25 de agosto de 2025
Pressão máxima na política maranhense
Compartilhe:

Quem acompanhou o principal ato político do Maranhão do dia 2 de abril de 2022 com atenção, talvez nunca imaginaria que as principais personagens daquele momento estariam em lados tão opostos quase 4 anos depois. Mesmo estando em poderes diferentes, Carlos Brandão (Governo do Maranhão) e Flávio Dino (Supremo Tribunal Federal) estão no centro da divisão do grupo que saiu vitorioso das urnas nas últimas eleições gerais – mesmo que o racha seja sustentado não por eles, mas pelos grupos que têm cada um como líder.

É preciso, antes de mais nada, deixar claro que, sim, Flávio Dino tem impedimentos legais para se manifestar politicamente. Isso não impede que pessoas alinhadas com o projeto político dele (os chamados dinistas) manifestem suas posições, influenciados por comportamentos e ações do Ministro do STF. Toda essa querela tem um início certo (mesmo que as justificativas sejam diferentes para cada lado) e se espalhou por todos os lados (dentro e fora do Maranhão).

ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO MARANHÃO
 

No dia 28 de novembro de 2023, o então secretário da Representação Institucional do Maranhão em Brasília (Rebras), Othelino Neto, decide entregar o cargo ao governador Carlos Brandão. A pasta havia sido criada no início do novo governo com o objetivo de agraciar o aliado. A saída de Othelino foi justificada da seguinte forma:

Analistas políticos dizem que havia muito mais por trás da decisão de Othelino, que nunca teria digerido bem a troca dele na presidência da Assembleia Legislativa do Maranhão (1º de janeiro de 2018 a 1º de fevereiro de 2023) por Iracema Vale, uma neo-deputada, que havia sido recordista de votos em 2022 e que iniciava um novo capítulo na trajetória política.

Por quase um semestre, Othelino Neto dizia ser da base aliada ao governo Brandão, mas, na prática, tinha críticas mais fortes que os poucos oposicionistas existentes na Casa parlamentar.

Disputa por diferentes instâncias por espaço  e poder

Foi nas eleições para a Mesa Diretora da Assembleia que a separação ficou evidente. Othelino, com o apoio dos dinistas, concorreu contra a atual presidente, Iracema Vale, que tinha o apoio do Palácio dos Leões. A eleição ocorreu e Iracema saiu vencedora com larga vantagem de votos, garantindo permanência para o biênio 2025-2027. Tempos depois, o Supremo Tribunal Federal (STF) acolheu Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que questionou resolução sobre a eleição da Mesa Diretora. A Corte decidiu por anular a eleição e determinou a abertura de um novo processo.

Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão. (Foto: Agência Assembleia)

A ALEMA, entendendo que “decisão judicial não se discute, se cumpre”, realizou novo pleito, que teve um grande acirramento eleitoral, terminando com empate em 21 a 21 em dois turnos, sendo definidas pelo critério de idade (Iracema foi eleita por ser mais velha), mas com o resultado questionado nas vias judiciais. O STF chegou a formar maioria pela tese da constitucionalidade do critério de maior idade, mas um pedido de destaque, feito pelo ministro Luiz Fux, levou, para o plenário presencial da Corte, a decisão sobre a ação movida pelo Partido Solidariedade.

O caso, ainda indefinido, tem mexido com os brios de todos, dentro e fora do Parlamento Estadual. Após a última decisão, a atual presidente disse que “primeiro, tentou-se impedir o processo com uma intervenção sem base legal. Agora, o andamento segue sendo postergado por manobras de um partido que se opõe à escolha legítima da Assembleia Legislativa. Enquanto isso, a Corte de Contas permanece desfalcada”.

TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO

A crise em torno de vagas na Corte de Contas estadual caminha paralela aos acontecimentos na Assembleia Legislativa. Ensaios de escândalos e factóides são construídos ao passo que o Tribunal de Contas do Estado do Maranhão segue com vagas abertas, esperando a decisão do STF sobre o que vai acontecer. E muito disso depende de Flávio Dino.

O primeiro ato deste capítulo da crise aconteceu no início de 2023, quando o então conselheiro Edmar Cutrim se aposentou voluntariamente. A Assembleia Legislativa aprova a indicação de Daniel Itapary Brandão, sobrinho do governador Carlos Brandão, para o cargo. Mais uma vez, a polêmica envolve o deputado Othelino Neto, pois muitos acreditavam que ele deveria ter sido o indicado.

As aposentadorias antecipadas dos conselheiros Joaquim Washington Luiz de Oliveira e Álvaro César de França Ferreira aumentaram a crise. O grupo de Brandão tem levantado e indicado nomes, que já teriam passado pelo crivo da Assembleia Legislativa, caso não houvesse interferências externas. Em março de 2024, o ministro Flavio Dino suspendeu o processo de escolha de membro do TCE-MA, atendendo ADIs ajuizadas pelo Partido Solidariedade e pela PGR.

TCE-MA (Foto: Reprodução)

No início deste mês de agosto, Dino baixou outra decisão, determinando que a Polícia Federal investigasse denúncias de um possível esquema de compra de vagas no Tribunal de Contas. No dia 15, a PF instaurou o inquérito, tendo como alvo principal o advogado Flávio Costa, que teria vínculos pessoais e empresariais com o governador Carlos Brandão.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

O mesmo Flávio Costa foi indicado, anteriormente, numa lista tríplice da Ordem dos Advogados do Brasil no Maranhão (OAB/MA) para uma vaga no Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) com as bênçãos do Palácio dos Leões. O advogado enfrentou resistência dentro e fora do Palácio Clóvis Bevilacqua e até hoje ele continua na expectativa se acessar à Corte maranhense.

As objeções, acreditam alguns brandonistas, passam por influências do chamado grupo dinista.

Embate expõe luta  entre os  grupos liderados por Brandão e Dino

SECRETARIADO

Eis um ponto forte de rachas. O chamado primeiro escalão sofreu forte modificação entre 2022 e 2023. Parte dos que estavam com Flávio Dino “saíram” da estrutura do governo pensando nas eleições proporcionais (deputados federais e estaduais). Saíram, mas não se afastaram, pois tiveram a liberdade de indicar substitutos. Dessa forma, se mantiveram próximos ao poder por mais algum tempo.

Pouco a pouco, essa participação diminuía toda vez que o governador Carlos Brandão decidia fazer uma reforma administrativa. Secretarias estratégicas, como as de Educação, Saúde e Segurança Pública, passaram das mãos de pessoas mais ligadas às propostas dinistas e foram para aliados recém-desembarcados no governo.

Em postos menores, como de diretores de autarquias e órgãos membros de secretarias maiores, a limpeza foi mais profunda. Onde havia um aliado dinista (geralmente pessoas ligadas ao PcdoB e as alas dissidentes do governo no PT e PSB), a substituição era aguardada em questão de dias. Hoje, quase não se vê mais indicados por alguém do grupo original de Dino. Quem ainda está, ou passou despercebido ou está fazendo um bom trabalho sem deixar questões políticas interferirem nas atividades.

VICE-GOVERNADOR

Felipe Camarão tem sido apontado por muitos como o retrato mais real da divisão entre brandonistas e dinistas. O vice-governador dizia ter – e demonstrava ter – lealdade a Carlos Brandão. Não havia um ato ou solenidade, oficial ou extra, em que ele não exaltasse a liderança do governador.

No entanto, movimentos de lado a lado foram distanciando o líder supremo do Executivo e seu substituto imediato. As diversas ações no STF que não receberam o tratamento esperado por parte do “amigo” Flávio Dino levaram Brandão e seu grupo mais próximo a tomar algumas medidas. Uma das primeiras foi rever o futuro político do grupo a partir da indicação do nome que poderia assumir o governo em janeiro de 2027.

Nisso, surgiram sugestões sobre o nome de Iracema Vale (logo deixada em standby por conta das crises na ALEMA já relatadas anteriormente) e, mais recente, Orleans Brandão, sobrinho de Brandão e secretário de Assuntos Municipalistas do Governo do Estado. O nome do jovem político tem sido difundido aos cinco cantos do Maranhão na mesma proporção em que o nome de Felipe Camarão vai sendo empurrado para debaixo do tapete. Na verdade, Felipe ainda não foi totalmente descartado porque é o vice-governador e Brandão ainda espera ter o PT no palanque do seu candidato – inclusive com Camarão.

O “X” da questão é que Felipe não abre mão da candidatura majoritária, conforme acordo selado antes mesmo das eleições de 2022, inclusive com declarações públicas de Brandão de que, em 2026, “o governador do Maranhão seria do PT”. Acontece que acordos feitos podem ser refeitos ou quebrados. E é o que muita gente vê. Se foi refeito ou quebrado, depende de que lado a análise está sendo feita.

Quanto a Camarão, já não demonstra a mesma disposição para falar do governador Carlos Brandão. Seus discursos têm sido de memórias do governo Flávio Dino (2015-2022), do legado do governo passado, de seu trabalho na Secretaria de Educação e do que tem de propostas para ser governador do Maranhão.

Por não jogar a toalha, ele tem sido monitorado e qualquer deslize pode e deve ser usado contra ele, como no caso dos prints envolvendo a deputada estadual Mical Damasceno, episódio que arranhou a trajetória de Felipe e que, vez por outra, vem sendo rememorado para manter a imagem dele suja.

Desgastes pessoais e rompimento político

Redes sociais viraram palco de embates diários, entre Mical e Felipe Camarão

As redes sociais que propagaram os prints e matérias sobre a conversa do vice-governador Felipe Camarão com um blogueiro sobre a deputado Mical Damasceno são as mesmas que têm sido usadas para alimentar as divergências entre os grupos brandonistas e dinistas.

Diariamente, os deputados de oposição usam os aplicativos para fazer críticas ao Governo Brandão, ao próprio governador e às construções políticas do grupo governista. Foram feitas postagens sobre ter alguém da família Brandão na linha sucessória do Estado, a viagem do governador para “comemorar aniversário” em Paris e as correlações de ações do Governo com amizades pessoais de integrantes do grupo governista. Desde a primeira foto de tio e sobrinho juntos que as críticas negativas ganharam um tom mais forte.

Por outro lado, replicam postagens de discursos do governador e aliados onde cutucam os oposicionistas e aquilo que acreditam ser orientações dinistas. As publicações de fotos do tio Carlos com o sobrinho Orleans que são repudiadas pela oposição, são as mesmas que recebem aplausos e comentários tipo “fortes lideranças do Maranhão”.

O post mais inesperado veio em 9 de agosto, Dia dos Pais, quando o irmão do governador e pai do secretário Orleans, Marcus Brandão, lançou um vídeo onde fala, abertamente, sobre o rompimento entre Brandão e Dino com direito a supostas ameaças de cassação e prisões. A repercussão foi imediata e grande.

Por outro lado, coincidência ou não, sempre que havia algo considerado positivo ao grupo dinista ou ao próprio Flávio Dino, aparecia alguma postagem nas redes sociais dele que acabavam correlacionando ao fato ocorrido anteriormente.

PSB

Flávio Dino passou muitos anos da vida política filiado ao PT e, depois, ao PcdoB. Por questões de viabilidade eleitoral, em 22 de junho de 2021, ele migrou para o PSB, onde se tornou líder e conseguiu formar um bom grupo. Tempos depois, conseguiu filiar o seu então vice-governador, Carlos Brandão.

Trajetórias políticas com legados diferentes

Ambos se elegeram em 2022 pelo partido socialista. Quando saiu da política para regressar ao Judiciário, Flávio Dino teve que deixar a liderança do PSB e entregou a Brandão, fiel aliado, que daria continuidade nos trabalhos. O que, talvez, o ex-governador não esperava era que o substituto tivesse iniciativas próprias e passasse a assumir, de fato, o papel de líder do partido no Maranhão.

Todas as questões envolvendo Assembleia Legislativa, TCE, TJ, secretarias de governo e eleições de 2026 e que foram distanciando brandonistas e dinistas, chegaram ao PSB. Ali, era uma casa onde as duas alas não se suportavam mais e que não dava mais espaço para tanta gente divergente.

Sem razões ainda muito claras, o novo presidente da sigla, João Campos, prefeito de Recife (PE), decidiu trocar o comando do PSB no Maranhão, passando das mãos de Brandão para a senadora Ana Paula Lobato, esposa do deputado Othelino Neto (logo, adversária política do governador). Brandão ainda foi buscar justificativas junto a Campos, mas viu a troca ser concretizada pouco tempo depois. Nem mesmo a busca por diálogos com o presidente Lula e o vice Geraldo Alckmin (que é do PSB) foram frutíferas.

As consequências da troca no PSB maranhense foram imediatas. Em evento fechado com aliados, Brandão disse que o seu grupo tem votos e não o partido. O destino de todos os que se sentiram traídos pela nacional do PSB ainda não é definitivo, mas é quase certo que devem ir para o MDB, com as bençãos do presidente nacional, o deputado federal Baleia Rossi.

Os efeitos da mudança podem gerar desfiliações no PSB, mas as consequências podem ir além, influenciando até mesmo as correntes de apoio às candidaturas à Presidência da República, o que renderá um esforço extra do atual presidente Lula para manter aliados e propostas dos oposicionistas para que o grupo Brandão “pule de muro”.

STF

Na Suprema Corte, dois ministros têm chamado atenção por decisões contrárias aos interesses do grupo governista no Maranhão. Alexandre de Moraes e Flávio Dino têm atuado em processos que envolvem questões como a indicação de conselheiros para o TCE/MA e eleição da presidência da ALEMA.

No julgamento virtual sobre o uso da idade como critério de desempate na Assembleia Legislativa, Moraes votou favorável a presidente Iracema, mas a manifestação foi feita rodeada de interrogações e logo o voto foi retirado do ar. O ministro pediu vistas, o que irritou bastante todos que estão ao lado da deputada-presidente.

Já Flávio Dino, como relatado no ponto sobre o TCE, impediu a votação envolvendo Flávio Costa, indicação número 1 de Carlos Brandão. Primeiro, o ministro pediu esclarecimentos à Assembleia Legislativa sobre o devido processo de seleção dos indicados.

Mais recente, Flávio Dino decidiu encaminhar solicitação a Polícia Federal para que apurasse a suspeita de negociações de vagas de conselheiros no TCE. A interferência (encarada como proposital pelos aliados de Brandão) foi alvo de reclamações e ações concretas. O governador do Maranhão solicitou, ao então Procurador-geral do Estado, Valdênio Caminha, que encaminhasse pedido formal ao ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, para que Flávio Dino se disse impedido de analisar as pautas referentes ao Maranhão. O PGE do Maranhão assim o fez e, dois dias depois, Alexandre de Moraes determinou sua exoneração do cargo e proibiu nomeação em qualquer outro cargo por indicação.

FAMÍLIA

Carlos Brandão tem, na estrutura de governo, alguns familiares. Entre eles, o secretário de Assuntos Municipalistas, o sobrinho Orleans Brandão. Existem outras pessoas ligadas a família Brandão em cargos menores e isso incomoda aqueles que são ligados a Flávio Dino, pois o ex-governador passou dois mandatos sem indicar nenhum familiar dele para cargos no governo – o mesmo não pode se dizer de alguns auxiliares, já que haviam secretários ou chefes de autarquia que tinham esposas, maridos, filhos e outros parentes dentro da estrutura do Governo do Estado na gestão Dino.

Ainda nesta linha, nenhum evento foi tão emblemático e simbólico da divisão do grupo como o casamento do ministro do STF. A festa, realizada em São Luís, contou com a presença de diversas autoridades. No entanto, foi a ausência que chamou atenção. O governador Carlos Brandão – até então, amigo de Dino – não foi convidado. Para muitos, o episódio foi o sinal mais claro de que Dino e Brandão já não conversavam mais nem por telefone. Pode parecer clichê, mas foi um casamento que tornou público o desmanche de outro casamento.

Fonte: https://oimparcial.com.br/noticias/2025/08/pressao-maxima-na-politica-maranhense/