21 de setembro de 2024
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Guerra cultural, doutrinação, globalismo, família, armas, ideologia woke são alguns dos tópicos tratados no curso Formação Conservadora, criado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho do ex-presidente Jair Bolsonaro. Os jornalistas Andrea Dip e Niklas Franzen se matricularam no curso para entender a metodologia e o público alcançado pela formação. O resultado é apresentado em um dossiê da Fundação Heinrich Böll, lançado nesta quinta-feira (11).

Estratégias como esta são parte do movimento de extrema direita que se fortalece pelo mundo e ameaça a democracia em pontos importantes do planeta, um deles é o Brasil.

A apresentação do curso destaca o objetivo de formar líderes conservadores para a chamada “guerra cultural”. O lema do projeto é: “Há uma guerra em andamento, e o Brasil precisa de você”. O curso é 100% online, com conteúdos de áudio e vídeo e custa R$ 598,80. A meta, segundo a plataforma, é “retomar todo o espaço que foi ocupado pela esquerda: política, universidades, escolas, comunidades locais”. Entre os participantes, muitos membros parecem ter mais de 50 anos, além de serem mais homens do que mulheres.

“O curso captura e deturpa a História desde a criação do universo até a ditadura militar no Brasil, passa por um revisionismo da geopolítica, da ciência e das teorias de gênero e feministas, tenta tornar o racismo uma pauta menor, aponta a comunidade LGBT+ como ameaça, entende a cultura e a arte como ferramentas apropriadas pela esquerda para doutrinação de mentes e a educação formal como uma ameaça à família”, analisam os jornalistas autores do dossiê.

Eduardo apresenta-se como alguém articulado com a direita mundial, próximo do primeiro-ministro da Hungria Viktor Orbán; de Marine Le Pen (França); de Javier Milei (Argentina) e de Donald Trump (EUA). “Os conceitos e valores disseminados pelo curso de Eduardo Bolsonaro reverberam e tornam palatáveis ao público brasileiro o pensamento da extrema direita mundial. Não à toa, ele é convidado a falar em congressos internacionais importantes como o CPAC [Conservative Political Action Conference],” destaca o relatório.

Ideologia woke — Guerra cultural é um dos conceitos centrais do curso, inclusive com menções às ideias sobre hegemonia cultural de Antonio Gramsci, marxista, escritor e um dos co-fundadores do Partido Comunista Italiano. O dossiê destaca, no entanto, que as referências ao pensador italiano se fazem por meio de Olavo de Carvalho, astrólogo e filósofo autodeclarado, considerado líder do pensamento da extrema direita no Brasil. “A esquerda largou as armas e foi para cima dos livros”, diz Eduardo.

O deputado define a esquerda como “muito bem articulada”, que usa “estruturas poderosas” para manipular a população. Em alguns momentos, o curso joga com a ideia de que as pessoas podem se tornar socialistas sem perceber, por influência cultural. Para Eduardo, essa é “uma guerra de longo prazo”. Um dos convidados deste módulo é Mário Frias, que foi secretário da Cultura do governo de Jair Bolsonaro. “Ele diz: ‘O que eles [da esquerda] construíram ao longo dos 30 anos foi no coração. Foram corações e mentes que eles dominaram, não é algo simples para virar’”.

Os jornalistas destacam que esta é uma narrativa central da propaganda ultradireitista no mundo: a ideia de que a ideologia woke “domina grande parte das sociedades ocidentais e isso torna a resistência conservadora necessária”. O termo em inglês “tornou-se sinônimo de políticas liberais ou de esquerda, que defendem temas como igualdade racial e social, feminismo, o movimento LGBTQIA+, o uso de pronomes de gênero neutro, o multiculturalismo, a vacinação, o ativismo ecológico e o direito ao aborto.”

Fundamentos e reação — No tópico globalismo, o influenciador de direita Fernando Conrado é o convidado. Segundo o dossiê, ele oferece cursos sobre temas como capitalismo e crescimento pessoal em sua plataforma paga. O pressuposto básico neste tema é que “existe uma pequena elite ‘globalista’ que deseja impor seu modo de vida e pensamento à maioria da população. Segundo Conrado, o ‘globalismo’ é a implantação de políticas no nível internacional ‘com o fim de acabar com as peculiaridades de cada povo’”.

O relatório também mostra que a defesa da família, de características “heteronormativa, biologizante, composta por mãe biológica, pai biológico e seus filhos”, é central nos módulos do curso, “em conformidade com os valores da extrema direita internacional”. A senadora Damares Alves é a convidada deste bloco. A fala da ex-ministra de Direitos Humanos demonstra que “a campanha de desinformação” em torno da “ideologia de gênero que perseguiu professores, pesquisadores e ativistas” segue forte.

As redes sociais são apontadas como principal canal para reação contracultural da direita brasileira, com a participação do youtuber bolsonarista Fernando Lisboa. “É literalmente uma aula bastante didática sobre como utilizar e polemizar nas principais plataformas, passando por cada uma delas.” O deputado, de acordo com o dossiê, menciona repetidamente o “Brasil Paralelo” — plataforma de streaming, também chamada de “Netflix da direita”.

“A gente não vai ter sucesso no curto prazo, nosso maior sucesso vai ser no meio, longo prazo e sempre começando pelas nossas casas, educar nossos filhos, olhando o que eles estão aprendendo na escola, lendo o livro dele”, diz Eduardo.

Com informções do 247, via Brasil de Fato.

Fonte: https://agendadopoder.com.br/curso-de-extrema-direita-formulado-por-eduardo-bolsonaro-deturpa-a-historia-e-faz-revisionismo-da-geopolitica-revela-dossie/