
A partir da manhã desta terça-feira (25/03), cinco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidirão se o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) virará réu por tentativa de golpe de Estado e outros crimes.
Os ministros da Primeira Turma do STF — Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Flávio Dino e Luiz Fux — vão avaliar uma denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Bolsonaro e mais sete pessoas, que compõem o chamado núcleo 1 de acusados no documento da procuradoria e com base nas investigações da Polícia Federal.
Alexandre de Moraes é o relator da petição pelo recebimento da denúncia, a PET 12100.
Este grupo de denunciados é considerado pela PGR como o “núcleo crucial” da suposta trama golpista e inclui, além do ex-presidente:
- O deputado federal Alexandre Ramagem;
- O almirante e ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos;
- O ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF Anderson Torres;
- O general da reserva e ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno;
- O tenente-coronel e ex-ajudante de ordens da Presidência Mauro Cid;
- O general e ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira;
- O general da reserva e ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Netto.
Os membros desse núcleo foram denunciados pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; tentativa de golpe de Estado; envolvimento em organização criminosa armada; dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
O julgamento da denúncia, apresentada em fevereiro pela PGR, está previsto para começar às 9h30 de terça. Após um possível intervalo, será retomado às 14h. Se necessário, haverá mais uma sessão às 9h30 de quarta-feira (26/03).
A análise acontecerá no plenário da Primeira Turma, na sede do STF em Brasília. Alguns veículos da imprensa poderão acompanhar o julgamento no local.
As sessões serão transmitidas ao vivo pela TV Justiça e pelos canais no YouTube da TV Justiça e do STF.
O STF preparou um esquema especial de segurança, com apoio da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal e de outros órgãos. Haverá controle maior de acesso a certas áreas do Supremo, policiamento reforçado e equipes preparadas para emergências.
Além dos ataques de 8 de janeiro de 2023, em que o prédio do STF e de outros poderes foram invadidos e vandalizados, em novembro do ano passado um homem disparou explosivos contra o STF.
Francisco Wanderley Luiz, de 59 anos, morreu após lançar os explosivos e se deitar ele próprio sobre uma bomba.
Qual será o passo a passo do julgamento?
A Primeira Turma vai avaliar se a denúncia atende aos requisitos legais, conseguindo demonstrar indícios dos crimes apontados e evidências de que os denunciados podem ser autores desses supostos crimes.
A sessão seguirá o rito previsto no regimento interno do STF, conforme divulgado pela Corte:
- Abertura da sessão pelo presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin;
- Leitura do relatório pelo relator do caso, Alexandre de Moraes;
- Sustentação oral do procurador-geral da República, Paulo Gonet, por 30 minutos;
- Sustentação oral das defesas dos oito denunciados, em ordem definida pelo presidente da turma e com 15 minutos para cada;
- Voto do relator nas preliminares (questionamentos das defesas sobre o processo que não têm a ver com o mérito);
- Votos dos demais ministros sobre preliminares, na seguinte ordem: Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin;
- Voto do relator sobre mérito da denúncia;
- Votos dos demais ministros sobre o mérito, na seguinte ordem: Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.
Contestações das defesas
As questões preliminares, que serão avaliadas antes do próprio mérito das denúncias, devem girar em torno de algumas contestações que as defesas já têm vocalizado.
Alguns advogados dos denunciados têm alegado, por exemplo, que não tiveram acesso integral às evidências colhidas nas investigações.
Em documento de 6 de março, a defesa de Jair Bolsonaro apontou provas que, na sua visão, deveriam ser anuladas e pediu que o caso fosse analisado pelo Plenário do STF com todos seus 11 ministros, e não apenas os cinco ministros da Primeira Turma.
Além disso, solicitou que a relatoria da petição fosse retirada de Alexandre de Moraes.
Outro ponto contestado é a delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, a qual é uma das bases da denúncia da PGR.
Os advogados de Bolsonaro defendem que a anulação da colaboração de Cid é uma “medida que se impõe”, classificando a delação como marcada por “mentiras, omissões e contradições”.
Assim como o ex-presidente vem afirmando publicamente, seus advogados também rejeitam as acusações e dizem que não foi demonstrada a sua ligação com planos golpistas.
A suspeição de ministros da Primeira Turma, apontada por algumas das defesas, a princípio já foi decidida pelo STF em 20 de março, quando foi rejeitado o pedido de afastamento do caso contra Flávio Dino, Cristiano Zanin e Alexandre de Moraes.
A defesa de Jair Bolsonaro pediu o afastamento de Dino e Zanin, que foram indicados ao STF pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por suas atuações pregressas.
A defesa do general Mario Fernandes também pediu o impedimento de Flávio Dino.
Já os advogados do general Walter Braga Netto apontaram suspeição de Alexandre de Moraes, afirmando que o relator do caso seria um “inimigo capital” do militar.
Bolsonaro pode ser preso?
A princípio, uma pessoa só pode ser presa no final de um processo judicial, se houver condenação e se todas as possibilidades de recurso tiverem sido esgotadas.
Jair Bolsonaro ainda não está passando por um processo judicial, e sim por uma denúncia — que, caso aceita pela Primeira Turma, aí sim se transforma em um processo, com o denunciado se tornando réu.
Mas há exceções: uma pessoa pode ser presa antes de uma condenação ou até mesmo antes de existir um processo judicial, caso seja detida em flagrante ou a Justiça considere que ela representa risco para a sociedade ou para o andamento das investigações ou do processo.
Braga Netto, por exemplo, está preso preventivamente desde dezembro, acusado de ter tentado atrapalhar as investigações.
Normalmente, um réu pode recorrer de uma decisão de primeira instância na segunda instância, depois no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, eventualmente, no STF.
Entretanto, como essas denúncias da PGR estão sendo julgadas pelo STF e um eventual processo permaneceria na Corte, não há como recorrer a uma instância superior — o STF já é a mais alta instância da Justiça Brasileira.
Se os denunciados, incluindo Bolsonaro, tornarem-se réus, o processo tem três fases:
- Instrução criminal (produção de evidências como perícias, quebra de sigilo e depoimento das testemunhas);
- Interrogatório dos réus;
- Apresentação de memoriais (alegações finais) pela PGR e depois pela defesa.
Alguns dos principais crimes atribuídos aos denunciados podem ter as seguintes penas:
- Entre 4 e 8 anos pelo crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, além da pena correspondente à violência utilizada;
- Entre 5 a 10 anos pelo crime de organização criminosa;
- Entre 3 a 10 anos pelo crime de golpe de Estado.
O que diz a denúncia da PGR?
Em 18 de fevereiro, a Procuradoria-Geral de República (PGR) denunciou Bolsonaro por supostamente liderar uma tentativa de golpe de Estado após sua derrota na eleição de 2022 para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“A organização tinha por líderes o próprio presidente da República [Jair Bolsonaro] e o seu candidato a vice-presidente, o General Braga Neto. Ambos aceitaram, estimularam, e realizaram atos tipificados na legislação penal de atentado contra o bem jurídico da existência e independência dos poderes e do Estado de Direito democrático”, escreveu o procurador-geral, Paulo Gonet.
Segundo a denúncia, a organização criminosa teria atuado em várias frentes desde 2021 para levar à ruptura institucional em caso de derrota nas urnas — desde discursos atacando o sistema eleitoral brasileiro até supostas pressões sobre o Alto Comando das Forças Armadas para apoiar um decreto de cunho golpista, a chamada “minuta do golpe”.
Gonet citou ainda os bloqueios da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no segundo turno da eleição em 2022, em especial em regiões onde Lula era favorito.
É destacada ainda a atuação dos denunciados no suposto plano “Punhal Verde Amarelo”, que teria como objetivo matar o vice-presidente Geraldo Alckmin e o presidente Lula, além de matar ou restringir a liberdade do ministro Alexandre de Moraes.
A PGR diz que Bolsonaro não só sabia do plano como “acompanhou a evolução do esquema e a possível data de sua execução integral”.
Bolsonaro também é acusado pelo procurador-geral de “omissão” nos ataques de 8 de janeiro de 2023.
O ex-presidente está inelegível até 2030 após ter sido punido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação ao atacar ao sistema eleitoral brasileiro.
A denúncia da PGR ocorreu quase quatro meses após Bolsonaro e mais 36 pessoas terem sido indiciadas criminalmente pela Polícia Federal (PF), em novembro.
Após o indiciamento pela PF, cabia à PGR decidir se prosseguiria ou não com a denúncia.
Ficaram fora das denúncias da PGR pessoas que haviam sido indiciadas pela PF: Alexandre Castilho Bitencourt da Silva; Amauri Feres Saad; Anderson Lima de Moura; Carlos Giovani Delevati Pasini; Fernando Cerimedo; José Eduardo de Oliveira e Silva; Laercio Vergilio; Tércio Arnaud Tomaz e Valdemar Costa Neto, presidente do PL, o partido de Bolsonaro.
Por outro lado, pessoas que não haviam sido implicadas pela polícia foram denunciadas pela PGR: Marília Ferreira de Alencar; Fernando de Sousa Oliveira; Reginaldo Vieira de Abreu; e Rodrigo Bezerra de Azevedo.
Quais são os núcleos denunciados?
Ao todo, 34 pessoas, incluindo o núcleo 1 e Jair Bolsonaro, foram denunciadas pela PGR em fevereiro.
Além do primeiro grupo, o “núcleo crucial”, a PGR separou ainda os seguintes núcleos:
- Núcleo 2: Com seis pessoas, esse seria o núcleo do gerenciamento das ações, responsável por direcionar forças policiais e produzir minutas golpistas, entre outras medidas;
- Núcleo 3: Com 12 pessoas, o núcleo operacional monitoraria autoridades e faria pressão para o Exército apoiar um golpe. Esse grupo é composto principalmente por militares e policiais federais;
- Núcleo 4: Com oito pessoas, o núcleo da desinformação seria responsável por propagar notícias falsas sobre o processo eleitoral e realizar ataques virtuais a instituições e autoridades.
Além do núcleo 1, o STF já marcou também a análise das denúncias contra o núcleo 2 (29 e 30 de abril) e núcleo 3 (em 8 e 9 de abril).
Com informações da BBC Brasil
Fonte: https://agendadopoder.com.br/a-hora-da-verdade-como-sera-julgamento-no-stf-que-pode-tornar-bolsonaro-reu-pela-tentativa-de-golpe-de-estado/