11 de agosto de 2025
Em celular apreendido pela PF, assessor de Braga Netto disse
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Mensagens, anotações e documentos extraídos pela Polícia Federal (PF) do celular do coronel da reserva do Exército Flávio Peregrino, assessor do general Walter Braga Netto, revelam bastidores inéditos das articulações golpistas após a derrota de Jair Bolsonaro nas eleições de 2022. O material, obtido com exclusividade pelo Estadão, também expõe o incômodo de militares com a estratégia de defesa do ex-presidente, que tenta transferir a eles a responsabilidade pelos planos de ruptura institucional.

Em anotações, Peregrino afirma que o líder dessas articulações foi o próprio Bolsonaro e que os militares agiram para ajudá-lo porque “sempre foi a intenção dele” permanecer no poder mesmo após a derrota. As informações reforçam acusações contra o ex-presidente que serão analisadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Procurada, a defesa de Braga Netto não se manifestou. O advogado de Bolsonaro também não respondeu. Já Luís Henrique Prata, defensor de Peregrino, disse que as anotações foram “formuladas com base na liberdade de expressão e no contexto da assessoria de um dos envolvidos” e ressaltou “a lealdade dos militares na busca de soluções constitucionais naquele período e ao longo de todo governo”.

Análises internas e críticas a Bolsonaro

O material foi apreendido em dezembro de 2024, na mesma operação da PF que prendeu Braga Netto. Peregrino é investigado por supostamente tentar acessar informações sigilosas da delação do tenente-coronel Mauro Cid, mas não foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República nos processos sobre o plano de golpe.

Em documentos e mensagens enviadas a si mesmo, o coronel contesta a tese da defesa de Bolsonaro de que os militares teriam articulado um golpe sem o seu conhecimento. Em um texto intitulado “Ideias gerais da defesa”, datado de 28 de novembro de 2024, Peregrino critica diretamente a narrativa do ex-presidente:

“Oportunismo e o que mostra que tudo será feito para livrar a cabeça do B [Bolsonaro]. Estão colocando o projeto político dele acima das amizades e da lealdade que um Gen H [Heleno] sempre demonstrou ao B [Bolsonaro]”, escreveu.

Ele afirma ter ouvido indiciados, advogados e militares que participaram das articulações em novembro e dezembro de 2022 e concluiu que a versão de Bolsonaro “não correspondia aos fatos”.

“A posição de muitos envolvidos (indiciados) é que buscaram sempre soluções jurídicas e constitucionais (Estado de Defesa e de Sítio, GLO e artigo 142). Tudo isso para achar uma solução e ajudar o Pres B [presidente Bolsonaro] a se manter no governo (pois SEMPRE foi a INTENÇÃO dele)”, registrou o coronel.

Peregrino também criticou a falta de gratidão de Bolsonaro:

“Deixar colocarem a culpa nos militares que circundavam o poder no Planalto é uma falta total de gratidão do B [Bolsonaro] àqueles poucos, civis e militares, que não traíram ou abandonaram o Pres. B [Bolsonaro] após os resultados do 2º turno das eleições.”

Autocrítica e falhas nas Forças Armadas

O coronel reconhece erros dos próprios militares, como não desmontar acampamentos em frente a quartéis e não convencer Bolsonaro a desistir do golpe:
“Os militares erraram todos em suas condutas, os da ativa e do alto comando e os da reserva que eram do governo por não terem tido a coragem de demover a ideia de realizar alguma solução constitucional, pois na verdade o B [Bolsonaro] ficou isolado politicamente, internacionalmente e aqueles que ficaram com ele até o fim, ele aparenta estar soltando a mão agora pela sobrevivência de seu projeto político e de poder.”

Mensagens sobre estratégia de confronto

Em mensagens no próprio WhatsApp, Peregrino voltou a criticar a tentativa de culpar os militares, escrevendo de forma enigmática: “Negação, embaixada, prisão…”. Mais tarde, classificou as ações da defesa de Bolsonaro como “desorientação” e “falta de coerência” e acusou o ex-presidente de estar “forçando” uma ordem de prisão para sustentar a narrativa de perseguição pelo STF.

Essa última mensagem foi escrita em 2 de dezembro de 2024. Nove meses depois, em 4 de agosto deste ano, o ministro Alexandre de Moraes decretou a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro por descumprimento de medidas cautelares.

A defesa de Flávio Peregrino emitiu uma nota, leia a íntegra abaixo:

A defesa técnica de Flávio Peregrino reitera a indignação com mais um vazamento seletivo de informações pessoais e constantes de inquérito sigiloso, nitidamente, com o intuito de tirar o foco de denúncias graves do processo eleitoral de 2022, que vem sendo divulgadas e apuradas por organismos internacionais.

O assunto em tela, já exaustivamente explorado na imprensa e usado fora de contexto mais amplo, tratava de uma linha de defesa absurda de que teria havido um “golpe dentro do golpe” pensado por militares. Ressalta-se que não houve nem uma coisa (“golpe”) nem a outra.

As ideias formuladas com base na liberdade de expressão e no contexto da assessoria de um dos envolvidos listavam linhas de pensamento e o principal ponto se calcava na lealdade dos militares na busca de soluções constitucionais naquele período e ao longo de todo governo.

Luís Henrique Prata, advogado do coronel Flávio Peregrino

Fonte: https://agendadopoder.com.br/em-anotacao-no-celular-assessor-de-braga-netto-disse-que-bolsonaro-sempre-quis-se-manter-no-governo-apos-derrota-nas-urnas/