13 de janeiro de 2025
Documento do Senado tem informações divergentes sobre padrinhos de emendas
Compartilhe:

O documento do Senado que atribui aos líderes partidários a indicação de R$ 2,7 bilhões em emendas de comissão apresenta divergências em relação às declarações públicas de prefeitos e parlamentares sobre os responsáveis pela destinação desses recursos. Esses valores estão no centro de um debate entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF). O ofício que solicita a liberação das verbas foi enviado ao governo federal e também anexado ao processo que analisa a legalidade desses repasses.

Uma investigação realizada pelo jornal O Globo identificou ao menos três casos em que as informações previamente divulgadas sobre o destino das emendas milionárias diferem daquelas apresentadas oficialmente ao Executivo e ao Judiciário.

Um exemplo ocorre em Araguaína, no estado do Tocantins, cidade com cerca de 171 mil habitantes localizada a 380 quilômetros de Palmas. Durante um programa de televisão, o prefeito Wagner Rodrigues (União Brasil) agradeceu ao senador Eduardo Gomes (PL-TO) pelo envio de R$ 2,5 milhões destinados à construção do novo Parque das Águas. Contudo, no ofício do Senado, embora o valor e o objetivo coincidam, o responsável oficial pela solicitação desses recursos é outro parlamentar: o senador Carlos Portinho (PL-RJ), líder do partido.

— Não tenho responsabilidade sobre a escolha, indicação ou execução da emenda, mas tenho o dever, como líder, de assinar qualquer ofício que vá com pedidos de emendas ou indicação de emendas, principalmente de comissão. Eu não sou da Comissão de Turismo, por exemplo, mas assino pelos senadores do PL a indicação da emenda, o que não significa que eu tenho qualquer participação ou envolvimento na escolha e na execução — afirmou Portinho.

Procurado, Gomes não se manifestou. Ao determinar na semana passada o bloqueio de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão da Câmara, Dino criticou a falta de informações sobre os reais responsáveis pelas indicações e reiterou a necessidade de que haja aprovação dos colegiados.

“A propósito, lembro, mais uma vez, que não existem, no ordenamento jurídico pátrio, ‘emendas de líderes’. A Constituição Federal trata exclusivamente sobre emendas individuais e de bancada, enquanto as emendas de comissão são reguladas pela Resolução nº. 001/2006, do Congresso Nacional, e, mais recentemente, pela Lei Complementar nº. 210/2024”, afirmou Dino na ocasião.

No domingo, o ministro do STF, em nova decisão, manteve as críticas sobre as falhas na transparência, mas liberou o pagamento de emendas de comissão empenhadas antes do despacho da semana passada, alegando que o represamento poderia prejudicar estados e municípios que já estavam contando com o dinheiro.

Segundo o Palácio do Planalto, R$ 1,7 bilhão do valor pedido pela Câmara já foi reservado. A Advocacia-Geral da União (AGU), no entanto, orientou que nenhum valor desse lote de R$ 4,2 bilhões seja pago antes de novos esclarecimentos, pois há uma “dúvida razoável” sobre o alcance da decisão.

Outro caso encontrado no ofício do Senado trata de um repasse de R$ 2 milhões para a construção de um portal em Assis Brasil (AC), cidade de 7,5 mil habitantes a 340 quilômetros de Rio Branco.

No ofício enviado ao Supremo, o recurso aparece como uma indicação do líder do União Brasil no Senado, Efraim Filho (PB). No início do ano, no entanto, o senador Alan Rick (União-AC) havia gravado um vídeo ao lado do prefeito de Assis Brasil, Jerry Correia (PP), celebrando o envio da verba e se dizendo responsável pelo repasse.

— Vamos entregar dois tratores agrícolas grandes, já foram adquiridos. Vou lá em abril entregar esses tratores e anunciamos aqui R$ 2 milhões para a construção do sonhado portal do município, para a cidade ficar bonita — afirmou o senador Alan Rick em vídeo gravado em março e publicado nas redes sociais.

Procurado, Efraim Filho afirmou que os senadores cumpriram a decisão do STF e fizeram as indicações de acordo com o deliberado pelas respectivas bancadas. Segundo o parlamentar, o pedido foi, de fato, para atender ao colega do Acre:

— Assinei a indicação como determina a decisão do STF, atendendo ao encaminhamento da minha bancada. Neste caso específico, do senador Alan Rick.

Algo semelhante aconteceu em Morungaba (SP), cidade de 13,7 mil habitantes na Região Metropolitana de Campinas. Há menos de duas semanas, o prefeito do município, Marquinho Oliveira (PSB), agradeceu o senador Giordano (MDB-SP) por R$ 13 milhões em recursos enviados.

“Com o empenho do senador Giordano e da equipe da prefeitura foi possível entregar esta obra hoje aos morungabenses. Além da estrada, em nome de toda a população, também agradeço outros recursos enviados pelo senador Giordano como o Hospital e mais R$ 13 milhões para obras de infraestrutura e recapeamento, recursos para custeio e para a Apae”, disse Oliveira, segundo o site oficial da prefeitura.

No ofício enviado pelo STF ao Senado, há um valor de R$ 14 milhões para a cidade em duas indicações diferentes para obras de pavimentação, ambas com o nome do senador Eduardo Braga — ele é líder do MDB, partido de Giordano, mas foi eleito pelo Amazonas.

Procurado, Braga confirmou que não é o responsável pela emenda. O parlamentar encaminhou uma planilha com as duas indicações para Morungaba feitas por Giordano.

— Os líderes, por orientação da Mesa, fizeram as indicações de acordo com os senadores de cada bancada. Eu, como líder, encaminhei as emendas dos senadores do MDB — afirmou.

O documento apresentado pelo Senado ao STF não faz referência aos outros integrantes da Casa e afirma que os “signatários são os líderes partidários, com suas respectivas indicações anexas”. De acordo com a diretora de programas da Transparência Brasil, Marina Atoji, a falta de transparência na apresentação dos verdadeiros autores dos repasses reforça os problemas na liberação de emendas.

— São claros indícios de que o Senado, assim como a Câmara, não tem o menor interesse em cumprir decisões judiciais nem de prestar contas à sociedade. O cenário é ainda pior do que a falta de transparência: criou-se uma imensa confusão sobre quem são os reais responsáveis por indicar aonde vão bilhões em dinheiro público — disse.

Procurado para comentar, o Senado enviou o ofício entregue ao governo e à Corte. De acordo com o documento, cada líder partidário se encarregou da formalização da individualização das emendas de interesse próprio ou dos integrantes das suas bancadas.

“Logo, o que se depreende é que o Senado Federal observou o procedimento previsto segundo as normas vigentes para a efetivação das aludidas emendas de comissão, o que deve importar na promoção dos empenhos respectivos, cujo prazo se encerra em 31 de dezembro de 2024, ressalvados eventuais impedimentos de ordem técnica assim como a própria discricionariedade do Poder Executivo”, afirmou o Senado.

Com informações de O Globo.

Fonte: https://agendadopoder.com.br/documento-do-senado-tem-informacoes-divergentes-sobre-padrinhos-de-emendas-apresentados-por-parlamentares-e-prefeitos/