
A crise diplomática entre Brasil e Estados Unidos se intensificou a partir de julho de 2025, quando o governo dos EUA, sob a presidência de Donald Trump, passou a emitir declarações públicas em defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro e contra autoridades do Judiciário brasileiro, especialmente o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Em 8 de julho, Trump usou sua rede social Truth Social para afirmar que Bolsonaro era vítima de uma “terrível injustiça”. “O Brasil está fazendo algo terrível no tratamento dado ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Eu tenho observado, assim como o mundo, enquanto eles não fazem nada além de persegui-lo, dia após dia, noite após noite, mês após mês, ano após ano!”, escreveu.
Acrescentou ainda: “ele não é culpado de nada, exceto de ter lutado pelo povo”. Para o presidente dos EUA, a única forma legítima de julgamento seria “um julgamento pelo povo brasileiro – isso se chama eleição”. No dia seguinte, Trump voltou ao tema e pediu para que “deixem o grande ex-presidente do Brasil em paz”, chamando os processos contra Bolsonaro de “caça às bruxas”.
Em 9 de julho, a Embaixada dos Estados Unidos em Brasília endossou oficialmente as declarações de Trump. Em nota divulgada à imprensa, afirmou: “Jair Bolsonaro e sua família têm sido fortes parceiros dos Estados Unidos. A perseguição política contra ele, sua família e seus apoiadores é vergonhosa e desrespeita as tradições democráticas do Brasil. Reforçamos a declaração do presidente Trump. Estamos acompanhando de perto a situação.” A resposta do governo brasileiro veio por meio do Itamaraty, que convocou o encarregado de negócios dos EUA no país, Gabriel Escobar, para prestar esclarecimentos.
No dia 15 de julho, as críticas dos EUA subiram de tom. Darren Beattie, subsecretário de Diplomacia Pública do Departamento de Estado, publicou em sua conta na rede X que o Brasil estaria sendo governado por um “Supremo Tribunal de Moraes” e acusou o ministro do STF e o governo Lula de promoverem ataques à liberdade de expressão, ao ex-presidente Jair Bolsonaro e ao comércio com os Estados Unidos. A publicação foi replicada nos canais oficiais da Embaixada dos EUA no Brasil.
.@POTUS Trump enviou uma carta impondo consequências há muito esperadas ao Supremo Tribunal de Moraes e ao governo Lula, em resposta aos ataques a Jair Bolsonaro, à liberdade de expressão e ao comércio dos EUA. Esses ataques são vergonhosos e desrespeitam as tradições… https://t.co/HmXxdSiItS
— Embaixada EUA Brasil (@EmbaixadaEUA) July 15, 2025
Ainda no fim de junho e início de julho, Marco Rubio, secretário de Estado dos EUA, anunciou a revogação dos vistos do ministro Alexandre de Moraes, de seus familiares e aliados, alegando que eles promovem “perseguição política” e cometem “violações de direitos fundamentais” que não podem ser toleradas pelo governo dos EUA.
Em 30 de julho, os EUA formalizaram a inclusão de Alexandre de Moraes na lista de sanções previstas pela Lei Global Magnitsky, que prevê congelamento de bens, restrições financeiras e impedimentos de entrada em território estadunidense. A medida é sem precedentes nas relações entre os dois países.
O presidente Lula reagiu com firmeza. Em nota do Itamaraty, o governo brasileiro afirmou: “O governo brasileiro deplora e rechaça, mais uma vez, manifestações do Departamento de Estado norte-americano e da embaixada daquele país em Brasília, que caracterizam nova intromissão indevida e inaceitável em assuntos de responsabilidade do Poder Judiciário brasileiro. Tais manifestações não condizem com os 200 anos da relação de respeito e amizade entre os dois países.”
O Itamaraty também deixou claro que o Brasil continua disposto a manter o diálogo sobre comércio, mas que não aceitará “tutela” externa sobre suas instituições democráticas. “A equivocada politização do assunto não é de responsabilidade do Brasil, país democrático cuja soberania não está, e nem estará jamais, na mesa de qualquer negociação”, afirma a nota.
William Browder, investidor britânico que idealizou a campanha global em prol da criação da Lei Magnitsky, disse que a mesma não se aplica a Moraes, já que o ministro não feriu direitos humanos, nem cometeu corrupção, e atua na Suprema Corte de um país democrático.
Outro episódio que ampliou a tensão ocorreu durante entrevista ao canal ABC, no programa This Week, em 13 de julho. O diretor do Conselho Econômico Nacional dos EUA, Kevin Hassett, foi questionado sobre as tarifas de 50% impostas por Trump a produtos brasileiros. Ao ser perguntado se o presidente estadunidense estava se intrometendo em assuntos internos do Brasil, Hassett respondeu que sim e afirmou que o caso de Bolsonaro era “uma ameaça à segurança nacional”. Segundo ele, Trump tinha o direito de intervir com base na Lei Internacional de Poderes Econômicos de Emergência (IEEP). Confrontado com dados que mostram que os EUA têm superávit comercial com o Brasil, Hassett não conseguiu justificar as tarifas e encerrou a entrevista visivelmente desconcertado.
Holy shit — Kevin Hassett completely bombs on ABC when pressed by Jon Karl to explain how Trump can possibly justify 50% tariffs on Brazil even though the country has a trade deficit with the US pic.twitter.com/iXoR8Fifqr
— Aaron Rupar (@atrupar) July 13, 2025
Em 7 de agosto, a tensão diplomática atingiu seu ponto mais alto. A Embaixada dos EUA publicou nota oficial acusando Alexandre de Moraes de ser “o principal arquiteto da censura e perseguição contra Bolsonaro e seus apoiadores”. O texto dizia que “suas flagrantes violações de direitos humanos resultaram em sanções pela Lei Magnitsky, determinadas pelo presidente Trump” e advertia que “os aliados de Moraes no Judiciário e em outras esferas estão avisados para não apoiar nem facilitar a conduta de Moraes. Estamos monitorando a situação de perto.” A nota ecoava o discurso de Darren Beattie, que já havia ameaçado “aliados de Moraes” em mensagens anteriores.
No mesmo dia, o Departamento do Hemisfério Ocidental dos EUA divulgou outro comunicado em tom agressivo, afirmando que “o ministro Moraes, agora um violador de direitos humanos sancionado pelos EUA, continua a usar instituições brasileiras para silenciar a oposição e ameaçar a democracia. Impor ainda mais restrições à capacidade de Jair Bolsonaro de se defender publicamente não é um serviço público. Deixem Bolsonaro falar!”
A escalada das declarações e sanções por parte do governo dos Estados Unidos representa um marco nas relações entre os dois países, especialmente no que diz respeito à ingerência em assuntos internos do Brasil. Trata-se da primeira vez, desde a redemocratização do Brasil, que Washington impõe sanções diretas a um ministro do Supremo Tribunal Federal do país, com base em legislação unilateral e motivação política.
A crise deve continuar a reverberar nos próximos meses, com possíveis impactos sobre acordos comerciais, cooperação internacional e equilíbrio diplomático no cenário latino-americano. O governo Lula, até o momento, mantém sua posição de que não aceitará pressão externa sobre decisões do Poder Judiciário e defende o Brasil como país sobrerano.
Resumo das principais ações e seus impactos nas relações Brasil‑EUA
Data | Ato dos EUA | Implicações principais |
---|---|---|
08/07/2025 | Trump defende Bolsonaro e repudia processos | Interferência política direta e ataque à soberania |
09/07/2025 | Nota da embaixada em defesa de Bolsonaro | Aumento da tensão diplomática e convocação do encarregado |
15/07/2025 | Críticas ao STF como “Supremo de Moraes” | Deslegitimação pública da corte |
Jun–Jul/2025 | Revogação de vistos de ministros do STF | Sanções pessoais e indicativo de isolamento institucional |
30/07/2025 | Inclusão de Moraes em sanções Magnitsky | Intensificação da retaliação com base controversa em direitos humanos |
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Fonte: https://agendadopoder.com.br/do-impeachment-de-moraes-a-defesa-de-bolsonaro-as-ameacas-da-embaixada-dos-eua-ao-brasil/