A aproximadamente 40 quilômetros do Centro de Alcântara, no Maranhão, nas comunidades Rio dos Paus e São Raimundo, crianças negras e pertencentes às tradições de matriz africana vivenciam e preservam com fervor e devoção a religiosidade. As crianças, embora tenham acesso à educação e cuidados básicos de saúde, enfrentam a dura realidade de viver à margem da tecnologia e das facilidades que muitos consideram comuns para um futuro promissor.
Com a devida autorização dos pais, mães e responsáveis, e respeitando os direitos assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), esta reportagem apresenta um retrato de uma parcela da população brasileira que vive ignorada, na maioria das vezes, tanto por gestores públicos quanto pela sociedade em geral.
Publicada originalmente no jornal O Imparcial, Os invisíveis de Alcântara integra o edital para a bolsa de reportagem sobre racismo na primeira infância, ação do Nós, mulheres da periferia, em parceria com a Alma Preta Jornalismo e Marco Zero Conteúdo, e com apoio da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.
No povoado de São Raimundo, a escola local oferta apenas as séries iniciais, do primeiro ao quinto ano, o que compreende dos seis aos dez anos de idade das crianças. O espaço, ainda que simples, é o local que tenta transferir aprendizado e esperança aos estudantes.
Expectativa essa que move os sonhos de Lara Rose, de nove anos, praticante fervorosa de religião de matriz africana e que deseja seguir uma carreira militar, para contribuir com a segurança da sua comunidade. “Eu gosto muito de vir para o barracão (local onde se reúnem), junto com meus amigos e cantar e tocar nas festas dos santos. Mas também tenho o sonho de me tornar uma soldada, porque quero proteger o meu povo”, comenta.
Para dar continuidade aos estudos, após a conclusão das séries iniciais, os estudantes de São Raimundo precisam se deslocar para uma comunidade vizinha, onde são disponibilizadas escolas do ensino fundamental e médio. O transporte é realizado por meio de um ônibus escolar, de responsabilidade da prefeitura de Alcântara.
No entanto, a ausência de escolas com séries avançadas – nas escolas dos povoados não há computadores e nem mesmo internet para os alunos – acaba gerando uma barreira para que essas crianças acessem informações e oportunidades que já fazem parte do cotidiano dos estudantes de áreas urbanas. O ensino é limitado a livros didáticos e ao quadro, distante das ferramentas digitais que poderiam ampliar seus horizontes.
Em Rio dos Paus, Paola Riany Diniz, de nove anos, nos conta que apesar de brincar e se sentir livre no ambiente em que seu município proporciona, sente falta de uma educação mais tecnológica. “Aqui eu me divirto muito com meus amigos, quando vou tomar banho de rio e andar de bicicleta, mas eu queria que a nossa educação fosse com mais computadores e celulares, que nem a gente vê na televisão”, disparou.
Para Maria Luiza Borges, de 38 anos, que morou a vida toda em Rio dos Paus e é mãe das pequenas Maria Clara Borges Diniz, de cinco anos, e Vitória Ribeiro, de sete anos, não houve grandes avanços na comunidade, no que se refere a políticas públicas. No entanto, ela destaca os ensinamentos deixados pela sua avó sobre fé e religiosidade.
“Aqui eu não vejo que chegou muito avanço. Não tem um hospital, uma creche, outros benefícios que a gente observa em determinados locais. Mas a gente se ajuda um ao outro. A família é grande e eu conto com o auxílio da minha mãe. O que a gente preza muito é a fé que a minha avó deixou para minha mãe que passou para mim e meus irmão e eu tento repassar para minhas filhas”, relatou.
Tímida com a presença da equipe de reportagem, ao ser perguntada sobre quais são as brincadeiras que ela mais gostava e o que ela queria para o seu povoado, a pequena Maria Clara, de cinco anos, nos respondeu apenas que gostava de brincar no quintal da casa e ficar perto da sua mãe.
A fé das crianças
Apesar das limitações de recursos, o sonho dessas crianças em construir uma comunidade melhor é forte. Alguns dos entrevistados, mesmo muito jovens, relatam que é com a fé que proferem que recebem energia e força para não desistir de seguir um caminho de sabedoria, guiado pela espiritualidade.
É o que conta o pequeno Gael Araújo, de sete anos, que toca a cabaça, um instrumento percussivo, durante os ritos da religião de matriz africana. “Eu sonho em ter uma casa boa, uma escola boa e uma praça que a gente possa brincar. Eu no futuro? Quero trabalhar no Corpo de Bombeiros. Sei que os meus protetores me ajudarão”, comenta, como prova de fé.
A presença marcante da religião de matriz africana Tambor de Mina nas comunidades de Rio dos Paus e São Raimundo molda a vida dessas crianças de forma profunda. Desde muito pequenos, eles participam dos rituais e aprendem sobre a espiritualidade de seus ancestrais. Esse mergulho e conexão com suas raízes culturais e espirituais é um dos pilares que sustentam a identidade e o senso de pertencimento dessas comunidades.
O nome Tambor de Mina
A palavra tambor é devido a importância do instrumento nos rituais do culto. A palavra Mina refere-se à denominação dada aos escravizados oriundos da costa leste do Castelo de São Jorge da Mina, na atual República do Gana, trazidos da região das atuais repúblicas do Togo, Benim e Nigéria, conhecidos principalmente como negros mina-jejes e mina-nagôs.
A vida em Rio dos Paus e São Raimundo é caracterizada pelo contraponto. De um lado, a distância da tecnologia e das grandes cidades preserva uma forma de vida mais simples e tradicional, onde as crianças ainda brincam nas ruas de terra, mergulham no rio e participam ativamente dos rituais religiosos.
Por um outro olhar, essa mesma distância as priva de oportunidades de desenvolvimento e de um futuro mais promissor.
Jogando com as cartas que tem em mãos, o garotinho de nove anos Marcos Alves Pereira, morador do povoado de São Raimundo, disse que aproveita a ausência de tecnologia para investir em diversões lúdicas e tradicionais. Entre a lista de brincadeiras preferidas, pega-pega, pique esconde, banho de rio rio Fundo, que passa pela comunidade, e tocar instrumentos como o tambor de couro, fabricado lá mesmo, de forma artesanal. “Eu gosto de ouvir a batida do tambor, mas antes, a gente mesmo esquenta e afina na fogueira. Eu não sinto falta de outras brincadeiras. As que eu tenho aqui são muito legais e reúne meus amigos”, diz.
A luta contra aqueles que subestimam ou desvalorizam a religiosidade desse povo nos faz refletir sobre o simbolismo dessa resistência para preservar essa identidade e dignidade. Quem fala um pouco do cenário é o pai de santo Jovenilson que, ao lado das líderes religiosas Orlanda dos Santos Gomes e Maria dos Reis Rodrigues, comanda a Casa do Orixá Ogum, em São Raimundo.
“O nosso papel aqui é de ser orientador para o nosso povo. Servimos como uma espécie de farol para guiar eles, sem que eles percam o seu referencial. Hoje, vocês tiveram a oportunidade de participar de um ritual de iniciação, desse grande ser que se transformará em um homem e dará continuidade a nossa cultura. Estamos repassando a eles o legado que recebemos. Por mais preconceito que exista, aqui vivemos e referenciamos a nossa ancestralidade, a nossa origem. A gente luta para ajudar não só o nosso povo, mas a nossa cidade, o nosso estado. Estamos aqui para todos que precisam de um norte, de uma cura, de uma palavra que elevará sua vibração”, conta Jovenilson.
Iniciação ao Tambor de Mina
Durante a produção da reportagem, quando acompanhamos uma das festas no Terreiro de Mina, no povoado São Raimundo, eu, Dyego Rodrigues, fui surpreendido pelo convite de apadrinhar o pequeno Endrick Caleu, uma criança de nove meses, durante seu ritual de iniciação, por meio do batismo na religião de matriz africana.
O chamado para essa importante participação veio através de uma entidade espiritual, incorporada em um dos líderes religiosos presentes no ritual. Me senti profundamente surpreso e honrado pelo convite e atendi de prontidão ao chamado, ressaltando a conexão intensa e a importância da tradição espiritual naquele momento solene, não só para aquela comunidade e principalmente para aquele garoto, mas para nós que exercíamos o nosso papel como jornalista, naquele celeiro de cultura e religiosidade.
“Que criança negra é essa que estamos falando?”
Em entrevista para esta reportagem, o professor Matheus Gato, do Departamento de Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de Campinas (IFCH-UNICAMP), fez uma reflexão sobre o complexo cruzamento de contexto entre raça, infância e regionalidade no Brasil, especialmente ao considerar a situação de crianças quilombolas no Maranhão.
“Quando a gente traz a questão quilombola e traz o Maranhão, estamos pensando numa criança negra que mora numa periferia urbana. Então, colocar o Maranhão em cena e colocar o quilombola em cena também é deslocar e se perguntar que criança negra é essa que a gente está falando”, questionou o especialista, que também é pesquisador do Núcleo Afro do Centro de Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP) e coordenador do Bitita: Núcleo de Estudos Carolina de Jesus (IFCH/UNICAMP).
“Precisamos atravessar mais de uma camada de invisibilidade, complexificar um pouco como tem que ser a produção da política. Por exemplo, a gente tem dados sobre creches e primeira infância, onde uma das coisas que aparece como carência são as creches com parques infantis. Mas eu não sei se esse é o mesmo tipo de demanda que atende uma comunidade quilombola. Se o parque infantil é, digamos assim, a realização da escola plenamente equipada. A primeira contribuição é, na verdade, um descentramento do que é a criança, do que é a criança negra e suas múltiplas realidades”, destaca.
Matheus Gato enfatiza sobre dois aspectos importantes para se debater sobre o presente das crianças de 0 a 6 anos, sendo o primeiro a proposição de uma aproximação do poder público, garantindo que as crianças tenham acesso aos seus direitos básicos, como alimentação. O segundo aspecto é uma nova perspectiva sobre o que significa ser criança, convidando para uma reflexão sobre não apenas proteger as crianças, mas também a valorizar as experiências únicas que elas trazem, contribuindo para uma concepção mais rica e plural da infância.
“O primeiro ponto é que temos um distanciamento do poder público e uma dificuldade dessas crianças exercerem seus direitos como crianças, do ponto de vista do que o Estado pode oferecer. Por outro lado, a gente também tem que olhar para essa realidade e perguntar que conceito novo de infância pode se entregar para a sociedade. Além de assegurar os direitos das crianças, tem uma outra pergunta que precisamos fazer quando olhamos a realidade das crianças: elas também têm uma infância alternativa a produzir e a ensinar e a acrescentar à nossa própria ideia de infância. A multiplicar a nossa ideia de infância. Temos que olhar para aquela realidade como uma realidade que tem algo a nos ensinar também sobre o que é ser criança, sobre o que é infância e sobre o que é ser uma criança mesmo”.
A proposição de um canal de escuta ativa, garantindo um diálogo genuíno e ativo na construção das políticas e práticas voltadas para as crianças e adolescentes, seria uma alavanca para atender as singularidades de cada grupo e indivíduo.
“O central é estabelecer um canal ativo de escuta e de diálogo ao invés de chegar com um pacote pronto do que é ser criança, do que é uma infância perfeita e apresentar para pessoas que já constroem isso por outras alternativas. Eu me lembro de, ainda estudante de ciências sociais, fiz um trabalho junto com o Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e visitei as comunidades quilombolas lá de Codó (município que fica a 297 km da capital São Luís). Perguntei a um menino de cinco anos o que ele gostaria que sua comunidade tivesse. E o menino de 5 anos falou assim: ‘eu queria que na minha comunidade tivesse uma radiola’. Ou seja, o menino queria reggae na comunidade dele. Para ele, a ideia de infância, a ideia de liberdade do corpo dele, a ideia de experimentação, de ludicidade, passava por isso”, conta Gato.
Destacando que as comunidades não devem ser vistas apenas como receptoras passivas das políticas públicas, mas como atores fundamentais na construção e implementação dessas políticas, especialmente no que se refere à infância, à infância negra, e à própria identidade e experiência de negritude, Matheus fala que para diminuir a desigualdade o poder público deve estar atento aos direitos básicos. “É um absurdo as comunidades ainda estarem demandando creche, ainda estarem demandando coisas que são, na verdade, básicas do ponto de vista dos direitos”, afirma.
Alcântara é a cidade com a maior proporção de população quilombola
O Censo Demográfico de 2022 trouxe pela primeira vez um mapeamento das localidades quilombolas do Brasil. Segundo o levantamento inédito, divulgado no dia 19 de julho pelo Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia (IBGE), em 2022 existiam 8.441 localidades quilombolas no Brasil, associadas a 7.666 comunidades quilombolas declaradas.
Os dados revelaram que o Nordeste possui o maior quantitativo de localidades identificadas, com 5.386 (63,81%) ocorrências, enquanto o Maranhão é o estado com o maior número, com 2.025 localidades (23,99%). Em seguida vem a Bahia, com 1.814 localidades, e depois Minas Gerais, com 979 localidades, correspondendo, respectivamente, a 21,49% e 11,60% do total.
Na oportunidade também foi divulgada a publicação “Censo Demográfico 2022 Quilombolas: Características dos domicílios e alfabetização, segundo recortes territoriais específicos: Resultados do universo”. Alcântara destaca-se como a cidade com a maior proporção de população quilombola no Brasil, com 84,6% dos seus moradores, aproximadamente 15.616 pessoas, que se identificaram como quilombolas. Esses números refletem a representatividade da população quilombola em relação ao total de habitantes da cidade, que soma 18.467, conforme o Censo de 2022.
Ainda de acordo com os dados do IBGE, esse pertencimento está relacionado a questões étnicas, históricas e sociais, de modo que uma mesma comunidade pode ser composta por mais de uma localidade, conforme a necessidade de dispersão espacial e as formas de organização locais e regionais de cada grupo.
Regularização fundiária e capacitação
Segundo o Mapa de Conflitos, Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil, realizado pela Fiocruz, o município é um cenário emblemático da luta quilombola por território no Brasil. A relevância de Alcântara não se resume à vasta área reconhecida oficialmente, mas está enraizada na ocupação ancestral que remonta ao século XVIII, em contraste direto com os interesses do Estado, especialmente no âmbito da Aeronáutica e do Programa Espacial Brasileiro.
É em Alcântara que fica o espaçoporto da Agência Espacial Brasileira (AEB), que serve para o lançamento de foguetes. A base é considerada uma das melhores do mundo pela sua localização privilegiada: bem perto da linha do equador e ao lado do oceano. Mas a presença do Centro Espacial de Alcântara (CEA) gera tensões fundiárias no município desde a sua implementação, em 1983.
Em 2008, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) assegurou a titulação a 110 comunidades quilombolas da região, reafirmando Alcântara como um território predominantemente quilombola. Porém, essas comunidades vivem em constante tensão entre a preservação do patrimônio cultural e a imposição de projetos de desenvolvimento, o que evidencia um dilema profundo e multifacetado, que exige uma reflexão cuidadosa sobre os verdadeiros custos do que é chamado de progresso.
Para discutir a expansão do Programa Espacial Brasileiro e assegurar tanto o desenvolvimento sustentável quanto a regularização fundiária das comunidades quilombolas ao redor do CEA, foi realizada uma reunião no último dia 24 de agosto em Alcântara, reunindo representantes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, tanto em nível federal quanto estadual. Entre os presentes estavam o governador Carlos Brandão e o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Reynaldo Soares da Fonseca.
O governador Carlos Brandão enfatizou a importância da expansão do Centro Espacial para o crescimento econômico e tecnológico do Maranhão. No entanto, ele destacou que, antes de qualquer avanço, é essencial garantir a regularização fundiária para proteger os direitos das comunidades de Alcântara, especialmente das quilombolas. Durante o encontro, Brandão também anunciou a criação de uma unidade do Instituto Estadual de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (Iema) para capacitar jovens da região no setor aeroespacial.
O ministro do STJ Reynaldo Soares da Fonseca, que é natural do Maranhão e já atuou em diversos processos relacionados ao Centro Espacial e às comunidades locais, ressaltou a complexidade do tema. Ele defendeu que a questão precisa ser abordada de maneira multidisciplinar, garantindo o desenvolvimento sustentável do Programa Espacial Brasileiro. “É essencial que o Brasil participe desse avanço tecnológico alinhado à Agenda 2030 de Desenvolvimento. Contudo, para resolver os conflitos gerados pela implantação e expansão do CLA, é imprescindível recorrer à mediação e conciliação com as comunidades quilombolas e os moradores de Alcântara”, afirmou o ministro.
Vale ressaltar que a Agenda 2030 é um plano de ação global que reúne 17 objetivos de desenvolvimento sustentável e 169 metas, criados para erradicar a pobreza e promover vida digna a todos, dentro das condições que o nosso planeta oferece e sem comprometer a qualidade de vida das próximas gerações.
Ações previstas pelo Governo Federal
Durante visita a São Luís em junho deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou que o Governo Federal está prestes a concluir um acordo histórico para o impasse entre as comunidades quilombolas e a Base Espacial de Alcântara, que já dura 40 anos. O presidente afirmou que diálogos estão sendo mantidos com a Força Aérea Brasileira (FAB) e a Advocacia-Geral da União, ressaltando que está confiante de que será encontrada uma solução que atenda a todos.
Esta seria uma tentativa de proteger as comunidades quilombolas, uma vez que a FAB deseja ampliar o território da base de 8,7 mil hectares para 21,3 mil hectares, o que avançaria sobre terras quilombolas, mas as comunidades locais se opõem a essa expansão.
Em 2023, o governo brasileiro reconheceu a violação dos direitos de propriedade e de proteção jurídica dessas comunidades durante a construção da base e emitiu um pedido de desculpas oficial. Esse reconhecimento ocorreu em meio a um processo na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que ordenou a titulação das terras para as famílias quilombolas remanescentes. Ainda no ano passado, foi formado um grupo de trabalho interministerial para buscar uma solução para o impasse que dificulta a titulação das terras.
O Governo Federal lançou recentemente uma iniciativa para melhorar a qualidade de vida das comunidades quilombolas de Alcântara, no Maranhão. A ação é resultado de uma parceria entre o Instituto Federal do Maranhão (IFMA) e o Ministério da Igualdade Racial, voltada para o fortalecimento dos sistemas produtivos locais, com um aporte inicial de R$ 5 milhões, de um total de R$ 30 milhões previstos.
O projeto prevê a instalação de usinas fotovoltaicas nas comunidades, que não só atenderão às necessidades energéticas locais, mas também gerarão créditos de carbono através da produção de energia limpa. Cada comunidade contará com uma pequena usina fotovoltaica, equipada com um conversor para medir a energia limpa gerada, proporcionando autonomia energética. Ao todo, serão instaladas 31 usinas, beneficiando aproximadamente 150 famílias quilombolas. Em Alcântara, a proposta inclui a criação de planos de gestão territorial participativos, que orientarão o planejamento de políticas públicas até 2025.
Políticas Públicas em Alcântara
Entre as ações de mobilização social pela primeira infância em comunidades quilombolas de Alcântara está a Semana do Bebê Quilombola (SBQ), realizada numa parceria entre o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Prefeitura Municipal de Alcântara, o Instituto Formação, a Fundação Josué Montello e o Instituto Alok.
“O município de Alcântara foi contemplado com o Selo Unicef dada a relevância das atividades desenvolvidas em políticas públicas para crianças e adolescentes. Nesta edição de 2021/2024, conseguimos envolver as escolas, igrejas, lideranças comunitárias em todas as atividades diversas fora os serviços básicos ofertados pela prefeitura. Trabalhamos a autovalorização e o reconhecimento dessas comunidades e suas potencialidades”, explicou Vanessa Silva Oliveira, técnica da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social da Mulher e da Igualdade Racial de Alcântara.
Outro avanço é a garantia de direitos civis, como a emissão de registro civil e carteira de identidade, além de ações antirracistas com foco na primeira infância pelo NUCA (Núcleo de Adolescentes), e do serviço de fortalecimento de convivência de vínculos que contempla crianças de 0 até maiores de 60 anos.
“O município também tem o programa Criança Feliz onde são atendidos 300 usuários entre gestantes e crianças de 0 a 6 anos. Há também a brinquedoteca Semente do Saber voltada para crianças de 0 a 6 anos que funciona na sede do município em um bairro vulnerável”, pontuou Vanessa Oliveira, informando que são ministradas oficinas de brinquedos com produtos reciclados e naturais confeccionados com casca de côco babaçu, resgatando brincadeiras ancestrais nestes territórios.
Em entrevista, a secretária adjunta de Igualdade Racial do Governo do Maranhão Socorro Guterres afirmou que há a necessidade de promover uma educação antirracista desde a primeira infância, que respeite as diversidades e contribua para a construção da identidade das crianças quilombolas.
“Com relação à política pública para a primeira infância é preciso que a gente promova para essas crianças uma educação que respeite as suas diversidades, utilizando metodologias pedagógicas que tragam a realidade da vida dessas crianças. As crianças precisam, desde cedo, construir as suas identidades. E essa construção de identidade precisa ser em uma educação de autoestima, uma educação de referenciais positivos”, disse a secretária.
Para alcançar essa meta, o governo do Maranhão, por meio da Secretaria de Igualdade Racial (SEIR) e em parceria com a Secretaria de Educação (SEDUC), tem desenvolvido programas de formação de professores, criação de materiais didáticos e elaboração de diretrizes curriculares específicas para a educação escolar quilombola.
Outra política pública que é desenvolvida pelo Governo do Maranhão em parceria com o município de Alcântara é a política de saúde integral da população negra, dos povos e comunidades tradicionais quilombolas e de matriz africana, por meio da Força Estadual de Saúde (FESMA). A Fesma tem como missão levar atendimento em saúde para a população de baixa renda, ribeirinhos, quilombolas e indígenas.
Porém, a reportagem identificou que nas comunidades de São Raimundo e do Rio dos Paus há ausência de posto de saúde básico para atender essas comunidades. Os moradores afirmam que a falta de transporte adequado é um obstáculo quando há a necessidade de atendimento médico especializado. A dificuldade de deslocamento em estradas não pavimentadas e a ausência de transporte público municipal tornam a viagem até os centros urbanos uma tarefa exaustiva. No entanto, as crianças são vacinadas e recebem cuidados médicos essenciais em localidades vizinhas.
Raio X de Alcântara
O território
Em 2022, a área do município era de 1.167,964 km², o que o coloca na posição 85 de 217 entre os municípios do estado e 1257 de 5570 entre todos os municípios.
Mortalidade Infantil
A taxa de mortalidade infantil na cidade de Alcântara é de 34,88 para 1.000 nascidos vivos. As internações devido a diarreias são de 75,8 para cada 1.000 habitantes. Comparado com todos os municípios do estado, fica nas posições 8 de 217 e 99 de 217, respectivamente.
Cobertura de vacinação
Segundo o Ministério da Saúde, o Maranhão registrou aumento de 15,2 pontos percentuais na cobertura vacinal de DTP (difteria, tétano e coqueluche), que saltou de 57,9% no ano passado para 73,1% neste ano. De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde (SES), 15 municípios receberam a vacina contra a dengue e Alcântara alcançou 90,97% de cobertura, ultrapassando a meta preconizada pelo Ministério da Saúde. O imunizante é destinado a pessoas de 10 a 14 anos que concentram a maior proporção de hospitalização pela doença.
Alfabetização dos Quilombolas de Alcântara
Em 2010, a taxa de escolarização de 6 a 14 anos de idade era de 96,8%. Em relação ao IDEB, no ano de 2021, o IDEB para os anos iniciais do ensino fundamental na rede pública era 4,5 e para os anos finais, de 4,3. Na comparação com outros municípios do estado, ficava nas posições 114 e 49 de 217. Já na comparação com municípios de todo o país, ficava nas posições 4477 e 3810 de 5570.
Saneamento básico
Nos povoados Rio dos Paus e São Raimundo o saneamento tem chegado aos poucos, por meio do programa Minha Casa Minha Vida, que insere fossas sépticas nas casas. Já o município de Alcântara tem somente 6,5% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Quando comparado com os outros municípios do estado, fica na posição 122 de 217. Já quando comparado a outras cidades do Brasil, sua posição é 4663 de 5570.
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Fonte: https://oimparcial.com.br/noticias/2024/09/quilombolas-os-invisiveis-de-alcantara/