores, o que evidenciava um planejamento prévio para permanecerem no local durante a noite.

Foto: Ministério do Trabalho e Emprego

Algumas das trabalhadoras resgatadas relataram que, devido à ausência de chuveiros, precisavam improvisar banhos de canequinha no banheiro feminino do escritório. Para garantir privacidade, elas retiravam a maçaneta da porta do sanitário, evitando a entrada de homens no local.

A equipe de fiscalização do Trabalho relatou que os trabalhadores permaneciam no local após o término das escalas durante a madrugada para “dobrarem”, ou seja, iniciar novas jornadas na manhã seguinte, mesmo após já terem trabalhado mais de 12 horas. “Há registros de trabalhadores que atuaram por dias consecutivos sem retornar para casa, com intervalos de apenas três horas entre as jornadas, começando às 8h, trabalhando até as 5h da manhã seguinte e reiniciando às 8h do mesmo dia”, destacou a equipe.

Os trabalhadores também relataram que utilizavam o banheiro do andar para sua higiene pessoal e tomavam banho no banheiro do térreo da Arena, localizado no vestiário do equipamento esportivo olímpico, cedido e supervisionado pela organizadora do festival.

Durante a fiscalização, a equipe constatou que o banheiro do andar apresentava condições precárias, com roupas espalhadas e penduradas, urina no chão e outras irregularidades que evidenciavam a falta de manutenção e higiene no local.

O auditor-fiscal do Trabalho, Raul Capparelli, que integrou a operação, destacou: “Ao encontrarmos os trabalhadores dormindo precariamente sobre lonas e papelões, percebemos o extremo cansaço deles, tanto que foi difícil acordá-los para as entrevistas.”

A empresa Rock World negou as acusações de trabalho escravo e disse que o MPT e os auditores-fiscais “lançaram sérias acusações contra a Rock World, de maneira precipitada, desrespeitando o direito constitucional ao contraditório, ampla defesa e presunção de inocência, já que os fatos ainda estão sob o crivo de um processo administrativo recém iniciado”.

De acordo com a empresa, nenhuma alegação foi comprovada. Além disso, a Rock World ainda afirmou que o episódio envolve apenas trabalhadores de uma empresa terceirizada chamada “Força Bruta”.  

Histórico da empresa

O resgate de trabalhadores em condições análogas à escravidão no Rock in Rio não é inédito. Em 2013, 93 trabalhadores foram resgatados em uma empresa terceirizada do setor de fast food. Na ocasião, a empresa cobrava pelo credenciamento, atraindo trabalhadores de diversas regiões e forçando-os a arcar com passagens, hospedagem e ingressos.

Os trabalhadores eram alojados em comunidades próximas e passavam noites ao redor do evento, sem garantias de alimentação, água ou descanso, com retenção de documentos. Em 2015, 17 trabalhadores também foram resgatados, com jornadas exaustivas e alojamento precário, além da retenção de documentos e falta de pausas, alimentação e hidratação.

Diferentemente dos casos anteriores, em 2024, a empresa organizadora do festival foi responsabilizada diretamente pela exploração de trabalho escravo, devido às condições a que foram submetidos os trabalhadores da produção, como carregadores.

Para Thiago Gurjão, Procurador do Trabalho responsável pelo inquérito, “não é possível tolerar trabalhadores dormindo em papelões por três horas antes de retornar a jornadas exaustivas, carregando materiais por até 20 horas. É inadmissível que isso aconteça em um evento de grande porte, com discurso de sustentabilidade e responsabilidade social, que possui todos os recursos necessários para evitar essa situação.”

* Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego/ Correio Braziliense

Fonte: https://oimparcial.com.br/noticias/2024/12/forca-tarefa-resgata-14-trabalhadores-submetidos-a-trabalho-analogo-a-escravidao-no-rock-in-rio-2024/