
Quando começou, há cerca de 23 anos, a produtora rural Jane Sousa da Cruz Carvalho, de Porto Franco, na região sul do Maranhão, trabalhava sem muitos recursos e técnica, apenas com a força de vontade: cavava a terra com facão, carregava água de longe e irrigava as plantas com o pouco que conseguia transportar.
Seu único produto era a polpa de goiaba, feita com os frutos de um pequeno pomar, processada de forma artesanal e vendida de maneira limitada no comércio local. “Era tudo muito no braço e na força de vontade”, lembra Jane.
Hoje, essa mesma força, aliada a técnicas modernas e estratégias de gestão, sustenta uma marca registrada e reconhecida, a Sabores da Terra, que chega a produzir cerca de oito mil quilos de polpa por ano.
O salto na produção veio com o apoio do Sebrae, por meio do programa ALI Rural, que orientou desde práticas de higiene no processamento até estratégias de marketing e gestão. Jane aprendeu a padronizar embalagens, criar identidade visual para seus produtos, manter registros detalhados de produção e vendas, divulgar o trabalho nas redes sociais e usar ferramentas simples para organizar o fluxo financeiro.
Também diversificou o portfólio: hoje, além da polpa de goiaba, vende doce de leite, doce de goiaba, macaxeira, mamão e outros itens, distribuindo para lanchonetes, padarias, restaurantes e pequenos comerciantes da região.
O exemplo de Jane reflete uma tendência crescente no Maranhão e no Brasil: a busca por agregar valor à produção primária. Segundo a Embrapa, a demanda por polpas congeladas no Nordeste vem crescendo de forma consistente, impulsionada pelo consumo urbano e pela busca por alimentos práticos e saudáveis. Pequenos produtores que investem em processamento e marca própria conseguem ampliar margens de lucro e conquistar novos mercados.
No Maranhão, a horticultura também vive um bom momento: de acordo com a Conab, em levantamento referente a 2024, produtos como tomate, cebola, cenoura e mamão registraram oferta acima da média histórica, favorecendo a estabilidade de preços e a regularidade no abastecimento.
Os resultados em Porto Franco comprovam o potencial do investimento em capacitação: levantamento do Sebrae mostra que produtores atendidos pelo ALI Rural no município tiveram aumento médio de 103,78% no faturamento. Cerca de 75% passaram a adotar controles gerenciais, 74% aprimoraram processos produtivos, 71% investiram em modernização e 73% incorporaram práticas de sustentabilidade.
Essa transformação, no caso de Jane, significou mais do que números: foi a virada para enxergar seu trabalho como um negócio estruturado, com metas e identidade. “Hoje eu vendo com marca, meus produtos são personalizados e tenho rede social. O cliente sabe quem eu sou e confia no que faço”, afirma.
A agricultura familiar, segmento no qual Jane se insere, é um dos pilares do abastecimento alimentar brasileiro, respondendo por cerca de 25% da produção agrária e 5% do PIB, segundo o IBGE. No Maranhão, onde predominam pequenas propriedades, ela desempenha papel estratégico para a segurança alimentar e a geração de renda no campo. Em regiões como Porto Franco, que dispõe de boas conexões logísticas pela BR-010, BR-226 e Ferrovia Norte-Sul, o potencial de escoamento é ainda maior — um diferencial para quem quer expandir o mercado.
Da roça à vitrine: como gestão e marketing transformaram o negócio
A virada na trajetória de Jane começou quando ela percebeu que não bastava produzir bem, era preciso vender melhor. Com orientação do Sebrae, passou a mapear pontos de venda na cidade e nas redondezas, visitar pessoalmente lanchonetes, restaurantes e padarias, apresentar seus produtos e oferecer degustações. Criou também um perfil no Instagram para divulgar o dia a dia da produção, compartilhar fotos dos produtos e interagir com clientes.

“Eu gosto da venda. Não tenho dificuldade de conversar, de mostrar o que faço. Busco argumentos, vou atrás, faço entrega pessoalmente. Se o cliente quer conhecer minha produção, abro as portas da minha casa”, conta animada.
Essa postura proativa fez com que a marca Saboress da Terra ganhasse reconhecimento na comunidade. Ao lado das ações de marketing, as melhorias na produção também foram determinantes. A higienização passou a seguir rigorosos padrões, com uso de água tratada, utensílios adequados e controle de temperatura para congelamento. O cuidado garante qualidade e segurança, requisitos essenciais para manter e ampliar a base de clientes.
Além disso, Jane adotou ferramentas simples de gestão: com ajuda dos filhos, registra no computador todas as entradas e saídas, acompanha o fluxo de caixa e presta contas regularmente ao Sebrae. Essa organização permitiu planejar investimentos, como a aquisição de equipamentos e o desenvolvimento de novas embalagens. “Aprendi que ter controle é fundamental para crescer. Antes eu só fazia, agora eu faço e sei exatamente quanto estou ganhando e onde posso melhorar”, explica.
A gestora do programa Ali Rural na região, Aline Maracaipe, salientou que:
“As atividades do Ali Rural desenvolvidas em Porto Franco trouxeram uma mudança de cenário na produção local, isso porque houve um aumento significativo no faturamento e na melhoria do manejo em cada atividade. A produtora Jane é um exemplo de que a determinação aliado ao conhecimento de técnica e gestão faz toda a diferença no resultado final”.
O caso de Jane ilustra o que especialistas em agronegócio defendem: para o pequeno produtor, o salto de renda vem mais da agregação de valor e da gestão eficiente do que do aumento de área plantada – que, por sua vez, acaba crescendo de forma orgânica pela demanda. Dados do Cepea apontam que, no setor de hortifrúti, produtos processados e com apelo de qualidade têm margens significativamente maiores do que produtos vendidos in natura, mesmo em períodos de alta oferta.
O futuro, para Jane, já tem nome e forma: construir sua própria “casa de polpa”, um espaço exclusivo para processamento, armazenamento e atendimento a clientes. “Quero que o Sebrae continue comigo, me ajudando a aprender mais. Não penso em desistir, só em crescer”, diz, com o sorriso de quem sabe que sua história é também inspiração para outros produtores da região.
Fonte: https://oimparcial.com.br/noticias/2025/09/produtora-rural-do-ma-sai-do-cultivo-manual-de-goiaba-para-producao-de-oito-mil-quilos-de-polpa-por-ano/